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Candidata da Ufes recorre ao MEC para garantir vaga em sistema de cotas

Candidata da Ufes recorre ao MEC para garantir vaga em sistema de cotas

Jovem de 18 anos disputou uma cadeira no curso de Terapia Ocupacional, mas sua candidatura foi rejeitada por não ser considerada negra por banca da universidade

Publicado em 21 de março de 2025 às 16:13

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UFES
Acesso à Ufes: candidata do curso de Terapia Ocupacional teve a matrícula indeferida pelo sistema de cotas. (Ricardo Medeiros)

A jovem Amanda Borges de Sousa Vargas, 18 anos, candidata a uma vaga no curso de Terapia Ocupacional na Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes), recorreu ao Ministério da Educação (MEC) na tentativa de garantir seu acesso ao ensino superior pelo sistema de cotas, após ter sua candidatura rejeitada pela instituição capixaba. A estudante passou duas vezes pela banca de verificação, mas, por suas características, não foi identificada como negra para ter direito a ingressar na universidade por meio da política afirmativa. 

O recurso à instância federal foi proposto pela advogada Silvanna Borges, mãe da jovem, ao considerar que a filha teve seus direitos cerceados. Ela também enviou um documento ao Ministério da Igualdade Racial, relatando o processo pelo qual Amanda passou, na expectativa de haver alguma manifestação favorável a seu caso. 

Silvanna contou que a filha disputou a vaga pelo sistema de cotas porque se identifica como uma pessoa parda — no Brasil, pretos e pardos são classificados como negros — e também tem ascendência negra, condições que, na avaliação da mãe e advogada, tornaria Amanda apta a participar das políticas afirmativas raciais. 

Candidata da Ufes recorre ao MEC para garantir vaga em sistema de cotas

No entanto, ao passar pela análise da banca de heteroidentificação da Ufes, a estudante teve o pedido de ingresso à universidade indeferido devido a características físicas que fogem ao que está previsto nas regras do sistema de cotas. Amanda recorreu na própria instituição, mas nova análise manteve o indeferimento. Nessa avaliação, são consideradas a cor da pele e a textura do cabelo, por exemplo. Para Silvanna, o método reforça estereótipos e o preconceito contra negros. 

Como é feita a identificação

Questionada sobre as características consideradas pela Ufes para a autodeclaração ser validada, a pró-reitora de Graduação, Regina Godinho, observou que a avaliação étnica-racial para candidatos pretos e pardos é realizada de maneira presencial pela Comissão de Verificação de Autodeclaração.

"A validação da autodeclaração de pessoa parda, conforme o edital regulamentador, é realizada com base exclusivamente no fenótipo, ou seja, nas características físicas visíveis do candidato. Algumas características consideradas para essa análise são a cor da pele, a textura do cabelo e outros aspectos faciais que, combinados ou não, configuram-se como critério para validar ou invalidar a autodeclaração", pontuou, em nota. 

Amanda havia apresentado uma declaração da mãe, registrada em cartório em 2007, que é afrodescendente, mas, conforme ressaltou a pró-reitora, esse documento não tem validade no processo de identificação racial. "Não são consideradas informações sobre ascendência, genótipo ou histórico familiar, sendo vedada qualquer forma de aferição baseada na ancestralidade do candidato."

Perguntada se há possibilidade de revisão deste caso pela Ufes, Regina Godinho explicou, ainda em nota, que tanto o edital de solicitação de matrícula quanto o edital regulamentador não contemplam a previsão de mais de um prazo para recurso.

"Uma vez que a matrícula é indeferida após o recurso, foi oferecido o direito ao contraditório, conforme prevê o edital e como deve ser em qualquer processo seletivo justo. Os recursos são analisados à luz dos editais regulamentadores e de convocação de matrícula e, após essa análise, uma Comissão Recursal, distinta da anterior, realiza uma avaliação presencial."

Dessa maneira, continuou a pró-reitora, em obediência aos editais, não é possível oferecer novas chances a candidatos indeferidos após a instância recursal. "Essa atitude implicaria em ofensa às regras mais fundamentais do processo seletivo e, pior, feriria o direito de um candidato suplente."

Fraudes

O caso de Amanda não é o primeiro em que a Ufes não reconhece a autodeclaração do candidato, mas a pró-reitora afirmou que há uma atuação permanente da universidade para melhorias dos procedimentos. 

"Se antes bastava a autodeclaração, agora existe um processo misto de heteroidentificação, em que a autodeclaração é validada ou não por uma comissão avaliadora, conforme normatizado pela Resolução 49/2021. Esse processo visa a coibir eventual destinação de vagas reservadas para quem não é alvo da política social, considerando possíveis fraudes, bem como declarações equivocadas devido à ausência de compreensão das questões raciais."

Apesar de reconhecer o risco de fraude, Silvanna Borges critica a metodologia adotada pela Ufes para validação dos candidatos que se autodeclaram negros. Em sua opinião, a ascendência familiar deveria ser considerada nesse processo. "Do jeito que é feito hoje, parece que querem apagar uma história que a gente não quer que apague", argumenta. 

A mãe e advogada também acusou a universidade de promover uma espécie de palestra para os candidatos, antes da entrevista com a comissão avaliadora, para evitar recursos. 

A pró-reitora esclareceu que a palestra trata de letramento racial e a função da política de cotas raciais, bem como em que se baseia a avaliação étnica-racial para candidatos pretos e pardos, ou seja, no fenótipo e não no genótipo. "Não há nenhuma orientação oficial da Ufes no sentido de coibir a interposição de recurso por quaisquer candidatos", concluiu Regina Godinho. 

A reportagem de A Gazeta optou por não divulgar a foto da candidata.

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