A intensa divulgação, sobretudo em redes sociais e aplicativos de mensagem, sobre a combinação de remédios para tratar a Covid-19 levou cinco sociedades médicas do Espírito Santo a elaborar uma nota pública alertando a população, e também profissionais de saúde, sobre o uso indevido de medicamentos como a cloroquina, por não ter comprovação científica de sua eficácia nos cuidados de pacientes com a doença.
"Muitas destas divulgações devem ser analisadas com cautela, pois, mesmo sem evidência científica robusta, informam a população leiga acerca de possíveis tratamentos e estimulam a coerção dos profissionais de saúde, ferindo autonomia e preceitos éticos", destaca o primeiro trecho da nota, que foi assinada pelas Sociedades de Infectologia, de Geriatria e Gerontologia, de Pediatria, de Pneumologia e pela Associação Capixaba de Medicina de Família e Comunidade.
O documento ainda ressalta dois dispositivos do Código de Ética Médica: o primeiro aponta o direito do profissional indicar o procedimento adequado ao paciente, desde que observadas as práticas cientificamente reconhecidas e respeitada a legislação; e o segundo que os médicos não devem divulgar, fora do meio científico, processo de tratamento que não esteja expressamente reconhecido por órgão competente.
Presidente da Sociedade de Infectologia no Espírito Santo, Alexandre Rodrigues frisa que, em cerca de 80% dos pacientes infectados pelo coronavírus, a doença evolui sem gravidade e, portanto, bastaria tratar os sintomas. "Muitos melhoram de qualquer forma, e poderiam tomar até farinha que iriam se recuperar. Mas, usando esses remédios associados, sem comprovação de eficácia, o paciente pode sofrer danos." Há relatos de náuseas, diarreia, vômito e, em cardiopatas, há risco de alterações cardíacas.
A nota ainda chama a atenção para o fato de prefeituras terem divulgado a incorporação de protocolos de tratamento para a Covid-19 fora do ambiente de pesquisa clínica, sem eficácia comprovada até o momento e sem respeito à autonomia do médico.
"Importante lembrar que o direcionamento de recursos públicos deve priorizar medidas de eficácia comprovada, como a proteção dos profissionais de saúde com equipamentos de proteção individual, manutenção de espaços de atendimento à população, veiculação de campanhas informativas sérias, fornecimento de testes diagnósticos, isolamento de indivíduos infectados e garantia de leitos para os que necessitarem", sustentam, no documento, as cinco sociedades médicas.
Alexandre Rodrigues observa que a conduta de alguns políticos tem sido a de estimular denúncia contra médicos, caso não queiram prescrever as medicações, quando ainda não existe um protocolo reconhecido de uso dos remédios no tratamento de pacientes com a Covid-19. A nota, segundo ele, é um meio também de demonstrar aos profissionais que eles têm apoio para não fazer prescrições sob pressão.
"Se prefeituras, por exemplo, usassem esses medicamentos para protocolos de pesquisa para avaliar o resultado, isso sim poderia ser benéfico. Produziria informação e estaria dentro dos preceitos éticos. Mas, da maneira que está sendo feito o uso das medicações, não oferece benefício nenhuma para a população."
As entidades ainda compartilham, na nota, os posicionamentos publicados pelas sociedades científicas nacionais. No caso da cloroquina, destacam que, até o momento, os principais estudos clínicos feitos com grupos de controle não demonstraram benefício do uso da substância, nem da hidroxicloroquina, no tratamento de pacientes hospitalizados, porém há relatos de efeitos colaterais. Para pessoas com sintomas leves e moderados, ainda não há resultado. Medicamentos antiparasitários, como a ivermectina, também não demonstraram eficácia em seres humanos.
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