Após 122 dias de internação, a adolescente Thais Pessotti da Silva, de 14 anos, baleada na cabeça no ataque a duas escolas em Aracruz, no Norte do Espírito Santo, deixou o hospital na última segunda-feira (27) e passou a se recuperar em casa com a família. Thaís era a última vítima do atentado, que matou quatro pessoas e feriu outras doze, que permanecia internada.
Pela primeira vez, Juliana Pessotti Ribeiro, mãe da adolescente, falou com exclusividade ao g1 ES sobre o dia do atentado e o processo de recuperação da filha. Professora, ela lecionava na mesma escola particular que Thais estudava e viu a filha ser socorrida.
"A expectativa é de que a Thais se recupere plenamente e retome a rotina dela, que ela realize os sonhos dela, que ela tenha uma vida linda pela frente e que nós enquanto família estaremos sempre aqui pra apoiar, pra cuidar, pra fazer com que tudo isso aconteça, porque é um direito dela", disse a mãe.
Em um vídeo gravado pela família no carnaval, Thais aparece com fantasia de anjo e dá os primeiros passos durante a reabilitação no hospital. Na data da publicação desta reportagem, a adolescente já conseguia se locomover com ajuda de muleta.
O pai de Thais, o técnico de pesquisa Almir Rogério da Silva lembrou como foi a chegada da filha em casa. "Quando tive a notícia da alta foi uma festa para todos nós, mas a espera até segunda foi longa, muitas incertezas e preocupações", disse o pai.
"A chegada em casa foi uma festa. O sorriso no rosto dela e a alegria foram bem gratificantes. Agradeço primeiramente a Deus. Thais lutou pela vida desde o dia do atentado, e agora pela reabilitação", completou.
Com o apoio de amigos, a família montou uma estrutura em casa com banheiro acessível, quarto adaptado com ar-condicionado, televisão mais moderna e ajustes nas portas.
Juliana contou que a filha continua com a bala alojada na cabeça e, em casa, segue com o tratamento pelo plano de saúde da empresa onde o pai da Thais trabalha, com um time de profissionais, entre eles, terapeutas, fisioterapeutas, fonoaudiólogo, nutricionista e psicólogo, para restabelecer os movimentos e a fala.
"É todo um processo. É como se tivesse zerado tudo. Ela está começando tudo de novo. Essas informações estão ali, o que precisa agora é restabelecer as conexões para que isso vá voltando aos poucos. Ela tem mobilidade, está conseguindo andar com muleta, com apoio, mas o lado direito ainda precisa ser mais fortalecido", disse Juliana.
Para ajudar a filha durante o tempo de internação e agora no retorno ao lar, a mãe disse que teve que deixar de lado toda a carga negativa do atentado.
"A determinação dela, a cada dia, é algo assim surpreendente. Ela é muito disciplinada nas terapias, ela quer muito voltar, quer muito se recuperar. Então isso faz e fez toda a diferença durante as terapias e o tratamento dela", contou a mãe.
No dia do atentado, Juliana e Thais estavam na escola particular. Na conversa com o g1, a professora lembrou que um pouco antes da invasão do assassino, ela estava no recreio com os alunos do 5º ano, quando ligou para a filha porque não viu Thais no primeiro pavimento da escola.
A adolescente disse para a mãe que permaneceria no segundo piso porque ia ficar na sala estudando com os colegas para a prova de geometria.
"O recreio dura uma hora. Ela quis aproveitar e estudar com os colegas para ajudar eles. Ela estava graças a Deus indo muito bem na escola, tirando notas boas e estava preocupada com os colegas que estavam com dificuldade. E aí ficou ela, pelo que entendi, e mais oito crianças na sala de aula estudando", disse a mãe.
Foi no momento que foi encher a garrafinha de água que Juliana ouviu um estouro.
Juliana contou ainda que quando viu o assassino subir a rampa lembrou da filha que estava no segundo andar estudando com os colegas.
"Como vi ele subindo a rampa, lembrei logo da Thais, mas não consegui ir lá e corri em direção ao pátio da escola e a gente foi direcionando as crianças para um anexo da área da escola e comecei mandar mensagem", contou a mãe.
A mãe tentou chegar até a filha, mas não conseguiu. Thais foi socorrida por policiais que entraram na escola e a mãe viu o momento que a filha era carregada pela rampa da unidade.
Chegando ao Hospital São Camilo, no Centro de Aracruz, a adolescente recebeu os primeiros socorros e foi levada por uma equipe do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu) para o Hospital Infantil de Vitória e depois transferida para um hospital particular, onde permaneceu até o dia da alta.
Com a evolução na recuperação de Thais, a família está confiante que em breve ela vai retomar a rotina.
Almir disse que a família tenta agora uma vaga para Thais na rede Sarah, referência nacional em reabilitação, e agradeceu o apoio de todos que torceram e ainda torcem pela filha.
"As expectativas sempre são as melhores possíveis e, com fé em Deus e a dedicação dela no tratamento, vamos conseguir avançar cada dia mais em sua reabilitação plena. Agradeço a todos que de alguma forma ajudaram, rezaram e tiveram pensamentos positivos e a Suzano pelo apoio que vem prestando a Thais e a toda nossa família", falou Almir.
A mãe Juliana disse que quer voltar a lecionar e espera que a filha também volte logo a estudar.
A professora também disse que estar presente na vida dos filhos é um papel importante de todos os pais.
O g1 apurou que, até a data da publicação desta reportagem, o assassino, condenado, desde o dia 4 de dezembro, a cumprir até três anos de internação, seguia internado no Instituto de Atendimento Socioeducativo do Espírito Santo (Iases).
O tempo é o limite máximo estabelecido como medida socioeducativa para adolescentes pela lei.
Procurado, o Iases informou que não poderia "divulgar informações sobre adolescentes que ingressam, cumprem e/ou cumpriram medida socioeducativa de internação nas unidades do Instituto, tendo em vista que esta publicidade viola o princípio da proteção integral, previsto no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA)".
No dia 25 de novembro de 2022, um ataque a duas escolas deixou quatro mortos e outros 12 feridos em Aracruz, no Norte do Espírito Santo.
A investigação apontou que o ataque foi planejado por dois anos e por um assassino de 16 anos que estudou até junho no colégio estadual atacado. O criminoso usou duas armas do pai, um policial militar.
Os disparos aconteceram por volta das 9h30 na Escola Estadual Primo Bitti e em uma escola particular que fica na mesma via, em Praia de Coqueiral, a 22 km do centro do município. Aracruz, onde o ataque aconteceu, fica a 85 km ao norte da capital.
Segundo a Secretaria de Estado de Segurança Pública e Defesa Social, o assassino invadiu a escola estadual com uma pistola e fez vários disparos assim que entrou no estabelecimento de ensino. Depois, foi até a sala dos professores e fez novos disparos. Na unidade, duas professoras foram mortas.
Na sequência, o atirador deixou o local em um carro e seguiu para a escola particular Centro Educacional Praia de Coqueiral, que fica na região. Na unidade, uma aluna foi morta.
Após o segundo ataque, o assassino fugiu em um carro. Ele foi apreendido ainda na tarde do ataque.
No dia seguinte, sábado (26), a Polícia Civil informou que o criminoso iria responder por ato infracional análogo a três homicídios e a 10 tentativas de homicídio qualificadas. Também no sábado, uma professora baleada que estava internada morreu.
No dia 4 de dezembro, o assassino foi condenado a cumprir até três anos de internação. O tempo é o limite máximo estabelecido de medida socioeducativa para adolescentes pela lei.
*Com informações de Juirana Nobres e Fabiana Oliveira
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