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Como a nova lei de trânsito trata casos de acidentes com motoristas embriagados

Como a nova lei de trânsito trata casos de acidentes com motoristas embriagados

A Lei nº 14.071/2020, em vigor desde o dia 12 de abril deste ano, alterou o Código de Trânsito Brasileiro (CTB) e deixou mais rígida a punição para motoristas embriagados em caso de condenação

Publicado em 31 de maio de 2021 às 10:24

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Moto Honda XRE envolvida no acidente que matou Amanda Marques na Rodovia Darly Santos, em Vila Velha
Moto Honda XRE envolvida no acidente que matou Amanda Marques na Rodovia Darly Santos, em Vila Velha. (Reprodução)
Autor - Isaac Ribeiro
Isaac Ribeiro
Repórter de Cotidiano / [email protected]

Com a alteração do Código de Trânsito Brasileiro (CTB), os motoristas, motociclistas, pedestres e ciclistas passaram a seguir novas regras desde o dia 12 de abril, data em que entrou em vigor a Lei nº 14.071/2020, proposta pelo presidente Jair Bolsonaro.

Aumento do limite de pontos e validade da Carteira Nacional de Habilitação (CNH) e uso de cadeirinha fazem parte do pacote. Outra mudança que chama a atenção é a prisão de motoristas que dirigem embriagados e provocam acidentes.

A nova lei prevê que em casos de lesão corporal e homicídio causados por motorista embriagado ou sob efeito de alguma outra substância entorpecente, mesmo que sem intenção, a pena de reclusão não pode ser substituída por outra mais branda, que restringe direitos.

Mas de acordo com o senador Fabiano Contarato, que já foi titular da Delegacia Especializada de Delitos de Trânsito, tendo em vista o princípio constitucional de que ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado da sentença condenatória, enquanto não couber mais recurso, o réu terá o direito de responder ao processo em liberdade. Somente após o trânsito em julgado, passa a valer modificação da lei, proposta por ele.

"Nessas hipóteses, o juiz determina a expedição de mandando de prisão para que ela cumpra a pena no regime estabelecido na sentença. Ou seja, não caberá mais a substituição de pena de privação da liberdade pelas chamadas penas alternativas ou restritivas de direito. Ou seja, hoje no Brasil, o motorista que, embriagado, matar ou lesionar alguém, após ser condenado, deve ir para cadeia para cumprir sua pena", explica.

Segundo dia de depoimento de Pazuello
Senador Fabiano Contarato defende medidas mais rígidas no trânsito. (Leopoldo Silva)

ACIDENTES NO ES

De acordo com dados do Batalhão de Trânsito da Polícia Militar (BPTran) 45 pessoas foram flagradas - por etilômetro ou laudo - conduzindo veículos embriagadas na Grande Vitória de janeiro a março deste ano. Outras 208 se recusaram a realizar o teste.

É configurado crime quando o teste de etilômetro apresenta nível igual ou superior a 0,34mg/l. Seja por laudo ou etilômetro, em ambos os casos, os condutores são encaminhados à delegacia. Quando o motorista se recusa a fazer o teste e não possui sinais de embriaguez, são adotadas medidas administrativas. 

Segundo a Secretaria de Estado da Segurança Pública (Sesp), de janeiro a abril deste ano, ocorreram 12.596 acidentes de trânsito. No mesmo período do ano passado, foram 11.971. A diferença aponta para redução de 4,69%. Desse total, não foi informado quantas ocorrências foram provocadas por motoristas que dirigiam sob efeito do álcool ou outra substância entorpecente.

Nas rodoviais federais que cortam o Espírito Santo, a Polícia Rodoviária Federal (PRF) informou que neste ano foram registrados 885 acidentes de janeiro ao dia 10 de maio. Neste período, 1.084 pessoas ficaram feridas e 51 morreram.

Nas abordagens da PRF, 162 pessoas foram autuadas por conduzirem veículo automotor com capacidade psicomotora alterada em razão da influência de álcool ou de outra substância, sendo 39 por constatação, 123 por recusa e sete porque dirigiam sob a influência de substância psicoativa. 

ENTENDIMENTO DA LEI

Embora os dados sobre acidentes provocados por motoristas embriagados não tenham sido informados, com frequência A Gazeta noticia casos dessa natureza registrados no Espírito Santo.

Um deles aconteceu no dia 17 de abril deste ano envolvendo a jovem Amanda Marques, de 20 anos. Ela morreu após ter a moto em que estava com namorado atingida pelo motorista Wagner Nunes de Paulo. À época, ele se recusou a fazer o teste do bafômetro, mas foi preso ainda no local do acidente. 

