Uma pesquisa divulgada nesta semana pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), sobre casos de reinfecção pela Covid-19, constatou que uma segunda incidência da doença pode vir em forma mais grave do que a primeira. O estudo apontou que a memória para a resposta do sistema imunológico ao coronavírus, que impediria uma nova infecção, pode não acontecer em casos brandos.
De acordo com microdados do Painel Covid-19, divulgado pela Secretaria de Estado da Saúde (Sesa), mais de 16 mil pessoas no Espírito Santo tiveram o exame PCR positivo sem que tivessem apresentado qualquer sintoma. Das pessoas consideradas infectadas em algum momento, mais de 49 mil foram consideradas assintomáticas.
A Gazeta ouviu especialistas para entender se uma reinfecção nestes casos seria, necessariamente, acompanhada de sintomas e com chances de maior gravidade que a primeira contaminação.
De acordo com o médico infectologista Lauro Ferreira Pinto, o estudo da Fiocruz mostra algo que já vinha sendo relatado cientificamente, já que há pesquisas semelhantes acontecendo em outros locais do mundo.
"Existe um estudo publicado pelo grupo de Oxford no dia 23 no New England Journal of Medicine, que é a mais importante revista médica americana, em que foram acompanhados 12 mil profissionais de saúde por um período de 6 meses. A pesquisa mostrou algumas coisas e uma delas é positiva: a reinfecção não é comum e é importante falar isso para não apavorar as pessoas", destacou.
Apesar de incomum, outro fato é que a reinfecção de fato existe. "Ela pode ser mais branda ou mais grave. Há casos mais brandos de reinfecção, como o caso mais clássico de uma pessoa que chegou no aeroporto de Seul, na Coréia do Sul, e já tinha tido coronavírus no passado. O teste do aeroporto mostrou que ela estava infectada novamente e não tinha sintoma nenhum. Mas há casos mais graves e tem caso, pelo menos um, de reinfecção que levou à morte, no caso de alguém que tinha uma deficiência imune grave e faleceu".
Para o especialista, o trabalho da Fiocruz ressalta que pessoas que tiveram casos mais leves estão mais sujeitas à reinfecção, assim como também demonstrou o estudo de Oxford.
"O teste de anticorpos, como o que é feito pela Abbott, parece mostrar algum grau de proteção. O que o grupo de Oxford mostrou é que as pessoas que têm anticorpos em níveis bons no sangue, mais dificilmente serão reinfectadas, apesar de não ser impossível. Mas isso é mais comum quando os anticorpos desaparecem. Apesar disso, o risco parece ser maior nos que tiveram casos mais leves e que os anticorpos desapareceram mais rapidamente", ponderou.
De acordo com a pós-doutora em Epidemiologia e professora da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes) Ethel Maciel, que é consultora da Organização Mundial de Saúde (OMS), ainda não é possível afirmar categoricamente que uma segunda infecção pelo coronavírus seja de fato mais grave.
Segundo ela, a memória imunológica parece durar entre 6 e 8 meses, como apontam alguns estudos. Logo, ela entende que não há consenso até o momento sobre os efeitos de uma segunda infecção pela Covid-19.
"Algumas pessoas que se infectaram no início podem se reinfectar agora, mas essa questão da segunda vez ser mais grave ainda não é um consenso na literatura científica, porque alguns casos relatados não foram mais graves. Precisamos acompanhar melhor esses casos para poder afirmar com certeza", afirmou.
A descoberta da Fiocruz, no sentido de que a reinfecção pode ser mais grave que a primeira contaminação pelo vírus, se deu após o sequenciamento dos genótipos do novo coronavírus. O artigo escrito foi coordenado pelo pesquisador do Centro de Desenvolvimento Tecnológico em Saúde (CDTS/Fiocruz) Thiago Moreno.
A pesquisa acompanhou quatro indivíduos assintomáticos semanalmente a partir do início da pandemia, em março. Durante a pesquisa, foram feitos testes sorológicos e RT-PCR nas pessoas acompanhadas.
No sequenciamento dos genomas, os pesquisadores confirmaram que uma pessoa contraiu o vírus associado a um genoma importado para o país e outra apresentou uma estrutura viral associada ao genoma que já circulava pelo Rio de Janeiro. Todos os indivíduos testaram positivo para Covid-19 e eram assintomáticos.
Segundo divulgou a fundação, de acordo com Thiago Moreno, uma das pessoas acompanhadas procurou novamente o grupo de pesquisa no final de maio, alegando sinais e sintomas mais fortes de Covid-19, como febre e perda de paladar e olfato.
Para o virologista, o trabalho reforçou a noção de que a reinfecção pelo novo coronavírus é possível, e que é algo comum entre vírus respiratórios, enfatizando que a primeira exposição ao vírus não é formadora de memória imune.
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