Mais de 150 cidades e 23 mil km rodados por 11 Estados brasileiros. Esses seriam os números que poderiam traduzir a vida de uma família que decidiu abandonar uma casa de quatro quartos para viver na estrada, em um ônibus adaptado de somente 25 m². No entanto, para contar essa história é preciso muito mais que isso.
Tudo começou como um plano há cinco anos. De lá para cá, depois de centenas de dias viajando, a aventura ganhou maior proporção e os caminhos cruzaram de vez com o Espírito Santo, onde um caminhão dos bombeiros está sendo adaptado para ser um motorhome capaz de dar a volta ao mundo.
Idealizadora da viagem sem fim, a paulista Guacira é casada com o italiano Gianluca, com quem tem dois filhos: Gregory Arthur e Gabriella Catherina. Desde o início de julho, os quatro estão vivendo em Vila Velha, antes de caírem na estrada novamente. No Estado, eles já conhecem diversos municípios e afirmaram ter feito um dos passeios mais bonitos da viagem.
O começo dela tem data: 8 de janeiro de 2015. Na época, Guacira Newman Rugai trabalhava quase 20 horas por dia como tradutora. Muito tempo dedicado ao serviço e quase nenhum a boas noites de sono ou aos filhos. O dinheiro no final do mês dava para pagar as contas. Nada mais.
A única exceção ficava pelas viagens à Itália, terra natal do marido Gianluca Mario Ghisleni, para visitar a sogra a cada dois anos. Escape que ela própria prefere classificar apenas como a mesma vida em outra casa, já que a rotina continuava a mesma e os passeios eram quase inexistentes.
Naquele dia, Guacira assistiu a um programa de viagens na televisão e decidiu que cair na estrada era o que ela queria. Com os meus filhos foi fácil. Eles tinham sete e dez anos de idade, criança adora aventura. Já meu marido ficou assustado. Ele tinha maior apego material e medo da instabilidade financeira, contou.
Enquanto ele aceitava a ideia, ela já estava atrás da materialização do sonho. Deu início às pesquisas na internet e via maneiras de adaptar a educação escolar dos filhos. Depois, a casa foi colocada à venda, junto com a maioria dos pertences da família. O dinheiro para o início da aventura veio de um terreno vendido na Itália.
O planejamento durou cerca de três anos. O motorhome comprado pronto custou em torno de R$ 200 mil. Em março de 2018, a viagem começou. Saindo da cidade de Piracicaba, no interior de São Paulo, o roteiro era aproximado. Passaríamos o inverno no Sul do país e depois subiríamos até onde desse, resumiu Guacira.
Preparados para o itinerário? Foz do Iguaçu (PR), Santa Catarina e Rio Grande do Sul, até o Chuí ponto mais austral do país. Seguidos pelas cidades históricas de Minas Gerais. Ainda teve Goiás, Brasília (DF) e uma travessia pela Chapada Diamantina (BA). A descida aconteceu pelo litoral baiano, capixaba e fluminense. Nada mal.
Em novembro, oito meses depois de caírem na estrada, eles precisavam estar em Novo Hamburgo (RS) para uma palestra sobre o novo estilo de vida. De lá, foram explorar as cidades do interior paulista, onde uma pequena pausa precisou ser feita, a fim de dar suporte à mãe de Guacira, que passaria por uma cirurgia.
Com o dinheiro da residência, compraram um caminhão de uma pessoa de Brasília. Antigamente usado pelo Corpo de Bombeiros, o veículo precisou ser completamente reformado. O processo perdura desde junho de 2019 e é a partir daí que a história da família cruza, de vez, com o Espírito Santo.
É verdade que em agosto de 2018 os quatro conheceram parte do território capixaba, ficando em municípios como Guarapari, Conceição da Barra, Anchieta, Vitória e Domingos Martins. Em todos, eles têm amigos com vidas semelhantes à deles. Dentre os locais visitados, dois foram destacados na entrevista.
Além de terem gostado muito da queridinha da Região Serrana, foi em Domingos Martins que o filho Gregory Arthur e a filha Gabriella Catherina comemoraram os aniversários de 12 e 15 anos, respectivamente. Já em Itaúnas, Guacira garantiu ter feito um dos passeios mais lindos da viagem.
Agora, um ano depois, a família está de volta ao Estado. Desta vez, por causa do novo motorhome. Com placa do Espírito Santo, o caminhão teve a cabine reformada na cidade de Viana, onde eles ficaram por quatro meses passando boa parte do dia na sala dos motoristas da empresa responsável pela reformulação.
Após idas para os Estados de São Paulo e Minas Gerais para transformar o baú do veículo em uma casa móvel, o caminhão voltou ao Espírito Santo para os últimos detalhes e os trâmites burocráticos. Desde o último dia 6 de julho, a família está ficando a 50 metros da praia de Vila Velha, no bairro Morada do Sol.
A expectativa é que a vistoria seja feita na primeira semana de agosto para que as viagens sejam retomadas. Já são muitos meses sem viajar. Depois que o bichinho da estrada morde, você não quer mais ficar parado. Vamos ver se conseguimos conhecer o resto do Espírito Santo, comentou Guacira.
Se o ônibus já parecia pequeno para morar, o caminhão é ainda menor: tem apenas 17 m². No entanto, a líder garante que a vantagem é que ele é mais apropriado para dar a volta ao mundo que é o plano ambicioso e prestes a ser realizado pela família. Ela também afirma que não vê pontos negativos nessa mudança.
Quando o novo motorhome ficar pronto, a ideia é terminar de explorar o Brasil: Mato Grosso e Mato Grosso do Sul; e o Norte e o Nordeste do país. Depois, quando as fronteiras estiverem abertas, ir para o exterior. Primeiro o Paraguai, depois ir subindo por toda a América até o Alasca (EUA) e, enfim, partir para a Europa.
O novo coronavírus chegou ao Brasil na época em que o caminhão estava sendo reformado na cidade mineira de São João Del Rey. Por mais surreal que possa parecer, Guacira garante que a pandemia não afetou quase nada a rotina deles. Já vivíamos 24 horas por dia juntos, brincou.
Segundo ela, as principais mudanças se resumem às restrições de circulação e ao uso obrigatório de máscara. Sob a perspectiva da viajante, a Covid-19 mostrou que as pessoas não devem ficar esperando o momento certo para tirar os planos do papel, porque o futuro é incerto demais.
Para quem tem vontade de seguir o mesmo caminho, mas ainda possui um pé atrás, ela disse palavras potentes: Foque no que é bom e realize o seu projeto. Viva. Pare de acumular coisas, porque, de uma hora para a outra, você vai embora e não usufrui de nada". Então, se for para ir a algum lugar, que seja aquele que você quiser.
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