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André do Rap: entenda o que está por trás de decisão que soltou traficante

André do Rap: entenda o que está por trás de decisão que soltou traficante

Apontado como um dos líderes do PCC, André Oliveira Macedo, de 43 anos, conhecido como André do Rap, foi solto após decisão monocrática do ministro do STF Marco Aurélio Mello. A Gazeta ouviu entidades e especialistas sobre o assunto

Publicado em 13 de outubro de 2020 às 21:38

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André de Oliveira Macedo, conhecido como André do Rap, líder do PCC, ao ser detido em Angra dos Reis (RJ)
Segundo a TV Globo, André do Rap teria fugido para o Paraguai. (Arquivo pessoal/Reprodução)

Na última sexta-feira (9) o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Marco Aurélio Mello, deferiu habeas corpus em favor de André Oliveira Macedo, de 43 anos, conhecido como André do Rap.

Acusado de ser um dos líderes do Primeiro Comando da Capital (PCC) de São Paulo, André deixou a Penitenciária 2, em Presidente Venceslau, no estado paulista, na manhã do dia seguinte.

Segundo informações do Jornal Nacional, da TV Globo, o traficante teria fugido para o Paraguai ainda na noite de sábado (10). Na noite de sábado (10), o presidente do STF, Luiz Fux, suspendeu a decisão do ministro Marco Aurélio Mello.

A medida de Fux atendeu a um pedido da Procuradoria-Geral da República. Fux destacou que a soltura do chefe do PCC compromete a ordem pública e que se trata de uma pessoa "de comprovada altíssima periculosidade".

Para entender o que está por trás da decisão do STF, a reportagem de A Gazeta ouviu a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-ES), a Associação Espírito-Santense do Ministério Público (Aesmp), professores de Direito Penal e pesquisadores do tema.

O QUE DIZ A LEI

O posicionamento do ministro Marco Aurélio Mello se baseou no artigo 316 do pacote anticrime (Lei 13.964), aprovado em dezembro do ano passado pelo Congresso. O texto orienta que, a cada 90 dias, as prisões preventivas sejam revisadas "sob pena de tornar a prisão ilegal".

  • “Art. 316. O juiz poderá, de ofício ou a pedido das partes, revogar a prisão preventiva se, no correr da investigação ou do processo, verificar a falta de motivo para que ela subsista, bem como novamente decretá-la, se sobrevierem razões que a justifiquem.

  • Parágrafo único. Decretada a prisão preventiva, deverá o órgão emissor da decisão revisar a necessidade de sua manutenção a cada 90 (noventa) dias, mediante decisão fundamentada, de ofício, sob pena de tornar a prisão ilegal.”

PRISÃO PROVISÓRIA

Para o professor de Direito Constitucional e Penal da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes), Ricardo Gueiros, a lei toca em uma espécie de “ferida antiga, ou seja, a da questão das prisões provisórias”.

Na avaliação dele, o modelo penal do Brasil “optou por dizer que as prisões provisórias seriam a exceção; e a liberdade seria a regra antes da condenação trânsito em julgado. Nesse sentido, temos as regras no código de processo penal estipulando essas situações excepcionais”, explica.

Ele pontua que no processo, o tempo das prisões preventivas se tornou longo e, às vezes, maior que a própria pena que veio a ser conhecida posteriormente. O professor acredita que a discussão vai provocar o STF a conceder uma interpretação uniformizadora do artigo 316 do Código de Processo Penal.

“Técnica e teoricamente, mesmo que o acusado não tenha advogado, isso não deve - ou pelo menos não deveria - interferir. Aliás, esse foi um dos objetivos da lei: criar um impulso do próprio judiciário com o fim de revisar a necessidade da situação excepcional sem a necessidade de um pedido formal de um advogado”.

O QUE DIZ A OAB

O professor de Direito Penal e presidente da Comissão de Advocacia Criminal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-ES), Anderson Burke, defende que “a prisão necessita estar cotidianamente fundamentada com fatos contemporâneos que justifiquem a sua necessidade, sob pena de igualmente se tornar ilegal”.

