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'Impossível respeitar a vida com guerras e armas', diz novo arcebispo de Vitória

'Impossível respeitar a vida com guerras e armas', diz novo arcebispo de Vitória

Em conversa com A Gazeta, Dom Ângelo Ademir Mezzari falou sobre temas sensíveis na Igreja, explicou como foi eleito e anunciou data da posse

Publicado em 12 de janeiro de 2025 às 14:14

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Dom Ângelo Ademir Mezzari, novo arcebispo de Vitória
Dom Ângelo Ademir Mezzari, novo arcebispo de Vitória . (Arquivo pessoal)

Nomeado pelo papa Francisco para ficar à frente da Arquidiocese de Vitória, dom Ângelo Ademir Mezzari, de 67 anos, está se preparando para mudar-se em breve, de São Paulo para o Espírito Santo. Mas, antes de assumir a nova função, o arcebispo eleito conversou com A Gazeta. 

Em entrevista exclusiva, não fugiu de nenhum tema e falou sobre política, o processo detalhado de sua escolha para bispo e, depois, arcebispo da Igreja Católica. Ele também comentou sobre questões sensíveis, como o uso desmedido de paramentos no clero e o posicionamento da Igreja em relação às armas, além de falar sobre seu alinhamento com o papa e suas expectativas para a posse.

Dom Ângelo Ademir Mezzari, novo arcebispo de Vitória
Dom Ângelo Ademir Mezzari, novo arcebispo de Vitória . (Arquivo pessoal)

O novo arcebispo do Espírito Santo nasceu em Forquilhinha, no Estado de Santa Catarina, e é o mais velho de sete irmãos. Com 11 anos, ingressou no Seminário Rogacionista Pio XII, em Criciúma (SC), onde fez a educação básica — ensino fundamental e médio. É formado em Filosofia, Teologia e Jornalismo. Ocupou os mais altos cargos da congregação religiosa onde passou a vida, e rodou o mundo, nos países onde a congregação se faz presente. 

'Recebi com surpresa minha nomeação'

Dom Ângelo Ademir Mezzari afirma ter recebido com surpresa a nomeação para arcebispo de Vitória e destacou sua disposição em servir à igreja. “Foi um chamado repentino, surpresa. Mas estamos contentes também, sim, a gente sempre está à disposição da igreja, não é? E onde a igreja pede, envia, nós estamos disponíveis. Superando também as dificuldades, os desafios."

Como é a escolha de bispos e arcebispos na Igreja Católica?

Questionado sobre o processo de escolha dentro da Igreja Católica, dos bispos e arcebispos que assumem dioceses e arquidioceses, dom Ângelo conta que o procedimento da Santa Sé, através da Nunciatura Apostólica, é bastante rigoroso, atento e profundo sobre candidatos, sacerdotes que podem ter o perfil, aquelas características necessárias para serem bons pastores na igreja.

 "Ao longo do ano, a Nunciatura vai ouvindo, observando cada diocese que está vacante ou precisa de bispos auxiliares. Quando há indicações, realiza-se todo o processo e, depois, tudo é encaminhado ao Dicastério para os Bispos."

Dom Ângelo diz que os candidatos como ele, na prática, não são conhecidos antecipadamente. "Muitas pessoas são consultadas: bispos, presbíteros, religiosos, e também leigos. Faz-se, então, todo esse levantamento para identificar bem as condições necessárias. Esse processo, às vezes, demora um ou dois anos"

Isso ocorre inicialmente, continua Dom Ângelo, quando são nomeados bispos titulares ou auxiliares. "Posteriormente, no caso de arquidioceses e dioceses vacantes, também são feitos levantamentos sigilosos e reservados pela Nunciatura para indicar nomes que possam assumir aquelas responsabilidades, considerando as condições sociais, áreas urbanas ou rurais, demandas e necessidades daquela igreja particular, daquela diocese ou arquidiocese", explica. 

