A cerveja foi comprada com antecedência para comemorar não só as festividades de final de ano, mas também o aniversário do engenheiro capixaba Luiz Felippe Teles Ribeiro, de 38 anos. O que ele não sabia era que os lotes da bebida escolhida, a Belorizontina, da Cervejaria Backer, foram contaminados, ainda no processo de produção, com dietilenoglicol.
Luiz não chegou a curtir a ceia de Natal de 2019. Foi internado em um hospital em Belo Horizonte (MG), onde permaneceu por quase cinco meses, três deles em coma. Agora, mais de um ano após a intoxicação, luta para superar as sequelas: ele perdeu a audição, tem dificuldades com a mobilidade dos braços e pernas e teve paralisia facial, que dele tirou as expressões.
O engenheiro, que é natural de Marataízes, mora em Belo Horizonte com a esposa Camila. Logo após a internação, foi diagnosticado com síndrome nefroneural, doença que apresenta alterações neurológicas e insuficiência renal. “Só no final de abril de 2020 é que fui saber o que acontecera comigo. Semanas depois é que soube da morte do meu sogro. Ainda é uma perda muito sentida”, relata.
Ele se refere ao bancário Paschoal Demartini, de 55 anos, pai de Camila e outra vítima da mesma intoxicação. Ele participou de um churrasco na casa de Luiz, foi internado um dia após o genro e morreu uma semana depois. O ‘doguinho’ de Paschoal, Aruk, é criado pelo engenheiro.
Com fisioterapia, fonoaudiologia e terapias ocupacionais, Luiz vem recuperando a mobilidade, mas ainda depende de uma cadeira de rodas e de órteses para os pés, além de muletas, para andar. “Nada vai me impedir de viver. Vou trabalhar para que minha vida volte ao normal”, assinala, destacando que adora estar vivo.
Veja abaixo vídeo onde ele relata como tem sido o seu dia a dia desde que deixou o hospital.
O capixaba e o sogro foram os primeiros casos notificados de uma doença que ainda era misteriosa para a Secretaria de Saúde de Minas Gerais em janeiro de 2020. Logo nas primeiras semanas do ano, quando Luiz já estava em coma, um laudo da Polícia Civil mineira apontou que ele havia ingerido a cerveja Belohorizontina, da Backer, contaminada com uma substância tóxica, o dietilenoglicol.
O produto foi identificado em análises laboratoriais de amostras da bebida. A substância, altamente tóxica, é usada na refrigeração de cerveja. O mesmo composto foi encontrado no sangue de Luiz Felippe, de seu sogro e de outras vítimas.
Em inspeção na cervejaria, a Polícia Civil identificou a presença de dietilenoglicol na água usada na produção de cerveja. Mais de 40 lotes de dez tipos de cervejas da Backer foram contaminados, entre elas a Belorizontina e a Capixaba, produzida com rótulo exclusivo para o Espírito Santo.
Em junho de 2020, inquérito da Polícia Civil indiciou onze pessoas, incluindo os sócios da Cervejaria Backer, pela contaminação. Um grupo de 32 pessoas foram vítimas da intoxicação, dez delas morreram, incluindo o sogro de Luiz, segundo processo que tramita na justiça mineira.
De acordo com o advogado de algumas das vítimas, Claudio Diniz Júnior, na área cível existe uma ação civil pública, além de outros processos individuais, contra os sócios da cervejaria. O objetivo é que sejam responsabilizados por repação civil, garantindo indenização para as vítimas.
Na área criminal, foi aceita a denúncia formulada pelo Ministério Público de Minas Gerais contra onze pessoas. Três delas, os sócios da Backer, vão responder por crime baseados no Código de Defesa do Consumidor, por causarem dano irreparável à saúde pública. Outros oito funcionários vão responder por homicídio culposo.
Há ainda processo que tramitam no Espírito Santo, na área criminal. Nos dois estados o andamento deles foi afetado pela pandemia do novo coronavírus que reduziu, e em alguns momentos até suspendeu, as atividades na Justiça.
Os representantes da cervejaria Backer não foram localizados para se manifestarem sobre o assunto.
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