Após quase 13 horas de julgamento, três dos denunciados foram condenados pelo assassinato dos irmãos Ruan Reis, 19, e Damião Marcos Reis, 22 anos, ocorrido no dia 25 de março de 2018 no Morro da Piedade, em Vitória. Os acusados receberam, individualmente, uma pena de 60 anos de prisão em regime fechado, sendo 30 anos por cada uma das mortes. Outros cinco também denunciados pelos mesmos crimes ainda aguardam julgamento.
Foram condenados nesta quarta-feira (5):
O crime aconteceu por volta de 1 hora, na Rampa Odilio Ferreira, próximo à Escadaria 25 de Abril, no Morro da Piedade, em Vitória. Cada um dos irmãos foi assassinado com mais de 20 tiros, segundo informações da Polícia Civli. Após a execução, outros crimes ocorreram na região, todos resultado das disputas do tráfico de drogas nos bairros Piedade e Fonte Grande, em Vitória.
O julgamento teve início por volta das 9 horas no Fórum Criminal de Vitória. Logo após o sorteio dos jurados foi iniciado o depoimento de um policial civil que atuou nas investigações, a única testemunha do MPES. O promotor de Justiça Rodrigo Monteiro explicou que outras testemunhas não foram relacionadas para garantir a segurança e não expor as pessoas, pois o caso envolve facção criminosa.
Ao serem interrogados, os réus optaram por se manterem calados. Familiares das vítimas e dos réus não compareceram ao local.
Monteiro lembrou que os dois irmãos não tinham envolvimento com a criminalidade e ainda assim foram mortos de forma brutal pela guerra do tráfico de drogas. “O julgamento ocorreu dentro do esperado e foi concluído com a condenação dos acusados, nos permitindo dar uma resposta para a família das vítimas e para a sociedade”, assinalou. No júri ele atuou em parceria com os promotores Bruno de Oliveira e Gustavo Michelsem.
A advogada Jamily Soeiro Bonatto Baptista fez a defesa dos réus Alan Rosário, Rafael e do Gean Gaia. Ela informou que já manifestou, ao final do julgamento, que irá recorrer contra a sentença de condenação dos três, pedindo a nulidade do júri. Ela relata que eles foram condenados por provas testemunhais de ouvir dizer.
“Por ser crime de comoção social, de grande repercussão, a defesa entende que os jurados já chegaram ao Tribunal do Júri contaminados. As testemunhas falam que o nome dos réus começou a ser divulgado, a rodar no bairro, após reportagem veiculada pela imprensa”, explica.
Jamily assinala ainda que, ao contrário do que foi divulgado, os irmãos foram mortos com 15 e 16 disparos. “É o que consta no laudo cadavérico. Não foram 20 disparos”, destaca.
Outro ponto, explica a advogada, é que contra dois réus não tinham provas técnicas, e o outro foi preso com uma das armas usadas no crime. “Exceto isto, as provas eram de testemunhas de ouvir dizer. O policial que prestou depoimento disse que acha que eles estavam presentes no cenário do crime, mas em relação a um dos réus, o próprio policial admitiu que não estava no local, apenas que ele foi reconhecido por testemunha na parte baixa do Morro da Piedade”, acrescentou.
Em relação a ausência de familiares dos réus, explica que o processo tramitava em segredo e que eles estiveram na porta do Fórum Criminal, mas foram impedidos de entrar.
Por nota, a advogada Paloma Gasiglia, que faz a defesa de Flávio Sampaio, informou que teve um problema de saúde. “O que me impediu de estar no plenário, mas continuo acreditando plenamente que será feita justiça quanto a Flávio Sampaio, com a absolvição, uma vez que ele não tem nenhuma ligação com os fatos julgados”, disse.
Assinalou ainda que buscará a absolvição do seu cliente em julgamento futuro. Destaca que o processo se embasa em provas testemunhais que não reconheceram Flávio como partícipe, e que vão provar em plenário que ele não tem nenhuma ligação com o crime.
Ainda vão ser realizados, em datas a serem agendadas, os julgamentos de outras cinco pessoas que também foram denunciadas pelo Ministério Público do Espírito Santo (MPES) pela participação no crime dos irmãos. Um dos réus também seria julgado nesta quarta-feira (5), mas a advogada dele apresentou um atestado, informando que por problemas de saúde não poderia participar da sessão, o que levou o Juízo da Primeira Vara Criminal de Vitória a adiar o julgamento.
