Além da escassez de vacinas contra a Covid-19, o Brasil também precisa superar outra barreira para vencer a pandemia: as fake news, que são aquelas informações falsas que se multiplicam nas redes sociais e aplicativos de mensagens. Por desinformação, muitas pessoas estão recusando as vacinas e colocando a imunidade coletiva em risco.
Mas esse desserviço para a saúde coletiva não é um problema que surgiu com a pandemia do coronavírus. A desinformação vem desestimulando os brasileiros a serem imunizados contra diversas doenças desde 2013, segundo pesquisa da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).
"As fake news podem provocar a redução na confiança de uma vacina, ou seja, hesitação vacinal", observou a professora Sheila Lachtim, da Escola de Enfermagem da UFMG, que coordenou as pesquisas.
O estudo analisou notícias falsas verificadas por sites de checagem de fake news de 2010 a 2019. Paralelamente à disseminação dessas mentiras ou distorções, houve uma queda na cobertura vacinal no Brasil.
"Chegamos a duas categorias de fake news sobre vacinas. Uma delas são as de conteúdo imunobiológicos, ou seja, informações de que as vacinas deixam sequelas e oferecem risco de morte. Já na outra categoria estão as falsas notícias afirmando que as vacinas são desnecessárias, pois o corpo reagiria às doenças naturalmente. As duas constroem uma narrativa que contradiz a eficácia das vacinas, de modo a convencer o usuário de que o imunizante é dispensável à sua saúde", detalha a pesquisadora.
Quando observamos o Espírito Santo, podemos citar um exemplo anterior ao coronavírus, que foi o ressurgimento de casos de sarampo, doença considerada erradicada no Brasil pela Organização Pan Americana de Saúde (Opas) em 2016. No Estado, foram quatro casos confirmados em 2019.
"A desinformação impacta na adesão das pessoas, pois desencadeia hesitação, ou seja, não tomam a vacina porque não acreditam que ela seja importante. O sarampo teve uma queda da cobertura vacinal, levando ao retorno de casos", observou Daniele Grillo, coordenadora estadual do Programa de Imunizações e Vigilância das Doenças Imunopreveníveis do Espírito Santo.
Outro exemplo aconteceu em 2014 com a vacina contra HPV, responsável por evitar câncer de colo do útero. "Mensagens com falsas informações de que a vacina provoca paralisia nas meninas amedrontou as famílias e levou a uma queda do número de meninas vacinadas que não conseguimos até hoje reverter", completou Daniele.
Essas reduções significativas de confiança nas vacinas ficaram mais expressivas nos últimos anos pelo incentivo de movimentos antivacinas.
"Vivemos uma 'infodemia', onde as pessoas têm dificuldade para selecionar o que é ou não real, em especial pela presença massiva de robôs virtuais que espalham essas informações falsas ou distorcidas. A situação é impulsionada pelos compartilhamentos nas redes sociais e no WhatsApp, potencializando os efeitos", observa Lachtim.
A professora descreve que a eficácia dos imunizantes já foi comprovada ao longo de anos de erradicação de outras doenças ou da redução de mortes. "Diminuímos a mortalidade, as sequelas e os registros das doenças. Uma opinião ou questões pessoais não podem se sobressair a uma evidência científica", completou.
Para tentar reduzir o impacto social desastroso das fake news, muitos sites e grupos trabalham para desmentir as informações a partir da verificação dos fatos. Um exemplo é o Projeto Comprova, que reúne 24 veículos de imprensa do Brasil - incluindo A Gazeta - para combater a desinformação.
Um vídeo divulgado no Facebook mostrando uma idosa grudando uma moeda no local do braço que recebeu a vacina contra a Covid-19 repercutiu na internet. Professores de Física se reuniram para mostrar que a relação com a vacina era inexistente. Na verdade, era apenas um princípio científico: superfícies e partículas formadas por moléculas diferentes tendem a grudar uma na outra.
A vacina contra a HPV, destinada a meninas com idades entre 9 e 14 anos, já foi alvo de inúmeras fake news. Quanto mais aparecem mais falsas informações, menor é a cobertura vacinal, em especial por se tratar de menores de idade que dependem de um adulto para levá-los ao posto de saúde. Vale lembrar que a vacina contra o HPV é a única que protege contra um câncer.
A partir da década de 90, a distribuição da vacina contra sarampo em todo o território nacional reduziu a quase zero os casos da doença. Isso criou a falsa ideia de que não seria necessário mais vacinar, levando à queda de cobertura vacinal entre os brasileiros e ao aumento dos grupos de pais resistentes ao procedimento. Em decorrência disso, o país passou a ter surtos isolados e que se não bloqueados com vacinação podem provocar uma epidemia mais grave, pelo vírus ser altamente contagioso. Por isso, vacinar é indispensável.
Uma teoria conspiratória sobre o coronavírus ganhou as redes sociais ao afirmar que as vacinas contra o vírus contêm microchips para colher dados pessoais e a identidade biométrica dos vacinados. A tese falsa reúne dados de um projeto de verificação de identidade digital à perspectiva de acesso mundial do imunizante.
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