O Conselho Regional de Medicina do Espírito Santo (CRM-ES) estima que pelo menos um terço dos profissionais de saúde contaminados com o novo coronavírus sejam médicos. De acordo com Paulo Gouvêa, conselheiro e coordenador do Comitê de Crise para o Enfrentamento do Coronavírus do Conselho, ainda não há clareza das informações sobre como a contaminação está ocorrendo. É um número muito elevado de profissionais contaminados, e que assusta, se considerar que estamos com dois meses de isolamento e que essas pessoas fizeram treinamento, pondera.
Até a última quinta-feira, dia 7, o Espírito Santo já havia registrado 3.988 casos confirmados da doença, com 157 mortes. Desse total, 1.244 casos são de profissionais de saúde que foram infectados, sendo que dois deles morreram. Confira os números no Estado.
Gouvêa questiona se o número de equipamentos de segurança (EPIs) está sendo suficiente, se está havendo sobrecarga de trabalho ou se o protocolo de paramentação está sendo cumprido a rigor. Ele explica que, nos casos dos anestesistas, por exemplo, é preciso usar a roupa do hospital, gorro, óculos, máscara, o capote impermeável ou um macacão, duas luvas e propé (semelhante a uma meia para o pé). É muita muita roupa e o perigo está na hora de retirá-las, alerta.
Diz ainda que existe um protocolo de higienização para a desparamentação - retirada das roupas de proteção - com uso de álcool em gel em cada uma das etapas. O correto, segundo ele, é ter um outro profissional junto para ajudar a cumprir todas as etapas de higienização. É nessa hora em que pode ocorrer um momento de vacilo e a contaminação. O anestesista, por exemplo, após uma intubação, onde fica exposto a uma carga viral maior ao levar o tubo ao pulmão do paciente, precisa não só tirar a roupa, mas tomar um banho após o procedimento e nem sempre ele tem esta condição possível, diz.
Com a contaminação dos médicos, relata Gouvêa, há risco de desassistência de pacientes pela falta de profissionais. Outro ponto, segundo ele, vem da desmobilização de vários serviços de atendimento aos pacientes, principalmente no setor público. É o caso dos hospitais Jayme Santos Neves e Dório Silva, destinado agora ao atendimento de pacientes com o novo coronavírus. Reduzir quadros médicos neste momento, por mais que possa parecer ociosidade, é muito preocupante, assinala.
Durante a pandemia também foram suspensas a realização das chamadas cirurgias eletivas, as que eram agendadas. A decisão também abrange alguns procedimentos, como endoscopias. Estão sendo realizados, até por orientação do CRM, só os procedimentos de urgência e emergência para diagnósticos mais graves, como câncer, ou curativos para conter hemorragias, por exemplo. Vários serviços oferecidos nos hospitais foram desmobilizados porque as cirurgias só ocorrem para estados graves, até por demandarem, em alguns casos, um pós-operatório e é preciso preservar leitos para casos da Covid-19, relata.
O Conselho Regional de Enfermagem (Coren-ES) diz que tem buscado junto ao Estado e prefeituras informações sobre a contaminação dos profissionais. Segundo a presidente da instituição, Andressa Barcellos, faltam informações mais detalhadas. Queremos saber quem são as pessoas, onde trabalham, como ocorreu a contaminação, quais casos são confirmados, investigados, em afastamento, internados, em UTI e recuperados. Falta clareza nos números. São dados essenciais até para fazermos uma atuação preventiva que impeça a contaminação de outros profissionais, destaca.
Ela é outra que reforça que o risco maior de contaminação ocorre no momento de desparamentação. Para o Coren, ajudaria muito se os hospitais e unidades tivessem câmaras de descontaminação. Historicamente temos vários relatos de que a contaminação ocorre no momento de retirar a roupa de proteção. Câmaras de desinfecção são importantes. O improviso é um fator que contribui para a contaminação, aponta, acrescentando que muitos locais não oferecem nem vestuário nem espaço para os profissionais tomarem banho após o atendimento.
Outro ponto, segundo ela, é saber se esses profissionais estão retornando ao trabalho após realização de novos exames que comprovem que não estão com o novo coronavírus. É feito um teste rápido, mas e a sorologia, foi feita? O risco é para todos, pondera.
Segundo Andressa, os profissionais da enfermagem lidam com baixos salários e, em decorrência disso, acabam tendo vários empregos, com jornadas de trabalho cansativas. Nós não temos em lei uma jornada regulamentada, como outras categorias. É comum profissionais que trabalham 400 horas por mês, em uma sobrecarga muito grande. E neste momento da pandemia, muitas instituições estão demitindo, o que agrava a situação, relata.
O Coren também fez um vídeo com orientações para os profissionais da enfermagem que estão sendo vítimas de hostilização, pedindo entre outros pontos que evitem usar o uniforme de serviço fora do ambiente de trabalho.
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