Segundo o arcebispo, é um processo feito internamente na Nunciatura Apostólica, que realiza esse levantamento sempre com muito respeito e muita dignidade. "Aqueles que são indicados são encaminhados ao Dicastério para os Bispos, em Roma. Normalmente, envia-se uma lista tríplice. Esse é, em linhas gerais, o procedimento que a Igreja adota, por meio da Nunciatura e do Núncio Apostólico, para atender às necessidades das dioceses e arquidioceses, seja para a escolha de bispos titulares ou auxiliares", detalha. 

Dom Ângelo conta como ficou sabendo que seria arcebispo de São Paulo em 2020

Em relação a ele, como é religioso de uma congregação, cumpriu várias funções na congregação religiosa no Brasil. Depois, morou em Roma e, quando voltou, após concluir essas funções temporárias, foi nomeado padre em Bauru (São Paulo), em uma paróquia da congregação rogacionista. Além disso, era responsável pelo seminário e pelas obras sociais, que formavam um complexo de atividades apostólicas da congregação, onde também atuava como pároco.

Dom Ângelo Ademir Mezzari, novo arcebispo de Vitória
Dom Ângelo Ademir Mezzari, novo arcebispo de Vitória . (Arquivo pessoal)

"Então, no final de junho de 2020, recebi uma ligação do senhor Núncio Apostólico informando que eu havia sido nomeado bispo auxiliar de São Paulo. É importante lembrar que, quando chega o convite, ele já passou por todo o procedimento, pelas instâncias necessárias e foi aprovado pelo Santo Padre, o Papa. O prefeito do Dicastério para os Bispos apresenta os nomes, a lista e as escolhas ao Santo Padre, e, assim, recebi a nomeação. Na ligação, foi dito claramente: ‘O senhor foi nomeado bispo auxiliar na Arquidiocese de São Paulo, e o Papa espera que você aceite’.

Aspas de citação

Normalmente, os sacerdotes nomeados bispos pela primeira vez, como aconteceu comigo, já recebem a nomeação, e é pedida a aceitação, o assentimento

Dom Ângelo Ademir Mezzari
Arcebispo eleito da Arquidiocese de Vitória 
Aspas de citação

Porém, acrescenta o arcebispo, a Igreja sempre respeita que esse sacerdote ou bispo possa ter dificuldades, como problemas de saúde ou impedimentos temporários, o que é muito comum. "Às vezes, é concedido um tempo para responder; outras vezes, a resposta é imediata. Eu pedi um tempo para refletir, considerando os compromissos que tinha em Bauru, mas logo respondi sim."

Dom Ângelo ressalta que a vocação e missão do sacerdote é estar sempre disponível para a Igreja e para a diocese. "E foi assim. Eu já havia morado em São Paulo, conhecia a cidade. O momento era doloroso, marcado pela pandemia, com dificuldades maiores relacionadas aos impedimentos e precauções sanitárias do que propriamente à realidade eclesial. Porém, conhecia razoavelmente bem a dinâmica de evangelização da Arquidiocese, pois já havia vivido, estudado e trabalhado em São Paulo. E assim se passaram quatro anos aqui. Normalmente, os bispos auxiliares permanecem de quatro a seis anos, dependendo das necessidades."

Como foi a nomeação para ser arcebispo da Arquidiocese de Vitória?

"E depois, como aconteceu agora, eu sou bispo auxiliar, então veio simplesmente um telefonema, como o primeiro, através do secretário-adjunto da Nunciatura Apostólica. O Núncio estava em Roma, mas, claro, a comunicação passou por ele. Assim, a informação foi transmitida pelo adjunto, que me ligou na manhã do dia 9 de dezembro de 2024, logo cedo, dizendo que eu havia sido nomeado pelo Santo Padre, o Papa, para ser arcebispo da Arquidiocese de Vitória, e solicitava o meu consentimento, a minha disponibilidade. Então foi assim, muito simples", conta dom Ângelo.

