> >
Entre a gratidão e a saia-justa: conheça a rotina dos vacinadores no ES

Entre a gratidão e a saia-justa: conheça a rotina dos vacinadores no ES

Profissionais que aplicam a vacina convivem diariamente com relatos de quem venceu a Covid-19 e com a desconfiança sobre o seu trabalho

Publicado em 6 de setembro de 2021 às 10:51

Ícone - Tempo de Leitura min de leitura
Técnico de Enfermagem e vacinador João Victor das Neves aplica até 250 imunizantes contra covid-19 diariamente.
Técnico de Enfermagem e vacinador, João Victor das Neves, aplica até 250 imunizantes contra covid-19 diariamente. . (Arquivo Pessoal )

Diariamente, as redes sociais são invadidas por fotos de pessoas comemorando a vacinação contra a Covid-19. Por trás de cada relato, existe um profissional responsável por fazer este momento acontecer: o vacinador.

Sejam técnicos de enfermagem, enfermeiros, estudantes da área de biomédicas, cada profissional tem uma história marcante durante a aplicação do imunizante. Um exemplo é a técnica de enfermagem Adriana Rodrigues Campos, de 45 anos. Há 21 anos ela exerce a profissão, mas nunca se sentiu tão desafiada quanto nesta pandemia.

“Em junho de 2020, eu perdi a minha mãe, de 86 anos, para a Covid-19. Na época, por ser profissional da saúde, estava há cerca de um mês sem vê-la. Foi um momento muito dolorido. Em janeiro deste ano, quando a imunização começou, foi uma mistura de dor e alívio. Dor porque a minha mãe não teve a mesma oportunidade, e alívio porque a vacinação começou nos idosos. Via o olhar dela em cada um deles”, lembra.

Em março deste ano, em mais um dia de trabalho na Unidade de Saúde do Ibes, em Vila Velha, a técnica de enfermagem viveu uma situação inusitada. Ao vacinar uma senhora, emocionou-se com a semelhança que ela tinha com a sua mãe.

GRATIDÃO E CONSTRANGIMENTO 

Segundo a técnica de enfermagem Adriana, o dia dos vacinadores que aplicam a vacina contra a covid-19 é marcado não apenas por relatos que motivam e posts nas redes sociais de agradecimento, mas, também, por situações constrangedoras, que são contornadas com gentileza e compreensão.

“Muita gente conta a sua história de vitória contra a covid-19 e nos enche de agradecimento por entender que estamos na linha de frente da pandemia. Por outro lado, também há situações constrangedoras, de pessoas que querem olhar a caixa onde as vacinas estão armazenadas, de muitas pessoas da mesma família querer entrar na sala de vacinação, de, mesmo quando explicamos o passo a passo, duvidarem do nosso trabalho”, comenta.

Nas situações constrangedoras, Adriana pontua que tenta contornar da melhor forma possível, explicando à pessoa o passo da aplicação da vacina, desde o momento em que o imunizante ainda está no frasco até o pós aplicação, quando a seringa está vazia.

“Ficamos constrangidos, mas tentamos fazer da melhor forma possível, e entendemos também essas pessoas. Todo mundo está vivendo algo que nunca viveu antes, inclusive a gente, e o que mais queremos é que a vacinação avance e que a pandemia tenha um fim”, pontua.

Até 250 aplicações de vacina por dia

O Técnico de Enfermagem João Victor das Neves Jerônimo, de 40 anos, exerce a profissão há 19 anos. Destes, sete deles são dedicados a aplicar vacinas na Unidade do Forte São João, em Vitória. Segundo ele, o trabalho diário ficou mais cansativo com a campanha de imunização contra da covid-19.

Técnico de Enfermagem e vacinador João Victor das Neves aplica até 250 imunizantes contra covid-19 diariamente.
Técnico de Enfermagem e vacinador João Victor das Neves aplica até 250 imunizantes contra covid-19 diariamente. . (Arquivo Pessoal )

“Em média, eu faço a aplicação de 200 a 250 doses de vacina contra covid-19 diariamente. Todos os dias, é uma emoção diferente. No dia 27 de março, vacinei o meu pai Waldecy Jerônimo, de 70 anos; e minha mãe Maria da Penha das Neves, 66 anos “Foi um alívio e uma felicidade total para mim e para eles. Toda a nossa família aguardava a imunização deles, que são idosos e têm comorbidades”, lembra.

Além da emoção de aplicar a vacina nos próprios pais, João também vacinou a sua irmã Waléria das Neves Jerônimo, de 33 anos, incluída no grupo de comorbidades; e a sua esposa, Elaine Cristina da Silva, de 39 anos. 

