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ES supera os 2 mil óbitos por Covid-19 com mais mortes entre negros

ES supera os 2 mil óbitos por Covid-19 com mais mortes entre negros

Mais de 40% dos que morreram com a doença são negros e ainda moradores de bairros de periferias da Grande Vitória. O percentual é  superior às mortes registradas entre a população branca

Publicado em 12 de julho de 2020 às 16:55

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Movimento Negro realizou protesto e reivindicaram lockdown e hospital de campanha na frente do Palácio Anchieta, Sede do Governo do ES
Movimento Negro realizou protesto em frente do Palácio Anchieta. (Fernando Madeira)

Espírito Santo alcança mais um triste registro ao ultrapassar, na tarde deste domingo (12), a marca de mais de 2 mil mortes por Covid-19, doença causada pelo novo coronavírus. De acordo com informações do Painel Covid-19, ferramenta da Secretaria de Estado da Saúde (Sesa), o Estado registrou 2.010 mortos pela doença.

A virada ocorre um mês após o Estado alcançar o registro de mil óbitos decorrentes da contaminação pela doença, que ocorreu no último dia 13 de junho. Os dados revelam ainda outro triste marcador: a doença tem alcançado com mais voracidade a população negra, que responde por cerca de 42% dos óbitos, segundo dados divulgados até a última sexta-feira (10).

Uma camada da população, que segundo a definição do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e do entendimento do Movimento Negro, é formada pela junção dos pretos e pardos. 

Um número que pode ser ainda maior se levar em consideração que no levantamento realizado pela Sesa há uma parcela expressiva da população que não declarou a sua raça. Eles aparecem no quesito raça como “ignorado”, registrando um total de 17,38% das mortes.

Confira as mortes por raça até a última sexta-feira (10), quando foram registrados 1967 óbitos:

Uma boa parte destas mortes ocorreu nos bairros de periferia da Região Metropolitana de Vitória. É o caso de Planalto Serrano, Feu Rosa, Novo Horizonte e Vila Nova de Colares, na Serra; Itararé, Maria Ortiz Santa Martha, Nova Palestina, em Vitória. Locais de grandes aglomerados urbanos, como observou a professora da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes), Maria Helena Elpídio, membro da Unidade Negra Capixaba (UNC).

Outro dado que confirma como a população negra vem sendo afetada pelo novo coronavírus é a Quarta Etapa do Inquérito Sorológico da Covid-19, realizado pela Sesa, que visa conhecer o impacto da doença na sociedade. O resultado revela que mais de 70% dos entrevistados testaram positivo para a doença

O que vem acontecendo com a população negra durante a pandemia é uma “tragédia”, observa a professora. “Há uma banalização quando a morte chega às periferias, onde fica o silêncio, onde não se tem acesso a políticas públicas, onde não é ouvida a voz destas pessoas, que enfrentam dificuldade para fazer isolamento, para obter o auxílio emergencial porque não contam com internet para fazer a solicitação, com transporte público lotado”, destaca.

Vitória - ES - Coronavírus - Ponto de ônibus na avenida Jerônimo Monteiro, Centro.
Ponto de ônibus na avenida Jerônimo Monteiro, Centro. (Vitor Jubini)

MOVIMENTO NEGRO SE RETIRA DE GRUPOS DE TRABALHO DO GOVERNO

A forma como vêm sendo conduzidas as políticas públicas de combate à pandemia, com destaque para o tratamento direcionado à população negra, levou a Unidade Capixaba Negra (UNC) a se retirar e não participar dos grupos de trabalho, os chamados GTs do governo estadual, destinados ao combate à doença.

Segundo a professora Maria Helena, os índices de óbitos pela Covid-19 mostram a desigualdade existente entre as pessoas brancas e negras, sendo as últimas as mais afetadas pela doença. “Quando a doença chega nas periferias a letalidade é maior, assim como a transmissão. Decidimos participar das discussões para agilizar um conjunto de proposições para resguardar vidas, com atenção especial para a população negra”, relata.

Mas as discussões não avançaram, revela a professora, ao ser constatado que a participação da UNC seria apenas consultiva, não teriam direito a deliberar por ações mais efetivas. “Reivindicamos que a nossa participação fosse de decisão e gestão porque a cada dia mais pessoas estão morrendo e a burocratização implica em vidas perdidas. Fizemos um comunicado ao governo que a condição era do grupo ser deliberativo e que por isto a UNC, lamentavelmente, avalia e chega a conclusão de que os movimentos sociais que representam boa parte da população não tem espaço para serem ouvidos”, assinala Maria Helena.

A UNC, que reúne dezenas de instituições que representam o movimento negro no Estado, entregou ao governo estadual um documento “Reivindicações e Propostas da Unidade Negra Capixaba para o Enfrentamento aos Impactos da Covid-19 na População Negra do ES”, que apresenta um conjunto de proposições objetivando a proteção e a preservação de vidas e que podem ser postas em prática em várias secretarias.

A MAIOR PARTE DA POPULAÇÃO

De acordo com o Instituto Jones dos Santos Neves (IJSN), no primeiro trimestre de 2019, a população capixaba era de 4.003.175 habitantes. Desse total, 51,7% são pardos, 35,9% são brancos, 11,6% são pretos, 0.4% são indígenas e outros 0.4% são amarelos (de origem oriental). Ao todo, 634 não apresentaram declaração de cor.

A partir da definição do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e do entendimento do Movimento Negro, negro é a junção dos pretos e pardos, portanto representa 63,3% da população capixaba.

No item intitulado Deficiência das Condições de Moradia, a Síntese dos Indicadores Sociais do Espírito Santo 2018, elaborada pelo IJSN, apontou que 13,4% das pessoas autodeclaradas pretas, 11,1% das pessoas pardas e 6,3% dos brancos residentes no Estado vivem em moradias inadequadas.

Estudo aponta que a Covid-19 tem maior incidência entre negros no Espírito Santo
Estudo aponta que a Covid-19 tem maior incidência entre negros no Espírito Santo. (Ernesto Carrazana/Unsplash)

O OUTRO LADO

Por nota, a Secretaria de Estado de Direitos Humanos (SEDH) informa que as reivindicações da Unidade Negra Capixaba (UNC) para o enfrentamento aos impactos da Covid-19 na população negra do Estado foram recebidas em reunião que contou com a participação de representantes do grupo e da vice-governadora Jaqueline Moraes.

Explica que adiante as solicitações do movimento e diversos diálogos, “o governo criou três Grupos de Trabalho (GTs) ligados às áreas de Educação, Assistência Social e Saúde, e que outros grupos serão criados para discutir as propostas encaminhadas”, diz o texto da nota.

A Secretaria informou ainda que os grupos de trabalho não têm caráter deliberativo, mas que os trabalhos continuarão sendo realizados e ressalta que não tem medido esforços para fazer as articulações necessárias no sentido de garantir a execução de políticas públicas específicas para a população negra.

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