Dom Ângelo Ademir Mezzari, novo arcebispo de Vitória
Dom Ângelo Ademir Mezzari, novo arcebispo de Vitória . (Arquivo pessoal)

"Claro que, como qualquer pessoa humana, quem recebe essa notícia sente o impacto, até porque você não sabe, né? Você não é consultado, e não somos nós que escolhemos; é a Igreja que escolhe. É a Igreja, através dessas pessoas, dessas instâncias — Nunciatura Apostólica, Dicastério para o Clero —, que, após ouvir muitas pessoas e ponderar as necessidades daquela Igreja, como no caso da Arquidiocese de Vitória, me consideraram digno e com o perfil adequado para servir a essa arquidiocese", pontua. 

Quando recebeu o convite, o arcebispo pediu pelo menos um dia para assimilar. "Não que eu fosse dizer não, claro, eu diria sim. Mas foi mais para rezar. Rezei, celebrei a Eucaristia, meditei e chorei também, no sentido de acolher. É mais uma mudança. No sentido de responder com toda liberdade. Foi isso que fiz no dia seguinte, dia 10 de dezembro, pela manhã, quando, com muita tranquilidade e serenidade, respondi sim", lembra dom Ângelo.

Sigilo 

O arcebispo nomeado de Vitória observa que o Estado é uma novidade para ele e ressalta que o período entre a comunicação da nomeação e a publicação oficial do ato é inteiramente sigiloso. "Eu não conheço o Estado do Espírito Santo, nem pessoalmente a realidade da arquidiocese. Conheço os bispos, claro, quase todos do Estado, mas são contatos informais, fraternos, em encontros e assembleias. Respondi, sim, e aí veio aquela questão da reserva. Basicamente, o procedimento é todo sigiloso, essa comunicação é feita sob embargo, ou seja, não pode ser divulgada."

Dom Ângelo conta que somente depois foi comunicado ao cardeal arcebispo de São Paulo, dom Odilo Scherer, com quem logo conversou, e ao arcebispo de Vitória, dom Dario, que recebeu o contato da Nunciatura informando sobre a nomeação. "Essa notícia ficou reservada apenas a mim e aos arcebispos. E assim procedemos até o dia 30, quando concordamos com a publicação."

Na manhã do dia 30 de dezembro de 2024, a  Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) comunicou a decisão do papa Francisco em nomear o religioso rogacionista dom Ângelo Ademir Mezzari, como novo arcebispo da Arquidiocese de Vitória. No mesmo ato, o papa acolheu o pedido de renúncia de dom Dario, que passa a ser arcebispo emérito de Vitória. 

1ª vez no Espírito Santo

“Eu trabalhei muito aqui no Brasil, na América Latina, morei em Roma, viajei pelo mundo, mas nunca estive no Espírito Santo. Eu não conheço Vitória. Será a primeira vez que irei. A gente conhece por informações, pela internet”, afirma. 

Mas ele já está se familiarizando com a nova atribuição. “Falando com dom Dario, ele me enviou relatórios da arquidiocese. Estou estudando, lendo, vendo, para chegar com um pouco mais de proximidade. A missão da Igreja é interessante porque nós não escolhemos para onde vamos, nem vamos para onde queremos. Onde somos enviados, continuamos a missão da Igreja. A missão é ser fiel a Jesus Cristo, ao Evangelho, e entrar na caminhada eclesial. A Arquidiocese de Vitória, como as demais dioceses, tem uma grande caminhada eclesial."

Dom Ângelo diz que seu papel será cumprir as atividades próprias do arcebispo, com colaboração. "Temos um bispo auxiliar, e agradecemos muito a dom Andherson (bispo auxiliar da Arquidiocese de Vitória). Estamos em diálogo, com os cumprimentos a dom Dario. Então, tudo isso, posteriormente, no encontro com o clero, com as congregações religiosas, com as paróquias, a gente vai se desenvolvendo. Vamos nos inserindo e conhecendo."