Aspas de citação

Eu ficava com o coração na mão de tanta preocupação com a minha irmã. Quando ela veio de vacinar, ainda mais por mim, foi um alívio. Com a minha esposa, foi a mesma coisa, porque tinha medo de levar a doença para casa e contaminar ela e os meus filhos. A minha vontade era de dormir no carro para evitar qualquer tipo de contato... Quando a faixa etária dela chegou e conseguimos marcar, foi uma emoção

João Victor das Neves Jerônimo
Técnico de Enfermagem e Vacinador 
Aspas de citação

Histórias de pessoas desconhecidas também emocionam o dia a dia dos vacinadores. “Na primeira semana de maio, fui vacinar uma paciente obesa, que estava acompanhada de sua irmã. As duas começaram a chorar durante a aplicação… Nós respeitamos o momento delas, que, em seguida, disseram que aquele choro era uma mistura de alívio e de dor, pois haviam perdido a mãe para a doença, que não teve a oportunidade de se imunizar. Foi impossível não se emocionar”, conta João.

O vacinador também conta que, assim como tem gente que conta as horas para receber uma dose da vacina; outras, por não receberem o imunizante da marca que querem, desistem de tomar a vacina nos arredores da Unidade de Saúde.

“Quando ainda estão na fila, e ficam sabendo qual o imunizante será aplicado, algumas pessoas desistem porque não é o que elas querem. Caso elas nos perguntem, o nosso trabalho é sempre esclarecer com muita cordialidade que todas as vacinas foram testadas, aprovadas e são seguras”, explica.

João acrescenta ainda que outro dificultador do trabalho dos vacinadores é o celular usado pelos pacientes, que, muitas vezes, se distraem com o aparelho, perdem o momento exato da aplicação, e depois questionam se a dose foi realmente aplicada.

“Considero esses questionamentos do nosso trabalho como uma agressão verbal. São situações chatas que acontecem constantemente. A gente é responsável por administrar a dose, mostrar o frasco, perguntar se podemos aplicar o imunizante. Mas tem gente que realmente questiona se aplicamos direito e se foi a vacina certa de forma desagradável. Tentamos contornar da melhor forma possível, explicando e até mostrando a nota fiscal da vacina. Caso a pessoa tenha uma conduta mais agressiva, a enfermeira responsável por acompanhar a vacinação no local intervém, conversando com aquela pessoa”, comenta.

João Victor vacina a sua mãe Maria da Penha das Neves, 66 anos. (Arquivo Pessoal )

DOSES DE ESPERANÇA 

Para a Técnica de Enfermagem, Vacinadora e Estudante de Enfermagem, Luciane Fantoni, de 53 anos, a vacinação é uma forma de proporcionar às pessoas uma dose de esperança, principalmente durante a pandemia da covid-19. Ela trabalha na Unidade de Saúde de Taquara I, na Serra, durante a manhã na sala de vacinas.

“Quando eu vacinei o meu primeiro paciente contra covid-19, eu chorei. É um misto de emoções indescritíveis. A campanha contra covid-19 exige muito de nós vacinadores, que temos que estar de prontidão o tempo inteiro. Por outro lado, receber o olhar de gratidão dessas pessoas faz o trabalho valer a pena”, comenta.

Luciane nunca passou por uma situação de constrangimento dentro da sala de vacinas, tem colegas que vivenciaram essa situação. “Muitas vezes, as pessoas perguntam se a gente sabe o que está fazendo, se sabe qual vacina estamos aplicando, dentre outros questionamentos. Eu levo de forma descontraída e com muito jogo de cintura para a pessoa sentir segurança, mas tenho colegas que já foram agredidas verbalmente como pessoas e profissionais na campanha de imunização da covid-19”, salienta Luciene.

“As pessoas precisam lembrar que o que precisamos é respeito. Estamos na linha de frente, levando vacina, que é a melhor maneira de vencer a pandemia, para todos. Independente dos nossos próprios problemas particulares, estamos trabalhando para que todos possam voltar ao velho normal”, acrescenta.

A técnica de enfermagem, Luciane Fontaine, vacinar é uma forma de proporcionar às pessoas uma dose de esperança, principalmente durante a pandemia da covid-19.
Para a técnica de enfermagem e vacinadora, Luciane Fontaine, vacinar é uma forma de proporcionar às pessoas uma dose de esperança, principalmente durante a pandemia da covid-19. (Arquivo pessoal)

TÉCNICA E DOM

Para ser vacinador, os profissionais da saúde interessados devem fazer um curso específico, ofertado pelas prefeituras municipais, para atuar dentro das salas de vacinas. Dentre o conhecimento adquirido, estão conceitos básicos de imunização, utilização de técnicas correta de aplicação de imunopreviníveis, como interpretar o calendário vacinal, boas práticas de higienização e segurança, como lidar com eventos adversos, assepsia e organização da sala de vacina e como manusear e descartar o material utilizado. 

Para a técnica de enfermagem, Luciene Fantoni, além da capacitação técnica, é necessário muito estudo. "É fundamental estar atualizado sobre as pesquisas realizadas, quais vacinas são inseridas no calendário vacinal, as rotinas e processos que são de responsabilidade do vacinador. Quem está de fora, imagina que vacinar é apenas furar o braço e pronto, mas requer conhecimento, técnica, cuidados com preparo e conservação dos imunobiológicos. Tem todo um aparato burocrático que não pode deixar de ser registrado, pois vai para base nacional de dados do Ministério da Saúde. São muitos detalhes", pontua. 

