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Cresce no ES o número de bebês registrados só com nome da mãe; entenda

Cresce no ES o número de bebês registrados só com nome da mãe; entenda

Seis a cada cem crianças, um total de nove por dia, recebem a certidão sem ter o nome paterno. Motivo varia e não tem relação apenas com a falta de reconhecimento

Publicado em 7 de maio de 2022 às 19:33

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Kerolyne Izidoro da Silva, ela registrou o filho sem o nome do pai na certidão.
Kerolyne registrou o filho Gael sem o nome do pai e agora vai tentar o reconhecimento . (Ricardo Medeiros)

Todos os dias pelo menos nove crianças que nascem no Espírito Santo são registradas sem pai.  Entre janeiro e 29 de abril deste ano, 1.040 bebês não receberam o nome paterno na certidão de nascimento, o equivalente a 6% dos registros civis feitos no Estado no período, segundo dados da Transparência Civil.

O número de registros do nascimento sem a informação da paternidade cresceu 4,5% nos quatro meses deste ano em comparação com o mesmo período do ano anterior, apontam informações do cartório, quando 995 documentos foram emitidos. 

Não ter a filiação completa não se trata apenas de formalidade documental e pode acarretar impactos até a vida adulta. Por isso, buscar o reconhecimento é um direito. 

A jovem Kerolyne Izidoro da Silva, 20 anos, vai começar esta batalha para garantir o nome do pai de seu filho Gael na certidão da criança. A ausência de reconhecimento, neste caso, não foi por falta de vontade paterna, mas o rapaz com quem ela namorava havia 11 meses, e já dividia a casa, morreu. 

Na ocasião, Kerolyne não havia completado dois meses de gestação e por pouco não sofreu um aborto espontâneo, diante da tragédia de uma morte inesperada e violenta. Gael sobreviveu com a mãe ao sofrimento da perda e nasceu no último dia 9. Kerolyne o registrou nesta quarta-feira  (20) e, com o documento em mãos, planeja ingressar com um pedido de reconhecimento de paternidade, por meio do exame de DNA de familiares do namorado. 

Para a jovem, é fundamental ao futuro do filho que ele carregue o sobrenome do pai. "Eu também nunca vou deixar o Gael esquecê-lo. Vou mostrar fotos e dizer como ele era importante",  afirma Kerolyne. 

Diretora de Registro Civil do Sinoreg-ES, Fabiana Aurich observa que a ausência do reconhecimento paterno remonta de décadas em que filhos gerados fora de um casamento eram tratados como "bastardos" e renegados também na sociedade. "O impacto psicológico na vida dessas crianças é enorme, mas atualmente a Justiça tem concedido várias decisões de dano moral a esses filhos que cresceram sem a presença do pai", aponta. 

RECONHECIMENTO ESPONTÂNEO

Por outro lado, ela diz que alguns pais têm buscado fazer o reconhecimento espontaneamente, ainda que de forma tardia. Nesses casos, explica Fabiana, não é necessário ir ao mesmo cartório do registro de nascimento.  "A criança é registrada em Cariacica e o pai está lá em Ecoporanga, pode fazer o reconhecimento no cartório da cidade onde está. Não tem essa desculpa da distância. E o reconhecimento de paternidade é gratuito."

Mas, para suprir a frustração de muitas mães que não obtinham o reconhecimento de seus filhos de maneira espontânea, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) criou mecanismos para facilitar o procedimento de identificação, segundo conta Diniz Cypreste de Azevedo, também diretor do Sinoreg-ES. "Quando ele se nega a comparecer ao cartório para registrar, a mãe pode indicar quem é o pai."

O próximo passo, nessas situações, é recorrer à Defensoria Pública que dará prosseguimento ao pedido de investigação de paternidade, com a realização de exame de DNA. 

A defensora Priscila Libório, que atua na área de Família, ressalta que a qualquer tempo a mãe pode solicitar a investigação para seu filho menor de idade. E mesmo adulto, se for do interesse pessoal, quem não teve o reconhecimento na infância pode requisitar a apuração do caso.  

"E não é preciso ter certeza  de quem é o pai, ou um exame de DNA prévio. Bastam indícios para abrir um pedido de investigação", explica. 

Priscila Libório frisa que hoje os recursos tecnológicos facilitam a procura pelo suposto pai, mesmo depois de passados muitos anos do nascimento do filho, com a consulta a registros em instituição financeira, departamentos de trânsito, cartórios eleitorais ou até em cadastro de emprego do Ministério do Trabalho.  Mas, para tanto, é importante ter o nome completo de quem seria a figura paterna. 

Contudo, nem sempre a falta de registro é sinal de abandono paterno. Por vezes, constata Priscila, é a mãe quem não quer indicar o provável pai por razões diversas, como o medo de perder a guarda quando o homem tem mais recursos financeiros. Em situações assim, há dois direitos em conflito - o de intimidade da mãe e o do filho em saber quem é o pai - e a resolução só vai ocorrer se a mulher mudar de ideia ou, então, quando o filho se tornar adulto. 

"O impacto da ausência é muito grande. A pessoa que tem o pai e não é presente, já tem impacto, se a pessoa não tem o pai, sente como se nem tivesse a chance de ter uma referência. É como se perdesse metade da referência que teria na vida. Muitos não se desenvolvem na escola e também acabam não sendo bons pais para seus próprios filhos. É incrível como as histórias se repetem! ", atesta a defensora. 

Priscila Libório acrescenta que cerca de 80% dos internos das instituições de menores infratores não têm registro do pai. "Com a falta dessa figura paterna, a criança e o adolescente vão buscar essa figura em outro lugar, que muitas vezes está no mundo das drogas, no traficante."

O psicólogo Antônio Carlos Félix das Neves, doutor pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj) e com livro publicado sobre o tema, aponta que, com base em pesquisa feita com o Ministério Público do Estado do Espírito Santo (MPES), a função paterna depende do desejo da mãe enquanto mulher.

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"Às vezes ela indica um homem como pai, e ele não é, porque esse era o desejo dela de ter aquele homem para si; outras vezes até é o pai, mas quando ele coloca em dúvida, ela fica ressentida e, para ele, é cômodo deixar essa dúvida", exemplifica. De uma forma ou outra, o prejuízo maior é da criança que, muitas vezes, se torna apenas alguém para curar o desamparo materno e não tem quem faça a mediação por ela. 

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