'Estarei presente diante das necessidades que vêm'

O arcebispo observa que já morou em muitos lugares, em vários países, então leva um tempo para a ambientação. "Mas o mais importante é chegar com muito amor, muita disponibilidade, muito desprendimento. Conhecer a realidade, acompanhar essa realidade, servir o povo de Deus e, depois, dar aquele sinal da nossa presença diante das necessidades que vêm”, pontua. 

Vasta experiência na igreja 

“A arquidiocese é muito grande, com muitas paróquias, um clero — que é o essencial — e, além disso, as paróquias, centenas e centenas de comunidades eclesiais de base, outras comunidades e congregações religiosas. É um universo que faz parte da nossa vida, e vamos servir. O meu desejo é chegar lá, conhecer, me inserir, me aproximar e me colocar à disposição. Foi assim nas outras missões que assumi."

Ele se recorda que, quando foi superior provincial, e depois superior geral da congregação, morou em Roma e viajou pelo mundo, onde a congregação está presente. "Passei por processos bem difíceis de ambientação, de línguas, de culturas, e já estou, de certa forma, habituado a essas mudanças de realidade. Agora, trata-se, principalmente, de me colocar à disposição."

'Desafios que surgirem, vamos enfrentar'

Sobre os desafios, à medida que surgirem, serão enfrentados.  "Eu gosto muito da proximidade humana, do contato com as pessoas e com as comunidades. Não tenho dificuldades nesse sentido. Apraz-me muito esse contato humano, a proximidade fraterna, a presença junto aos padres, aos religiosos, às religiosas, aos leigos e às leigas. Valorizo a presença constante nas paróquias e nas comunidades. Claro, é uma arquidiocese grande, e levará algum tempo para conhecer tudo, mas, pouco a pouco, vamos avançando. Aquela dificuldade inicial de não conhecer será superada. Até porque os bispos, normalmente, sempre são enviados para outras terras e realidades."

Relação com o papa Francisco 

“Eu tenho a graça, claro, de viver neste tempo e de ter sido chamado pelo papa Francisco, tanto para o episcopado, quando fui nomeado bispo auxiliar, quanto agora, como arcebispo eleito da Arquidiocese de Vitória. Eu vivi em Roma de 2002 a 2016, e estava lá quando o papa Francisco foi eleito", recorda-se.

Dom Ângelo Ademir Mezzari
Dom Ângelo Ademir Mezzari com o papa Francisco, em foto divulgada em 8 de fevereiro de 2024. (Acervo pessoal )

"Tive a graça, já naquela época, em 2016, de encontrá-lo algumas vezes na Assembleia dos Superiores Gerais e até de conversar pessoalmente. Depois da minha nomeação como bispo, estive em Roma duas vezes e tive a graça de poder saudá-lo novamente. Inclusive, nas minhas redes sociais, a foto que uso é a que tirei com o papa”, alegra-se. 

Para Dom Ângelo, a Igreja tem grandes papas, grandes pastores. "Eu tive a graça, em outros momentos, de conhecer pessoalmente o papa João Paulo II e também o papa Bento XVI, quando estava em Roma. Cada papa, em seu tempo, vai respondendo e sendo fiel à Igreja, a Jesus Cristo e ao Evangelho, diante das realidades."

'Papa pede igreja em missão'

“O papa Francisco, nessa retomada e aprofundamento do Concílio Vaticano II, propõe uma igreja mais em comunhão, sobretudo uma igreja de missão, que vai ao encontro das realidades humanas e sociais. É uma resposta da fé, uma resposta do Evangelho para iluminar e transformar as realidades, de acordo com o projeto de Deus, que é de vida, dignidade e respeito. Isso corresponde, notadamente, ao Evangelho que é anunciado e testemunhado por Jesus Cristo", frisa o arcebispo. 

