Trinta e dois dias separam a morte de Kátia Matos da Silva Ferreira - assassinada pelo marido dentro de casa, em Jardim da Penha, em abril deste ano -, da morte do pai dela. Internado em um hospital há um mês, o motorista aposentado Valdir Cunha da Silva, de 78 anos, faleceu na madrugada desta quinta-feira (13).
Valdir foi internado um dia depois do sepultamento da única filha, no dia 13 de abril, com problemas no coração. Ao longo dos últimos 30 dias, conversou pouco e se recusou a comer. Para a família, o aposentado desistiu de viver.
"Ele internou no dia seguinte ao enterro da Katia. Na verdade, ele chegou em casa após o enterro já passando mal. Amanheceu no outro dia com muita dor no peito. Só suportou enterrar a filha mesmo, e depois não aguentou mais. Em um mês, ele foi só decaindo. Entrou direto para a unidade coronariana, ficou lá 15 dias. Pegou Covid no hospital, mas se recuperou. Na última segunda-feira ele foi para a UTI e aí já não abria mais o olho, não respondia direito. Eu senti que realmente ele tinha se entregado", contou Iani de Almeida Matos, de 50 anos, sobrinha de Valdir.
Iani lembra que foi Valdir quem reconheceu o corpo da filha, no dia do crime que abalou toda a família. O aposentado também esteve no apartamento onde Kátia foi morta com um tiro na frente da neta de Valdir, uma menina de apenas 11 anos.
"Isso tudo foi acarretado por aquele tiro, dado há um mês e dois dias. Ele viu a cena, viu o corpo da filha dele ensanguentado no chão. No hospital chegou a dizer que a cena não saía da cabeça dele. Eu também vi e a cena, não me sai da cabeça", lamenta a sobrinha.
Mais de um mês após a morte de Kátia, a família ainda tenta se organizar. A filha da professora vive, provisoriamente, com os primos e tem recebido tratamento psicológico. "Estávamos esperando o tio sair do hospital para resolver muitas pendências. A gente não faz a menor ideia de como vamos resolver tudo agora", admite.
Segundo Iani, a criança não pergunta pelo pai nem faz qualquer comentário referente ao dia do crime. "Ela bloqueou muitas coisas. Não fala do momento, não fala e nem pergunta do pai. Algumas vezes fala que sente saudade da mãe. O que essa menina viu, ninguém nunca vai saber. A gente não tem coragem de perguntar, e só vamos saber se ela um dia quiser contar", afirma a prima.
Do núcleo familiar de Kátia, sobrou apenas a filha, de 11 anos, e a mãe. Dona Iaci tem 79 anos, é acamada, tem Parkinson em estado avançado e é acompanhada 24 horas por dia por uma cuidadora. Para a família é difícil avaliar ao certo o que ela sabe - e se realmente entende - tudo que aconteceu.
"Ela não fala, não se expressa reação nenhuma. Não pergunta sobre nada. A ficha dela cai por alguns momentos e depois parece que vem um véu e encobre tudo. Acho que minha tia não precisa saber de mais nada. Não tem nem como chegar para ela, no estado em que ela se encontra, e dizer agora que meu tio morreu. Se ela perguntar, nós vamos analisar como contar", explica a sobrinha.
A professora Kátia Matos, de 49 anos, foi assassinada com um tiro na noite do dia 11 de abril, dentro de um apartamento no bairro Jardim da Penha, em Vitória, na frente da filha de apenas 11 anos de idade. O marido da vítima e pai da criança, identificado como Márcio Borges Ferreira, cabo da Polícia Militar, foi preso em flagrante, apontado como autor do crime.
O policial militar foi autuado por homicídio qualificado por motivo fútil, por impossibilitar a defesa da vítima e por ser contra mulher em contexto de violência doméstica, e majorado, por ter sido na frente da filha do casal. De acordo com a PM, o cabo ficará detido no presídio da instituição, em Maruípe, que também fica na Capital.
O crime ocorreu no segundo andar do prédio onde a família morava, por volta das 19 horas. De acordo com informações de testemunhas que acionaram o Centro Integrado Operacional de Defesa Social (Ciodes), a criança de 11 anos presenciou a morte da mãe e saiu para pedir ajuda aos vizinhos.
Na época do crime, um vizinho da família, que preferiu não se identificar, afirmou que já existiu um inquérito contra Márcio Borges Ferreira, que poderia ter resultado na expulsão da Polícia Militar. No entanto, como a então esposa Kátia retirou a queixa, o marido conseguiu ser promovido a cabo recentemente.
De acordo com o boletim da Polícia Militar, quando os policiais chegaram ao prédio onde ocorreu o fato, o suspeito estava no local e teria levado os colegas de profissão até a cena do crime. De lá, ele foi levado por uma viatura da PM e chegou a receber atendimento médico por se queixar de mal-estar e dores de cabeça.
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