A violência está no dia a dia de quem mora no Espírito Santo. Dados divulgados pelo Anuário Brasileiro de Segurança Pública 2020 trazem um panorama da criminalidade em números, com índices preocupantes. O Estado capixaba está em terceiro entre os estados que mais aumentaram os registros de mortes violentas - homicídios dolosos, latrocínios, lesões corporais seguidas de morte e mortes decorrentes de intervenção policial.
Segundo o anuário, que traz dados dos seis primeiros meses de 2020, o Espírito Santo teve um aumento de 18,5% nos registros de mortes violentas, empatado com o Maranhão e ficando atrás apenas do Ceará e do Paraná.
O anuário, porém, traz outros dados que chamam a atenção. Sobre os crimes patrimoniais, com exceção aos roubos e furtos de veículos, o Espírito Santo teve a maior queda no índice de registro no país. Houve também redução nos números de casos de abuso sexual, embora o Estado apresente uma média de três estupros por dia nos seis primeiros meses do ano.
O professor de Mestrado em Segurança Pública e ex-secretário de Segurança Pública, Henrique Herkenhoff, disse que as causas para o aumento dos números de mortes violentas ainda precisam de uma análise mais profunda.
No entanto, uma das hipóteses é a pandemia do novo coronavírus, que pode ter acirrado a disputa por territórios entre organizações criminosas devido a menor circulação de pessoas e, consequente, venda de drogas.
"É preciso uma análise profunda de cada número e da série histórica, pois esse aumento pode ser um ponto fora da curva ou o início de uma tendência. Se for um aumento que se sustentará, só o tempo poderá mostrar", observou.
E como fazer o Estado reduzir os índices de criminalidade? No caso das mortes violentas, Herkenhoff afirma que é fundamental conhecer quem mata e porquê se mata no Espírito Santo.
"O trabalho da inteligência das polícias poderá apresentar o que está acontecendo e consequentemente como deve ser o enfrentamento. O governo começou a autorizar a reposição do efetivo da Polícia Civil, o que em relação às investigações dos homicídios é muito determinante", destacou.
Já na opinião de Fabrício Sabaini, agente da Polícia Federal e Mestre em Segurança Pública, outro ponto que merece atenção é a relação entre a polícia e a comunidade, além das frentes de investimentos em educação.
"A Segurança Pública é interdisciplinar, uma só atitude não vai resolver todos os problemas, mas ainda vemos uma política pública voltada para a repressão. Não quer dizer que ela não deve existir. Mas é preciso também investir na prevenção, ter um sistema que iniba que os crimes aconteçam", pontuou.
Sabaini também destaca a atuação da polícia nas áreas de vulnerabilidade social. "As regiões devem contar com a polícia presente no ambiente, não apenas como agente repressor, mas sim como um ente que pertence ao local" , observou.
O primeiro semestre de 2020 mostrou que ficar dentro de casa durante a pandemia colaborou, e muito, para a redução dos crimes patrimoniais - roubo a residência, a pedestre, a bancos, carga e estabelecimentos comerciais. A queda foi de 44% dos registros, a maior do país. "O fato de ter menos gente circulando nos primeiros meses do ano foi um fator determinante", afirma Henrique Herkenhoff.
Mas os dados de crimes contra o patrimônio também sofrem com subnotificação, pois as vítimas nem sempre procuram as delegacias para registrar o fato.
Para Fabrício Sabaini, os municípios podem contribuir para inibir os roubos de carros e também que os veículos sejam utilizados em outros delitos. Um exemplo são os cercos inteligentes, como os que existem em Vitória atualmente.
Já Herkenhoff aponta a apreensão de armas como essencial no combate aos homicídios e assaltos. "O patrulhamento ostensivo é importante para evitar o roubo e também para ajudar no desarmamento da criminalidade. Apreender armas é retirar o arsenal que está circulando nas mãos de criminosos", observa.
A violência sexual também está entre os índices trazidos pelo Fórum Brasileiro de Segurança. A queda de 28,5% dos registros não foi vista com bons olhos por Vânia Venâncio, presidente do Movimento Bertha Luz. "A maioria dos crimes de violência sexual acontecem dentro de casa, a pandemia neste ponto diminuiu os registros pois os agressores quase sempre estão dentro de casa", observou.
Vânia destaque que muito se evoluiu quanto a legislação para punir os autores de estupro e também de violências domésticas, que tem como principal vítima as mulheres. Porém, a maior dificuldade é que ele chegue o conhecimento das autoridades. Para ela, é fundamental investir em educação.
"É algo muito além da lei, é cultural. A relação de poder sobre a vítima precisa ser desfeita culturalmente. Criar homens que não enxerguem as mulheres como objetos e mulheres que não perpetuem o patriarcado", pontuo. Para ela, as alternativas são os grupos comunitários e até mesmo a inserção do tema dentro das escolas públicas.
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