“Apesar do teor de muitas críticas bem intencionadas que podem levar a um retrocesso quanto às garantias que hoje estão positivadas, a decisão aqui comentada possui amparo legal por ter fundamento na Constituição e no Código de Processo Penal, principalmente no art. 316, parágrafo único do CPP, dispositivo este que representa um avanço e modernização da leitura constitucional da prisão provisória”.

Assim como prevê o texto da lei, Anderson destaca que os juízes que estão realizando a revisão periódica de 90 dias, de ofício ou mediante provocação, estão cumprindo o dever de aplicar garantias que estão previstas aos presos tanto no Código de Processo Penal (CPP) como na Constituição.

"Devido ao caráter excepcional da prisão que possui uma acertada matriz constitucional por recair sobre a liberdade do ser-humano, a revisão periódica de ofício no prazo de 90 dias é fundamental para se evitar ou sanar ilegalidades a todos que estão no sistema penitenciário em caráter provisório, sejam pobres ou ricos", atesta.

DIREITO DOS RÉUS

A Associação Espírito-Santense do Ministério Público (Aesmp) diz que o artigo 316 é uma alteração recente da lei que busca garantir mais direitos aos réus. Na opinião do presidente da Associação, Pedro Ivo de Souza, a decisão de Marco Aurélio Mello não tem sido a posição dos tribunais.

Aspas de citação

O ministro adotou uma interpretação mais favorável possível para o réu, que não tem sido a posição dos nossos tribunais. Ela tem sido minoritária porque adota a posição mais drástica possível que é de entender que é ilegal e tem que dar soltura

Pedro Ivo de Souza
Presidente da Aesmp
Aspas de citação

Para a Associação, o artigo precisa ser melhor discutido no Congresso Nacional. “O comando de 90 dias, como já tivemos outros tantos, não é imperativo. O prazo de 90 dias é indicativo. Bom é que, de 90 em 90 dias, não só o juiz, mas o sistema analise nesse prazo a prisão da pessoa. Esse prazo pode ser até menor, se há modificação da situação do réu”.

REFLEXOS NO ES

De acordo com a Secretaria de Estado da Justiça (Sejus), o Espírito Santo conta 22.544 detentos no sistema prisional capixaba. Desse total, 7.701 são provisórios. A reportagem de A Gazeta questionou o Tribunal de Justiça do Espírito Santo (TJES) quanto ao número de internos aguardando revisão há mais de 90 dias.

No entanto, o Tribunal de Justiça do Estado informou que os sistemas utilizados pelo Poder Judiciário não permitem extrair essa situação, apenas o número de presos provisórios. Quanto ao Ministério Público, o Tribunal destaca que é dever processual do MP velar pelo cumprimento, apontando ao magistrado sempre a necessidade de realizar a revisão.

“Informamos, ainda, que os magistrados do Espírito Santo já foram capacitados acerca de todas as alterações do pacote anticrime e estão aptos a aplicá-las. Nos casos concretos compete à defesa apontar eventual descumprimento do referido dispositivo”, afirma o TJES.

Para o professor de Direito Constitucional e Penal da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes), Ricardo Gueiros, o impacto sob os presos provisórios do Estado dependerá, da decisão que vier a ser proferida pelo Plenário do STF.

“Como houve uma decisão monocrática do ministro Marco Aurélio e, posteriormente, uma revogação da decisão pelo ministro (Luiz) Fux, tem-se dois pontos cruciais a se discutir; e, por certo, a proporção do impacto gerado acaba por fomentar a celeridade de uma pacificação sobre tema", declara.

O professor de Direito Penal e presidente da Comissão de Advocacia Criminal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-ES), Anderson Burke, explica que o julgamento colegiado pode ratificar o teor da decisão liminar pela soltura ou estabelecer entendimento contrário no sentido da manutenção da prisão preventiva.

“Decisões do STF com caráter vinculativo aos tribunais de segunda instância são exceções e devem ser comunicadas formalmente à presidência do tribunal do Estado objeto do comando decisório para que se tenha efeitos, o que não é o caso da decisão aqui comentada. Porém, é importante se considerar que certamente a jurisprudência, principalmente do Supremo Tribunal Federal, é uma importantíssima fonte do direito no Brasil, o que pode iluminar os julgamentos que vêm acontecendo pelos Estados”.

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