Uma mudança na legislação de Vitória acaba com a obrigação de inspeções prediais na cidade. Desde a última segunda-feira (6), edificações públicas e privadas da Capital têm que apresentar, em vez de laudos periódicos de vistoria, um documento que traz, entre outras informações, a descrição da construção e dados de sua conservação e utilização, como fornecedores e limpeza.
O chamado Manual de Uso, Operação e Manutenção das Edificações pode ser elaborado pelo responsável legal pela edificação em um prazo de até dois anos após o prédio receber o Certificado de Conclusão da Obra. Com a mudança, ficam extintas também as multas que eram aplicadas às edificações que não apresentassem os laudos das técnicos das inspeções periódicas, que deveriam ser realizadas a cada dez anos.
A proposta partiu dos vereadores Armandinho Fontoura (Podemos) e Davi Esmael (PSD), autores do Projeto de Lei nº 74/2022, que foi aprovada pela Câmara e sancionada no mês de maio pelo prefeito Lorenzo Pazolini (Republicanos). A Lei n° 9.841 entrou em vigor a partir da publicação oficial, no último dia 6.
Vistorias continuam necessárias, mas sem periodicidade definida, e será exigido que o síndico mantenha cópia do documento. Além disso, o Manual de Uso deverá ser elaborado por um profissional habilitado, com registro no Conselho Regional de Engenharia e Agronomia do Espírito Santo (Crea/ES) ou no Conselho de Arquitetura e Urbanismo do Espírito Santo (CAU/ES).
No entanto, mesmo por essas entidades a desobrigação das inspeções prediais não foi bem recebida. Para o presidente do CAU/ES), Heliomar Venancio, o laudo é fundamental para a saúde das edificações e traz segurança para a população. Por outro lado, as empresas do mercado imobiliário acreditam que o Manual de Uso e a inserção de uma cultura de prevenção garantirão a longevidade da construção, além de cortar custos de condomínios, por exemplo, com a desabrigação da inspeção predial.
Especialista em Direito Imobiliário, o advogado Diovano Rosetti lembra que o Código Civil Brasileiro já prevê a obrigatoriedade de síndico promover a manutenção em partes comuns do prédio, sob a responsabilidade de responder em caso de omissões. O responsável precisa imprimir as notas fiscais das fiscalizações de manutenção e guardá-las no manual, explica.
O Conselho de Arquitetura e Urbanismo (CAU-ES), em nota, lamenta a alteração e relembra que há um histórico recente de acidentes em edificações. “Em meio a tantas tragédias noticiadas pela mídia capixaba nos últimos anos, em condomínios, residências, ficamos consternados com a decisão que veta uma lei em que o laudo expedido valia por 10 anos após a concessão de conclusão de obra, ou seja, não era um serviço exigido todo ano e que tinha toda a garantia de profissionais qualificados”, diz trecho do posicionamento.
O presidente do Conselho Regional de Engenharia e Agronomia (Crea-ES), Jorge Silva, segue a mesma linha. “Para nós, como órgão fiscalizador de obras públicas e privadas, consideramos um retrocesso muito grande. Um laudo de inspeção predial certifica as condições da obra baseado em um diagnóstico sucinto da obra e orienta as medidas e providências para que não haja acidentes”, comenta.
Em casos de obras novas, recém-inauguradas, o construtor é quem deve providenciar o Manual, segundo Rosetti. “O construtor deve fornecer o manual do síndico, um dossiê com todas as informações do prédio”. Quando o prédio tem mais de 10 anos de construção, ele vai precisar apresentar o manual em até dois anos após a publicação da lei.
O vice-presidente da Associação das Empresas do Mercado Imobiliário (Ademi-ES), Alexandre Schubert, acredita que os mecanismos atuais proporcionam uma alternativa melhor para evitar acidentes. “O manual estabelece uma rotina preventiva e de manutenção que é mais saudável para o imóvel, que garante a longevidade e evita situações de risco. O manual é mais simples para prevenir e manter. O morador normalmente descansa, não coloca a mão no bolso para evitar o problema. Mas aí fica caro depois, quando acontece. O laudo não evita isso”, fala Schubert.
Para o advogado Diovano Rosetti, o laudo da inspeção era um gasto extra para o condomínio e deve ser inserida na comunidade uma cultura de prevenção. “Entendo que o Brasil já tem leis em demasia. Como dito, no nosso ordenamento jurídico já consta obrigatoriedade de manutenção do prédio. O referido laudo era um gasto extra que o condomínio era obrigado a suportar. A comunidade condominial deve ter a cultura de cuidar do patrimônio e não deixar se deteriorar”, conclui.
O presidente do Conselho de Arquitetura e Urbanismo, entretanto, acredita que a desobrigação da inspeção predial a cada dez anos traz prejuízos à sociedade. "O laudo oferece uma segurança muito grande, na vida da construção e das pessoas que habitam e transitam nestas edificações. Com esta ausência da obrigatoriedade em lei, a preocupação é muito grande, principalmente porque estamos vivendo um tempo em que as construções estão ruindo, exatamente pela falta de profissional próximos às edificações, seja na construção, seja principalmente na manutenção. Segurança nunca é demais!", pontua.
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