A atuação da Polícia Militar na madrugada de domingo (25) na região de Gurigica, em Vitória, apresenta pontos divergentes entre o registro da ocorrência em um Boletim Unificado (BU) da própria PM e afirmações do comandante da corporação, o coronel Douglas Caus. Na ocasião, uma sequência de disparos, que durou mais de uma hora, terminou com uma parede de hospital perfurada e um paciente, um idoso de 68 anos, atingido e morto.
O principal ponto de discordância diz respeito ao motivo do posicionamento de dezenas de policiais em frente ao Hospital MedSênior, na Avenida Leitão da Silva. É nesse prédio, o Life Vix Mall, que fica a Total Health, clínica de cuidados paliativos em que a vítima, Daniel Ribeiro Campos da Silva, estava internada.
Comunicado do Centro Integrado Operacional de Defesa Social (Ciodes) da PM descreve que, devido à intensidade dos ataques, os policiais ficaram encurralados atrás do complexo médico, para se protegerem dos disparos. O texto é explícito: "as guarnições ficaram encurraladas próximo ao complexo da Medsênior Saúde e foi informado que um paciente do referido hospital foi alvejado por um disparo na cabeça. BME acionado."
Em coletiva de imprensa na noite de segunda-feira (26), o comandante Caus, ao ser questionado se os policiais ficaram acuados, negou a situação. Ele disse que se tratava de uma posição estratégica, uma "posição de tiro", isto é, quando os militares se colocam atrás de barreiras físicas, como muros, para se proteger e, ao mesmo tempo, ter a visualização necessária da área para conter a atuação de criminosos. Os policiais não atiraram, segundo Caus, para preservar vidas de civis.
O boletim unificado registrado por um dos Coordenadores de Policiamento da Unidade (CPUs) presentes na cena afirma que não havia possibilidade de dar apoio para a saída dos primeiros agentes que chegaram ao local e que, por isso, permaneceram posicionados atrás do MedSênior, para se proteger dos tiros.
Diz o documento: "dada a intensidade da agressão armada, este CPU concluiu por não haver a possibilidade de extração (retirada dos policiais do local) dado o risco que a exposição geraria aos militares, sendo mais prudente, portanto, sustentar a posição de segurança atrás do Hospital Medsênior como único abrigo disponível naquele momento."
O coronel afirmou que a primeira guarnição, com dois policiais, se posicionou na lateral do hospital e depois, quando chegaram reforços, os militares também se distribuíram pela rua, ainda na base do morro. Cerca de 40 PMs, segundo o comandante Caus, ficaram nessa posição até a chegada do Batalhão de Missões Especiais (BME) na madrugada de domingo (25).
Na coletiva, Caus ressaltou que o BME é uma polícia especializada, com experiência em cenários como o deflagrado na região de Gurigica, e que, por essa razão, a orientação foi esperar a chegada do grupamento para poder subir o morro.
Perguntado por que, até a chegada do BME, os policiais não reagiram aos disparos dos criminosos, o comandante disse que os criminosos estavam escondidos em uma mata e, sem certeza do que pudesse haver por trás da vegetação, os PMs optaram por não atirar. "Atirar a esmo, poderia atingir uma casa, um morador. A posição que os policiais estavam era para guarnecer a comunidade", argumentou.
Mesmo depois que o grupamento especial subiu o morro, com os demais policiais que antes estavam na lateral do hospital, não houve disparos. Caus afirmou que a intenção era manter a presença dos PMs na região, a princípio, até o final desta terça-feira (27).
"Foi uma subida tática e todo o morro foi tomado. Estamos mantendo 200 policiais em alerta na academia e no quartel, se houver necessidade de empregá-los. Continuaremos com o policiamento o dia inteiro até que esse reforço na segurança possa ser desmobilizado."
Diante das divergências entre a fala do comandante e o registro de agentes no local, a Polícia Militar e a Secretaria de Estado da Segurança Pública (Sesp) foram procuradas na segunda-feira (26) para se manifestar. Nesta terça, a assessoria do órgão informou apenas que a situação está sendo apurada.
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