Ele explica que o papa, com o seu Colégio dos Cardeais, com a colaboração dos bispos, e os bispos formam o Colégio Episcopal, que é, a colaboração mais direta em cada igreja particular com o santo padre. "Estamos aí em nome dele. Inclusive, é muito bonito que, na cerimônia de posse (dos bispos), logo que inicia a celebração, é lida e proclamada a bula do papa. A bula significa o decreto pelo qual o papa nomeia um representante para aquela igreja. Assim será na Arquidiocese de Vitória, que terá seu representante", conta dom Ângelo. 

'Impossível viver o que prega Jesus Cristo com armas'

"Então, estamos aí em nome do papa Francisco e de seu magistério, que é o magistério da tradição e da história da Igreja. A preocupação sempre é a evangelização, que é ampla. Como agora, no Jubileu da Esperança, que oferece aos cristãos e cristãs católicos, e também à humanidade, na sua diversidade cultural e religiosa, elementos e valores que retomam a vida, dignidade e amor. Jesus veio para nos dar vida em abundância, para nos salvar, que é a plenitude da vida, e depois a vida eterna. Então, essas questões tornam impossível viver o amor e respeitar a vida com guerras, com armas e com o tráfico internacional”, alertadom  Ângelo.

"Teremos a Campanha da Fraternidade este ano sobre Fraternidade e Ecologia Integral, justamente o cuidado com a criação, a casa comum. O papa Francisco tem chamado muito a atenção para isso. Na recente bula, no decreto de instituição do Jubileu, o Ano Santo de 2025, Jubileu da Esperança, o papa indica sinais importantes para levar esperança: a paz, o amor, a concórdia, vencer os conflitos, dar atenção às crianças, o chamado muito especial à vida da família, atenção aos idosos, aos pobres, aos doentes e enfermos, o respeito às leis internacionais, superar os conflitos", reforça.

Seria, para dom Ângelo, o fim das armas, que é uma luta eterna. "Nós estamos em plena comunhão com a nossa missão, que é irmos ao encontro da humanidade ferida. A humanidade tem tanta necessidade hoje de superar os conflitos, as discórdias, a polarização e as injustiças sociais. Por isso, a Igreja, no seu trabalho de evangelização, anuncia a pessoa de Jesus Cristo, proclama a sua fé, celebra essa fé na liturgia, na Eucaristia, nos sacramentos, na oração, mas também testemunha a fé. É preciso ter um grande compromisso para vencer as injustiças sociais, como diz o papa Francisco."

E continua: "Eu tive a graça de conhecer boa parte da Igreja Católica no mundo. Estive na África, Ásia, Oceania, Europa, Oriente Médio e América, conhecendo muitas realidades. Cada vez mais, vemos esses conflitos e guerras. Por isso, o papa, que é fiel ao Concílio Vaticano II e ao Evangelho, nos mostra qual é o caminho a seguir nos dias de hoje."

O impacto da polarização política na igreja 

Após mencionar os conflitos, perguntamos ao arcebispo sobre polarização política no país e de que forma essas manifestações afetam a igreja.  

"Essa é uma realidade quase cultural nos dias de hoje, que permeia as sociedades, mas está presente no mundo todo, e aqui no Brasil não foi diferente. No Estado de São Paulo, especialmente na cidade de São Paulo, essa polarização ficou evidente. É fruto de tantas situações, claro. Há grandes mudanças culturais e sociais, e nós temos uma visão — também expressa pelo papa Francisco em suas cartas e encíclicas — que é o bem comum, o interesse geral de todos", analisa. 

Na opinião do arcebispo, é preciso viver a boa política. "Aqueles que têm essa vocação para servir o povo no âmbito político devem agir com consciência e responsabilidade. A Igreja tem o seu papel, mas não se mistura, não toma partido. Ela promove o diálogo e denuncia as situações que não estão de acordo com o projeto de Deus e o Evangelho, que é o respeito à vida. A Igreja busca dialogar com as instituições, com o parlamento, com o poder executivo e o judiciário, de forma independente de partidos e visões ideológicas", explica dom Ângelo.