Com isto, vai ser julgado em uma data ainda a ser marcada:
Outros dois foram pronunciados - decisão judicial que os encaminha para o Tribunal do Júri -, mas não vão ser julgados com os demais porque recorreram contra a sentença e aguardam resposta da Justiça. São eles:
Após a primeira denúncia relacionada ao caso, o Ministério Público do Espírito Santo (MPES) denunciou também outros dois réus por participação nos homicídios. Eles seriam lideranças da região de São Benedito que teriam dado apoio aos acusados. O processo deles está em tramitação e ainda não há previsão de quando serão julgados. São eles:
De acordo com a denúncia do MPES, Ruan estava em casa, na companhia de sua cunhada, quando foi abordado pelos grupo denunciado pelo crime. “Além de estarem portando armas de fogo, trajavam toucas ninja, coletes e coturnos”, informa o texto.
Na sequência eles ordenaram que a cunhada fosse para dentro da casa, e quando ela atendeu o pedido, o grupo indagou a Ruan sobre a localização dos chefes do tráfico do bairro.
“Depreende-se que, como Ruan não soube informar a localização pretendida pelos denunciados, seus algozes o conduziram pelas ruas do bairro sob a mira de armas de fogo, chegando ao alto do Morro da Piedade”, é relatado na denúncia.
A cunhada, ao perceber que Ruan foi levado pelo grupo, comunicou o fato aos seus familiares. Foi quando Damião saiu de casa correndo à procura de seu irmão. Ele o encontrou já sob o poder do grupo, e ao questionar a motivação, os dois irmãos foram atingidos por vários disparos de armas de fogo.
À época do crime, a polícia informou que foram mais de 60 disparos. A perícia encontrou 22 perfurações no corpo de Ruan e 20 no corpo de Damião. No local foram encontradas mais de 60 cápsulas de calibre 380, Ponto 40 e 9mm.
Os crimes foram praticados, segundo o MPES, “por motivo torpe”. “No contexto da guerra do narcotráfico, visto que os denunciados estavam à procura dos endereços dos chefes do tráfico local, pois planejavam retomar o controle do crime nos morros da Piedade e da Fonte Grande, assim, como as vítimas não lhes forneceram os endereços almejados, os denunciados às mataram”, relata a denúncia.
É destaca ainda que os executores, que se encontravam em superioridade numérica, efetuaram disparos de arma de fogo em desfavor das vítimas, que estavam desarmadas.
O ano de 2018 no Morro da Piedade foi marcado por noites sangrentas, com crimes brutais, seguidos de ataques e ameaças a moradores que foram expulsos do bairro, localizado em Vitória. Era o resultado da guerra do tráfico de drogas pela disputa de territórios. Foram pelo menos oito assassinatos, além de duas tentativas de homicídio.
A comunidade chegou a realizar protestos pedindo por mais segurança. Dezenas de moradores acabaram deixando o bairro em decorrência do avanço da criminalidade e do medo de novos confrontos.
As investigações sobre os crimes ocorridos em 2018 apontaram que desde o final do ano de 2017, cerca de 20 pessoas portando armas de fogo e trajando toucas ninjas, coletes e coturnos se revezavam na procura pelos chefes do tráfico de drogas local, com o objetivo de eliminá-los e tomar o controle da região da Piedade, Fonte Grande e Moscoso.
Este grupo, junto com suas famílias, haviam sido expulsos destas localidades pelos que estavam chefiando o tráfico na região. Naquela ocasião, o comando do tráfico estava nas mãos dos integrantes da Família Ferreira Dias, e era em busca deles que o grupo estava. Contavam com o apoio do PCV/Trem Bala. Na busca pelas lideranças do tráfico, ocorreram os seguintes crimes:
Segundo as investigações, por trás das mortes e dos ataques à Piedade, com reflexos nos bairros Fonte Grande e Moscoso, estão expulsões de traficantes e vinganças. O grupo que promoveu os ataques em 2018, junto com suas famílias, havia sido expulso destas localidades pelos que estavam chefiando o tráfico na região, entre os anos 2012 e 2013.
O comando do tráfico da Piedade passou para as mãos dos integrantes da família Ferreira Dias (formada pelos irmãos João Paulo, Felipe, e ainda por Walace). Em 2018, os que haviam sido expulsos decidiram retomar o controle da região e para isto viabilizaram a criação de uma espécie de um consórcio entre ex-traficantes da Fonte Grande e Moscoso (Rafael, Gustavo, Alan, Gaia, Leandro, e Renato) com traficantes de São Benedito (Vaninho e Janderson Mala-velha) e com outro de Cobi de Baixo (Flavio Sampaio).
Participaram ainda familiares destes traficantes que ainda moravam na Piedade ou próximo ao bairro. Foram eles que auxiliaram com informações sobre os que estavam comandando o bairro e sua localização. Contaram com o apoio do PCV/Trem Bala.
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