Wagner foi autuado em flagrante por homicídio culposo - quando não há intenção de matar - na direção de veículo automotor, previsto no artigo 302 do CTB. Foi arbitrada uma fiança de R$ 10 mil, que não foi paga, por isso Wagner foi encaminhado para o Centro de Triagem de Viana. A prisão foi convertida em preventiva pelo magistrado de plantão.

Diante desse e de outros casos relacionados à combinação proibida de bebida e direção, a reportagem simulou três, dentre as mais diversas situações já registradas no trânsito, e procurou advogados para explicar como a lei costuma tratar essas ocorrências.  Confira os exemplos:

  • 01

    FUGA DO LOCAL DO ACIDENTE

    O motorista bebe, provoca um acidente de trânsito, não aciona o socorro às vítimas e foge do local. As vítimas morrem. Ele se apresenta à polícia e não vai preso, pois não houve flagrante. Dias após, a investigação da polícia aponta que ele ingeriu bebida alcoólica e fugiu para não ser preso.

  • 02

    PRISÃO EM FLAGRANTE

    O motorista bebe, provoca um acidente com morte e é preso em flagrante no local da ocorrência. A embriaguez foi atestada por meio do etilômetro. 

  • 03

    RECUSA A FAZER O TESTE DO BAFÔMETRO

    Um motorista com sinais de embriaguez provoca um acidente com morte, aciona a ambulância, e permanece no local até a chegada da polícia. Ele não aceita fazer o teste do etilômetro. Os policiais atestam a embriaguez por meio de um laudo e o encaminham à delegacia. 

O advogado Ludgero Liberato explicou que a regra, no sistema processual brasileiro, é que os acusados pela prática de crimes respondam aos processos em liberdade, mesmo quando tenham sido presos em flagrante.

"Nos casos de crimes de trânsito, em especial, os Tribunais Superiores somente têm admitido a manutenção de prisões preventivas quando há reiteração do causador do acidente em infrações de trânsito, de modo que reste comprovado que se o acusado permanecer solto há risco que cause novos acidentes", salientou.

O professor de Direito Constitucional e Penal da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes), Ricardo Gueiros, disse que a maior diferença que pode haver no caso de um atropelamento praticado por um condutor embriagado – com ou sem socorro à vítima – é se houve um crime de homicídio culposo (sem intenção) ou doloso (com intenção).

De acordo com o professor, nesses casos, é muito comum, no curso da investigação, averiguar se o condutor agiu apenas de forma imprudente – o que configura o crime culposo –, ou se assumiu o risco do resultado, o que configuraria delito doloso eventual. 

"Se o crime foi culposo, estaremos diante do art. 302 do CTB, em que se prevê detenção de 2 a 4 anos. No caso de o condutor não ter prestado o devido socorro, aumenta-se a pena em um terço à metade. Havendo socorro à vítima, não poderá ocorrer prisão em flagrante e nem se pode exigir fiança, conforme prevê o art. 301 do CTB", explicou.

Ricardo complementa que, por outro lado, pode-se entender, a depender do caso concreto, que, ao ingerir bebida alcoólica e dirigir, o condutor não estaria apenas sendo imprudente, mas também assumindo o risco de produzir o resultado. Se assim for  o entendimento, crime estaria caracterizado como dolo eventual.

 E, nesse caso, a pena é muito superior e as consequências práticas muito mais sérias, como, por exemplo, o regime prisional fechado. A pena para o homicídio doloso qualificado é de reclusão de 12 a 30 anos. 

"Além disso, se realmente restar configurado o homicídio doloso qualificado, a progressão de regime – fechado, semiaberto e aberto – é bem mais dificultosa, pois será necessário cumprir um tempo longo de pena, principalmente após o chamado pacote anticrime aprovado em 2019", finalizou.

PAGAMENTO DE FIANÇA

O professor de Direito Constitucional e Penal da Ufes, Ricardo Gueiros, explicou que, no caso da prisão em flagrante, o delegado pode arbitrar fiança se a pena máxima de reclusão não for superior a 4 anos. Se o período for superior, a decisão caberá somente ao juiz, que terá um prazo de 48 horas.

"Se uma pessoa comete um crime – qualquer que seja ele – a regra é a liberdade. Essa regra será superada se estiverem presentes os requisitos da prisão provisória – podendo ser preventiva ou temporária. Por exemplo: se o acusado dá fortes indícios de fuga, temos a presença de requisito de prisão preventiva. E isso tudo independe de fiança. Ou seja, caso não estiverem presentes os requisitos da prisão provisória, o acusado terá direito à liberdade independentemente de fiança. São coisas independentes” explica.

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