Além da rotina dentro da sala de vacina, outras incumbências são de responsabilidade dos vacinadores, como, por exemplo, a busca ativa por pacientes faltosos e um olhar atento para cada cidadão ou família que adentra a sala de vacina.

Aspas de citação

Para algumas pessoas, parece pouco o que fazemos, mas não é. Dependendo do paciente, nos tornamos assistente social, psicólogos e, em algumas situações, até criamos laços de amizade, principalmente quando se atua na mesma comunidade por muitos anos... Temos o privilégio de ver crianças crescerem e depois trazerem seus filhos para atendimento conosco. Passamos a conhecer um pouco de cada um, cada família da região.

Luciane Fantoni
Técnica de Enfermagem, Vacinadora e Estudante de Enfermagem,
Aspas de citação

Além da técnica, do equilíbrio emocional e do conhecimento sobre vacinas, o técnico de enfermagem João Victor, saliente que também é preciso ter algo especial: o dom. “Não é todo mundo da área da saúde que tem o dom de aplicar vacina. A aplicação não pode ser feita de qualquer jeito. É preciso saber administrar a dose, ter conhecimento, e lidar com situações imprevisíveis, como as pessoas que têm medo da vacina. Com esse público, por exemplo, temos que passar segurança, acalmar e encorajar o paciente a fazer daquele momento uma vitória”, comenta João Victor.

MUNICÍPIOS ADOTAM ESTRATÉGIAS PARA EVITAR SOBRECARGA DOS VACINADORES

Para avançar na vacinação contra a covid-19 e evitar a sobrecarga de trabalho dos profissionais responsáveis pela aplicação dos imunizantes, a Prefeituras da Grande Vitória adotaram estratégias, como parceria com escolas técnicas e instituições de ensino.

VITÓRIA 

Na capital, a Campanha de Vacinação contra a Covid-19 conta com 70 profissionais na aplicação da vacina, que trabalham nas 28 salas de vacinação do município, nos hospitais, nos postos volantes e com atendimento domiciliar. Cada vacinador, aplica, em média, 150 a 180 doses em 8 horas. O tempo varia, pois, segundo a prefeitura, alguns imunizantes têm técnica de diluição específica, que demandam mais tempo.

Para garantir a agilidade da vacinação sem sobrecarregar os profissionais, a Secretaria do município estabeleceu parcerias com instituições de saúde e de ensino durante a campanha de vacinação contra a Covid-19.

CARIACICA

Em Cariacica, o município conta com cerca de 40 vacinadores para trabalhar das 19 salas de vacina da cidade. Cada profissional aplica, em média, entre 100 e 200 doses do imunizante. Aos finais de semana e feriados, o número de vacinadores dobra, pois profissionais da saúde que atuavam em outras demandas também são incorporados nas equipes dos mutirões.

“Também contamos com os parceiros das escolas técnicas e faculdades com cursos em saúde para que o volume de vacinadores triplique. Dessa forma, chegamos a ter o equivalente a 60 salas de vacinação aproximadamente”, explicou o município por meio de nota.

Segundo o município, todos os vacinadores são capacitados mediante as orientações do calendário básico de vacinação do Ministério da Saúde. “A vigilância epidemiológica replica as capacitações teóricas e práticas a todos técnicos/vacinadores e enfermeiros da rede de atenção ao usuário. Os vacinadores são monitorados e supervisionados quanto à realização das boas práticas de vacinação. Constantes atualizações, mediante as mudanças nos protocolos, as equipes recebem novas orientações e capacitações”, acrescenta a nota.

SERRA

O município da Serra conta com, aproximadamente, 80 vacinadores. Em cada uma das 21 unidades de saúde do município, ficam dois profissionais na sala de vacina, que, em média, aplicam entre 50 e 120 doses cada um.

Nos finais de semana e nos mutirões de vacinação, a equipe de vacinadores passa a ser composta por três técnicos de enfermagem e um enfermeiro a fim de não causar sobrecarga em nenhum profissional envolvido na campanha de imunização.

Quanto às orientações, a Prefeitura da Serra explica que as equipes de imunização recebem treinamento de como aplicar as vacinas dos laboratórios, de como apresentar o imunizante que a pessoa receberá, além de serem orientados e explicar a importância, segurança e eficácia da vacina caso o cidadão apresente receio de tomar o imunizante.

GUARAPARI 

Segundo a Secretaria de Saúde do município, são aproximadamente 30 funcionários atuando especificamente na vacinação da Covid-19.

Segundo a Prefeitura, os profissionais recebem kit lanche e almoço, trabalham em em local arejado e trabalham por escala a fim de proporcionar um maior tempo de descanso.

VILA VELHA 

Não passou informações sobre a quantidade de vacinadores no município, a rotina de trabalho desses profissionais e o apoio para evitar a sobrecarga de trabalho durante a campanha de imunização contra covid-19.

Notou alguma informação incorreta no conteúdo de A Gazeta? Nos ajude a corrigir o mais rapido possível! Clique no botão ao lado e envie sua mensagem

Envie sua sugestão, comentário ou crítica diretamente aos editores de A Gazeta

A Gazeta integra o

The Trust Project
Saiba mais