"Meu marido sai para trabalhar, e eu tenho um filho de 12 anos. Aí vem o horário de preparar o almoço, e é aquela correria, porque, com meu pai aqui, já tenho um novo compromisso de ter na hora certa." É assim que a dona de casa Maria José conta como é uma parte de sua rotina. Assim como ela, muitas pessoas, sobretudo mulheres, se desdobram com a obrigação de cuidar dos pais idosos, do cônjuge e dos filhos, todos na mesma casa. Essa é a chamada "geração sanduíche".
A forma como um sanduíche é empilhado em camadas — fatia de pão, recheios e outra fatia de pão — ilustra bem essa realidade familiar, onde três ou mais gerações dividem o mesmo espaço. E essa convivência nem sempre é pacífica. "Às vezes, eu me estresso com ele um pouquinho. Eu falo: 'Pai, calma'. Porque ele se irrita com o meu filho", conta Maria José, em entrevista ao repórter Matheus Passos, da TV Gazeta Sul.
"A gente coloca as crianças para escola e eu vou para o meu trabalho. Faço meus afazeres lá. Depois, tenho que voltar para casa. Meus filhos ficam com a minha mãe. Graças a Deus, eu tenho ela para me ajudar", disse Rosângela tambà TV Gazeta Sul, destacando a importância de ter o apoio da mãe para dar conta da rotina diária e se manter inserida no mercado de trabalho.
O fenômeno é global. Nos Estados Unidos, um estudo conduzido pelo centro de pesquisas Pew — que se autodenomina um fact tank ("tanque de fatos", em tradução livre) e conduz estudos demográficos de opinião e tendências sociais — estimou que 1 a cada 4 norte-americanos tem responsabilidades tanto com pais idosos quanto com filhos menores de idade. Ainda de acordo com a pesquisa, a faixa etária mais impactada pelo efeito é a dos 40 anos.
No Brasil, não existem informações específicas sobre o fenômeno. De acordo com dados da Pesquisa Nacional por Amostras de Domicílio Contínua (Pnad Contínua) do IBGE em 2019, cerca 54 milhões de pessoas no Brasil com 14 anos de idade ou mais são responsáveis pelo cuidado de outras pessoas da casa ou outros parentes. O levantamento, no entanto, não especifica se há o convívio de múltiplas gerações.
Olhando apenas para a rotina, é possível constatar vantagens, como a aproximação familiar, e desvantagens no "sanduíche". Mas, em muitos casos, ter mais pessoas em casa não significa uma melhor divisão das tarefas. Pelo contrário. Geralmente, apenas uma pessoa fica imbuída da maioria das tarefas. Maria José disse que, em seu tempo livre, procura conforto na religião. "Eu busco fazer algo para Deus, algo na minha igreja. É isso que me ajuda a ficar mais tranquila, a relaxar", contou.
Existe uma significativa pressão emocional e financeira que afeta consideravelmente esse grupo demográfico, e esse sufocamento tende a aumentar, como mostra uma pesquisa recente conduzida pela Universidade de Michigan, nos Estados Unidos, e publicada no Journal of the American Geriatrics Society.
De acordo com o estudo, foi observado que, entre mais de mil entrevistados da chamada "geração sanduíche" nos EUA, 36% deles enfrentavam dificuldades financeiras, o que é o dobro da taxa registrada entre aqueles que cuidavam exclusivamente de um pai idoso, por exemplo.
Além disso, chamou a atenção o elevado índice de dificuldades emocionais, atingindo 44% das pessoas enquadradas nessa categoria de cuidador multigeracional.
Donovan Maust, um dos autores do estudo, destacou a necessidade de formuladores de políticas públicas e empregadores prestarem atenção especial a indivíduos que se encontram nesse "trilema" de cuidar de duas gerações ao mesmo tempo em que permanecem ativos na força de trabalho.
Com informações de Felipe Sena e agências
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