Aspas de citação

A igreja tem sempre a contribuir com o bem comum à luz da fé. A igreja não tem um partido e nem negocia espaços de poder. A igreja serve o povo por causa da fé que temos em Jesus Cristo

Dom Ângelo Ademir Mezzari
Arcebispo eleito da Arquidiocese de Vitória
Aspas de citação

Dom Ângelo também afirma que o ambiente digital criou cenário favorável às mentiras, que tratou de "fake news", e que o cristão católico deve buscar a "autenticidade, transparência e o respeito à pessoa humana".

O arcebispo eleito de Vitória pregou o perdão e a reconciliação entre todos os povos, destacando a importância do respeito mútuo e da fraternidade. “Então, eu creio que esse é o caminho: a proximidade, o diálogo, o respeito, o bem comum e a boa política."

Comunidades Eclesiais de Base (CEB's) 

Dom Ângelo também foi perguntado sobre as Comunidades Eclesiais de Base (CEBs), que representam a essência da Igreja Católica no Espírito Santo. Foi mencionado que o Regional Leste 3 da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) — que abrange as dioceses de Cachoeiro de Itapemirim, Colatina, São Mateus e a Arquidiocese de Vitória — foi criado, entre outros motivos, justamente para preservar essa essência da Igreja capixaba.

O que são Comunidades Eclesiais de Base (CEBs)

As Comunidades Eclesiais de Base (CEBs) são grupos de fiéis católicos que se reúnem para rezar, estudar a Bíblia e atuar na sociedade. Elas se caracterizam por: 

- Celebrações dominicais realizadas por leigos; 

- Participação na tomada de decisões, geralmente por meio de assembleias; 

- Ligação entre a reflexão bíblica e a ação na sociedade; 

- Ação comunitária em prol do bem comum.

 Dom Ângelo respondeu que tudo se insere na grande missão da Igreja, que é a evangelização, consistindo em anunciar a pessoa de Jesus Cristo e seu Evangelho, conforme a tradição da Igreja, para que a humanidade viva plenamente pela experiência de fé e alcance a salvação, por meio da vivência eclesial e comunitária.

"É na comunidade que se celebra a fé, a liturgia, e onde se testemunha a fé através da caridade. A Igreja no Brasil passou, em um período histórico, assim como na América Latina, por experiências marcantes. Aqui em São Paulo, por exemplo, acompanhei, naquele contexto, nos anos 60, 70 e 90, uma experiência significativa iluminada pela Palavra de Deus, que sempre guia nossas ações. Os tempos mudam, e as Igrejas também vão se adaptando às novas realidades. Houve, é claro, muitas mudanças."

"Sabemos que no Estado do Espírito Santo e em outros lugares, sobretudo no interior do Brasil, a Igreja ampliou o conceito para Comunidades Eclesiais Missionárias, Comunidades Eclesiais e comunidades. A palavra central é 'comunidade', e o núcleo central é a comunidade. É nela que se vive a fé, que se celebra a fé, e é a partir dela que se responde à fé com amor, caridade, na luta pela justiça, na fraternidade e no bem comum", completa o arcebispo.

Para dom Ângelo, Cada experiência de cada Igreja é valiosa. "Assim como é valiosa a experiência da Arquidiocese que certamente irei conhecer e onde estarei presente, acompanhando todas as comunidades. A Igreja do Brasil, em suas diretrizes, destaca que toda comunidade — de base, círculos bíblicos, encontros, catequéticos, missionários — é uma comunidade. Uma comunidade que celebra a Palavra de Deus, partilha seus bens e vive a sua fé naquele local. Tudo que é bom é bom."

