A pandemia da Covid-19 impôs uma nova rotina educacional, e num ambiente tão diverso como a escola, as iniciativas nem sempre são acolhidas em um consenso. A mais recente divergência, envolvendo pais e professores, está relacionada a não reprovação de alunos da rede estadual no ano de 2020, conforme previsto em portaria da Secretaria de Estado da Educação (Sedu), publicada esta semana no Diário Oficial.
A decisão do governo se sustenta em um parecer do Conselho Nacional de Educação (CNE), que recomenda a não reprovação dos estudantes neste ano devido aos prejuízos decorrentes da suspensão das atividades presenciais, ainda que as escolas estejam promovendo aulas remotas. Sobretudo na rede pública, as estratégias adotadas não alcançam todos os alunos com os conteúdos das disciplinas planejados antes da pandemia.
A Sedu explica, entretanto, que deixar de reprovar em 2020 não significa aprovação automática dos estudantes. A rede estadual vai adotar o currículo continuado e, no final de 2021, haverá avaliação do desempenho dos alunos em todo o período, ou seja, dos dois anos. Deixar de realizar as atividades ou de acompanhar os conteúdos agora, vai comprometer a aprendizagem que poderá levar à reprovação ao concluir o ciclo do biênio.
A diretora do Sindicato dos Trabalhadores em Educação Pública do Espírito Santo (Sindiupes), Noêmia Simonassi, argumenta que, para a definição de avaliação e promoção, uma das preocupações apontadas foi em relação aos alunos que não conseguem ter acesso aos conteúdos, seja por aplicativo, seja pelas aulas na TV, oferecidos no Programa Escolar. Segundo ela, há estudantes que não estão conseguindo nem mesmo ir à escola buscar material impresso, porque moram em locais afastados, com dificuldades para transporte.
"Esses alunos não poderiam ser prejudicados, porque deixar de acompanhar não foi uma opção deles. Também não dava para aprovar por decreto, como já ocorreu em governos passados. A solução encontrada foi juntar os dois anos e a avaliação (para promover ou reprovar) será no final", pontua Noêmia.
Mas a diretora ressalta que a medida não retira a obrigação dos estudantes de continuar acompanhando as aulas, e de fazer todas as atividades. "As avaliações vão continuar e, no final deste ano, tem conselho de classe", frisa.
Para a professora Mônica Pereira, a situação não é simples. Ela até concorda que o ano letivo de 2020 está prejudicado, e que seria difícil avaliar os alunos, porém considera que a decisão da Sedu foi precipitada, e que todo o esforço que os educadores têm feito para garantir as aulas remotamente pode ser em vão.
Mônica pondera que a portaria poderia ser publicada mais adiante porque, em sua opinião, saber que não haverá reprovação levará muitos alunos a desistir de continuar estudando. Ela diz que, na escola em que atua, boa parte dos estudantes só começou a correr atrás dos conteúdos a partir de julho, quando a Sedu passou a considerar frequência e dias letivos.
"A maioria não acompanha não é porque não consegue, mas, porque não quer. Saber que não vão reprovar vai desestimular esses alunos, e quem está fazendo alguma coisa, não vai fazer mais. Vai pensar: 'por que vou me esforçar se meu colega não está fazendo nada e também vai passar?' Na rede pública, aluno só faz alguma coisa se tiver nota", observa Mônica Pereira.
Nas redes sociais, após publicação da reportagem de A Gazeta sobre a portaria da Sedu, muitos comentários de educadores, pais e alunos, demonstrando que o assunto suscita discussão. Alguns críticos à medida, sobretudo ao avaliar que o trabalho do professor não está sendo valorizado, e outros sustentando que a reprovação dos estudantes em um ano tão atípico quanto 2020 não seria razoável.
Da secretaria-geral da Associação de Pais de Alunos do Estado do Espírito Santo (Assopaes), Aguiberto Oliveira de Lima afirma que é "preciso encarar a verdade, pois não houve um processo de aprendizagem em 2020" e, portanto, se não tem conhecimento, não é possível avaliar para promover ou reprovar estudantes.
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