A estratégia adotada por um grupo de rodoviários, opositores da atual gestão do sindicato da categoria, pode render ações na Justiça. O movimento realizado na manhã desta segunda-feira (29), em Carapina, na Serra, paralisando a Grande Vitória, é considerado ilegal pelo governo do Estado, que estuda medidas judiciais contra o grupo. Advogados ouvidos por A Gazeta também dizem que há possibilidade de várias sanções, de administrativas a criminais, devido aos impactos causados.
Somente no Sistema Transcol, conforme informações da Companhia Estadual de Transportes Coletivos de Passageiros do Espírito Santo (Ceturb-ES), mais de 80 linhas foram afetadas, totalizando 1.886 viagens atrasadas, comprometendo a rotina de trabalhadores, estudantes e outras pessoas que dependem do transporte coletivo, sem contar motoristas de automóveis e caminhoneiros que circulam pela região. Nas redes sociais, houve várias reclamações sobre os transtornos causados, como a dificuldade para o tráfego de ambulâncias e o cancelamento de cirurgia.
Diante desse cenário, a Secretaria de Estado de Mobilidade e Infraestrutura (Semobi) ressalta, em nota, que qualquer movimento que cesse o acesso da população ao transporte público e interrompa o direito de ir e vir é ilegal. "A manifestação foi coordenada sem qualquer aviso, com interesses em eleições sindicais. O governo do Estado estuda as medidas judiciais cabíveis para responsabilização dos envolvidos."
Embora o senso comum possa avaliar o protesto como um movimento grevista, esta manifestação não deve assim ser classificada. A advogada trabalhista e professora da FDV Jeane Martins explica a diferença, inclusive para esclarecer por que o protesto desta segunda (29) foi ilegal.
Ela diz que o movimento grevista é um direito fundamental, previsto na Constituição Federal, e nas greves chamadas "típicas" reivindicam-se melhorias no âmbito trabalhista. Mas, ressalta Jeane Martins, há alguns requisitos que precisam ser cumpridos, conforme estabelecido na Lei 7.783/89, tais como a realização de assembleia da categoria com quórum para aprovar o movimento e aviso de, no mínimo, 72 horas de antecedência, quando se trata de serviço essencial, caso do transporte público. A comunicação deve ser feita aos empregadores e aos usuários.
A legislação também permite que as pessoas se associem para manifestações, mesmo que não sejam de caráter trabalhista, desde que não atinjam outros direitos, a exemplo do que ocorreu no protesto do grupo de rodoviários. Wagner Fernandes, representante dos manifestantes e da chapa de oposição da eleição do sindicato que vai ser realizada em junho, disse que o movimento visava a uma disputa sindical transparente.
"Eles podem se manifestar, mas não a ponto de impedir o trânsito. Veja: isso não é greve e nada tem a ver com o sindicato. É importante deixar isso claro para não se criminalizar o sindicalismo, tão importante para os trabalhadores. Se são pessoas interessadas em concorrer na próxima eleição, que utilizem do seu direito de se associar e se manifestar, mas sem prejudicar o direito fundamental de ir e vir", frisa Jeane Martins.
A professora e advogada acrescenta que, ao extrapolar o direito de se associar, o grupo acabou adotando uma conduta abusiva e o ato se tornou ilícito.
O advogado trabalhista Edwar Barbosa Felix reforça o direito à greve dos trabalhadores e, assim como Jeane Martins, sustenta que o movimento de alguns rodoviários se tornou ilegal por fugir aos princípios estabelecidos para qualquer manifestação.
"Esses trabalhadores fizeram uma paralisação totalmente à margem da lei, provavelmente desvinculados do sindicato. Mas, para a sociedade, fica a aparência de uma greve, sobretudo por afetar um serviço essencial. E se não há uma greve legítima, aquele que organizou o movimento, adotou efetivamente medidas para a paralisação, agindo no ilícito, não está albergado pelas possibilidades legais da defesa de um direito e as sanções são diversas", adverte.
As sanções, segundo Edwar Felix, podem ser trabalhistas, administrativas, cíveis e até criminal. O advogado aponta que o Ministério Público do Estado do Espírito Santo (MPES) pode atuar em favor da coletividade, propondo uma ação civil pública. O órgão foi procurado pela reportagem para falar dessa situação, mas não respondeu à demanda.
Quanto à justificativa dos manifestantes sobre supostas irregularidades no processo eleitoral do sindicato, o advogado aponta que há outros meios para a reivindicação.
"Existem caminhos para pedir a correção de um processo eleitoral. Se estão dizendo que há injustiças, que a diretoria eventualmente não está agindo de maneira adequada, as partes que se entendem prejudicadas devem recorrer ao Judiciário, que pode, por exemplo, determinar um interventor. Há diversas medidas que podem ser adotadas, mas nenhuma nessa linha de paralisar um serviço essencial", finaliza Edwar Felix.
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