Fé e vida

“Nunca se deve perder essa relação entre fé e vida. A fé se vive, a fé também se celebra, na Eucaristia, nos sacramentos, na oração. A fé se testemunha. E é bonito o testemunho dos cristãos leigos e leigas católicos, dentro de suas realidades de trabalho, família, sociais, políticas, econômicas. É aí que se vive a fé. A fé é vivida. Esse é o caminho eterno, que começou com Jesus Cristo e vai até o final dos tempos. Então, não há só fé, nem há só vida; há fé e vida”, ensina.

“Aqui, eu gostaria de lembrar que fiz o mestrado em Teologia Dogmática aqui em São Paulo, e a minha tese de mestrado trata da relação entre comunicação e evangelização. O tema abordado foi a questão da transmissão da fé, a verdadeira fé que nós transmitimos e anunciamos. Então, é um universo de cada diocese."

'Teologia do pano'

Nos bastidores da Igreja, fala-se com frequência sobre a chamada 'teologia do pano': uma conotação a integrantes do clero, seminaristas, padres e alguns bispos que usam trajes chamativos, sem moderação, tipo de conduta frequentemente criticada pelo papa Francisco, em seus apelos à simplicidade. Questionamos o novo arcebispo da Arquidiocese de Vitória sobre esse assunto. 

“É um fenômeno atual. Eu não generalizaria. As nossas normas litúrgicas são muito claras, e recentemente o papa Francisco lançou documentos sobre a questão litúrgica, incluindo a nova edição do Missal Romano, onde, em suas instruções, ficou muito claro sobre a sobriedade, a simplicidade, a humildade. Toda a Igreja do Brasil vive isso. Tudo aquilo que vai além deve ser deixado de lado. Nada de exagero, nada que possa gerar certos problemas na comunidade. No evangelho, existem aqueles que, para aparecer, usavam longas franjas; não era isso. O essencial era o coração, era a prática. Isso deve ser trabalhado, dialogado", avalia.

O arcebispo aponta que "as indicações são claras sobre qual é o uso, qual é o modo. Nós temos que ver o essencial, que é viver a fé, que é a liturgia, que deve ser bem cuidada, bem celebrada. Existem seus elementos que devem ser muito bem observados: a centralidade da cruz, a mesa da palavra, o lugar da comunidade, os vários serviços e ministérios. Não vamos aprovar ou condenar, mas fazer um convite à sobriedade e à simplicidade, com testemunho e despojamento como os sinais. E cada situação específica deve ser dialogada."

Dom Ângelo considera que se trata de uma tendência na cultura atual. "Essas coisas às vezes chamam a atenção na mídia e caracterizam um modo de comunicação. Isso acaba tocando o coração de tantas pessoas que acabam achando que aquilo é o essencial. E, na verdade, o essencial não é aquilo. Aquilo são instrumentos, os meios que nós temos para bem celebrar, que são aprovados pela Igreja. Onde o exagero ocorre é no diálogo que o bispo mantém com seu clero, o diálogo do pároco com seus fiéis, que vai superando o exagero. O que a gente não pode é achar que é o mais importante."

Dom Ângelo cita as viagens para muitos países e sua passagem pelo Sri Lanka. "Tenho um exemplo interessante para entender. Os muçulmanos, do islamismo, usavam uma túnica branca, que é comum. E lá, no Sri Lanka, os padres católicos, para se diferenciarem dos muçulmanos, usavam uma faixa preta. Então, cada cultura tem o seu modo. Tudo entra na concepção cultural e religiosa, o que ajuda a identificar. O importante é a identidade. Acho que é um pouco isso que eu creio. O critério é aquilo que a Igreja orienta em seus documentos e instruções. Em segundo lugar, é a sobriedade, a simplicidade. Devemos deixar o essencial, que é a fé, os sinais da fé, e não focar em nós mesmos. Nós seguimos a pessoa de Jesus Cristo, e o valor maior é a vida da comunidade, e aquilo que ela vive, que é a fé."

Café, torta, e moqueca capixaba

O Espírito Santo é um dos Estados que mais produz café no Brasil, sendo um dos principais motores da economia estadual e o maior produtor do café conilon no país. Esse café, famoso por conquistar paladares no Brasil e no mundo, e está presente na mesa dos capixabas. Perguntamos ao novo arcebispo se ele aprecia um bom café. "Sim, tomo (café)! Sem acúçar! Nós vamos tomar um bom café", brinca.

E emendou sobre a cultura culinária capixaba: "Já me falaram da torta capixaba, da moqueca capixaba. Eu já fui procurar na internet. Graças a Deus, não tenho nenhuma dificuldade com alimentação. Claro, a gente tem que se controlar, né?"

Posse do novo arcebispo

O arcebispo eleito da Arquidiocese de Vitória, dom Ângelo Ademir Mezzari, antecipou para A Gazeta que sua posse já está marcada. Será no dia 22 de fevereiro, um sábado, às 9 horas, na Catedral Nossa Senhora da Vitória, no Centro da Capital. A expectativa é que diversos bispos do país participem da cerimônia.

O novo arcebispo informa à reportagem que virá a Vitória no final de janeiro para dialogar com o arcebispo que se despede, dom Dario, e o bispo auxiliar da arquidiocese, dom Andherson Franklin. Em seguida, ele retornará a São Paulo e voltará a Vitória de forma definitiva de três a quatro dias antes da data da posse. "Nós bispos não temos muita coisa. Um pouco de roupa e livros."

Mensagem do arcebispo ao povo do ES

"Antes de tudo, quero dizer que vou com muita alegria, com muita esperança, respondendo com amor a esse chamado da Igreja, do santo padre, o papa. Vou também com o coração desprendido, querendo aprender e conhecer. Quero saudar a todos, o povo capixaba, toda a arquidiocese."

"Quero deixar minha mensagem de muita paz, de muita esperança, e que, juntos, possamos caminhar, construindo relações positivas, de diálogo, de proximidade, de fraternidade, dialogando com todos e atendendo com amor o povo de Deus em nossas comunidades. Peço também que tenham paciência comigo no começo. Quero agradecer desde já a acolhida; recebi muitas manifestações nas redes sociais e estou impressionado com a recepção nas paróquias, o que encheu meu coração de confiança. Então, vamos com alegria, para servir e também para superar as dificuldades, construindo e vivendo uma Igreja cada vez mais bonita, que vive, que testemunha, reza e está junto ao povo de Deus. Minha mensagem e meu abraço a todos", conclui. 

A Congregação Rogacionista (RCJ), 'berço' do novo arcebispo de Vitória

A Congregação dos Rogacionistas do Coração de Jesus (RCJ) é uma comunidade religiosa católica composta por padres e irmãos leigos. Foi fundada em 1897 (no século XIX) por Santo Aníbal Maria Di Francia, na cidade de Messina, na Itália. Estão presentes em países dos cinco continentes do mundo. 

A palavra "Rogacionista" vem do latim rogare, que significa "rezar" ou "solicitar". O carisma dos Rogacionistas é o Rogate, que é a palavra atribuída a Jesus nos evangelhos de Mateus 9,38 e Lucas 10,2: "Rogai ao Senhor da messe que envie operários para a sua messe".

Segundo a congregação, os irmãos e padres da comunidade religiosa, são "consagrados a Deus por meio dos Conselhos Evangélicos de Pobreza, Castidade e Obediência", e que também 'professamos um quarto voto, o Zelo pelo Rogate'.  A congregação comunciou que a vida de seus integrantes é marcada pela vivência em  comunidade, partilha da vida de oração, estudo e trabalho.

"Estamos presentes nos cincos continentes, tendo chegado na América Latina em 1950. Hoje, na Província Rogacionista São Lucas, temos Comunidades Religiosas na Argentina, no Brasil, no Paraguai e em Portugal", informou a Congregação Rogacionista. 

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