Por decisão da Justiça estadual, Douglas Gottardi não poderá depor no julgamento dos seis acusados pelo assassinato de sua irmã, a médica Milena Gottardi. O pedido feito pela defesa de um dos réus foi aceito, com o argumento de que ele já atua como assistente de acusação, em conjunto com o Ministério Público do Estado (MPES).
Surpreso com a decisão, Douglas Gottardi avalia que “há uma tentativa de esconder a verdade dos jurados”. Ele explica que, como acompanhou de perto todo período da separação de Milena, teria muito a contribuir com o seu depoimento. “Cada detalhe triste, principalmente dos últimos dias, seria muito útil para a avaliação dos jurados e até mesmo para esclarecimento a perguntas dos advogados dos réus”, pondera o irmão.
Ele cita como exemplo a última vez em que conversou com a irmã sobre o divórcio. “Milena concluiu a conversa dizendo: ‘Não quero ficar casada com Hilário, pois antes acreditava que ele podia mudar, mas hoje sei que não é possível, pois descobri que não é um problema psicológico ou psiquiátrico. Ele é mau, mau de coração e isso não tem cura", conta Douglas.
Mas ele avalia que há muitas provas para garantir a condenação. “Há provas do envolvimento de todos os réus na morte de minha irmã. E mesmo sem a minha colaboração, confiamos no trabalho da Justiça e na punição de todos”, assinala o irmão de Milena.
Em decisão do último dia 14, o juiz Marcos Pereira Sanches, da Primeira Vara Criminal de Vitória, explica porque Douglas não pode ser ouvido como testemunha. “O assistente de acusação se coloca como parte coadjuvante do Ministério Público. Não mais figura como mero "ator civil". Tanto assim que, atualmente, pode, inclusive, requerer a prisão preventiva do réu. E se assim o é, ele mesmo não pode se arrolar como testemunha. Vale dizer, como parte não pode se arrolar como testemunha.”
Na mesma decisão é informado que esta solução se mostra a mais “prudente e adequada”. “Evita futura arguição de nulidade, com o risco da perda de enorme tempo e esforços, em dano das partes e do ofício jurisdicional”.
É dito ainda que Douglas Gottardi já foi ouvido na primeira parte do processo e que seu depoimento estará à disposição dos jurados. “Não há qualquer prejuízo à acusação ou à busca da verdade real, porquanto o assistente de acusação, quando regularmente arrolado pelo Ministério Público, foi devidamente inquirido na primeira fase do procedimento, cujo termo de depoimento se encontra nos autos e estará à disposição do Conselho de Sentença, se assim o desejarem”, diz o texto da decisão.
O crime aconteceu no dia 14 de setembro de 2017. Milena, de 38 anos, foi baleada com um tiro na cabeça, no estacionamento do Hospital Universitário Cassiano Antônio Moraes (Hucam), em Vitória. Ela tinha acabado de sair do trabalho e estava acompanhada de uma amiga quando foi surpreendida por um homem que simulou um assalto. A morte foi declarada no dia seguinte.
Seis pessoas vão sentar no banco dos réus pelo crime. Os acusados são o ex-marido da vítima, o ex-policial civil Hilário Antonio Fiorot Frasson e o seu pai, Esperidião Carlos Frasson, ambos apontados como mandantes. Pela intermediação foram denunciados Valcir da Silva Dias e Hermenegildo Palauro Filho, o Judinho. A execução foi praticada por Dionathas Alves Vieira, que contou com o apoio de Bruno Rodrigues Broetto, que forneceu a moto. Todos estão presos.
O julgamento está marcado para o dia 8 de março de 2021, no Dia Internacional da Mulher. Será realizado no Fórum da cidade, no centro de Vitória, às 9 horas. Milena deixou duas filhas que estão sob a guarda de Douglas.
Em recurso contra a decisão, o MPES destaca que não há motivo para que Douglas não possa ser ouvido como testemunha. “Não há óbice legal algum de alguém que saiba sobre a verdade dos fatos ser ouvido em plenário pelo simples fato de ter se habilitado como assistente de acusação. Se isso fosse possível, haveria, em verdade, um desincentivo a que a vítima ou seus parentes se habilitassem para acompanhar o processo. A verdade não faz curva!”, diz a manifestação.
O texto aponta ainda um possível receio por parte da defesa dos acusados com o depoimento do irmão de Milena. “Não há razão para esse impedimento, nem jurídica e nem qualquer outra para esse pleito da defesa. A não ser que haja algum receio de os fatos, como eles ocorreram, possam ser esclarecidos para os jurados. A não ser que a verdade seja prejudicial aos interesses da defesa”.
Para Renan Sales, advogado que atua como assistente de acusação representando a família da médica Milena, houve uma “manobra dos réus para esconder a verdade”. “A quem não interessaria a verdade? Cinco dos seis réus alegam inocência, levando essa estratégia a nos causar estranheza. Se são inocentes, o depoimento de Douglas auxiliaria até mesmo a defesa. Entendo a posição do magistrado, ao evitar que a defesa plantasse alguma nulidade nos autos a fim de protelar o feito. No entanto, afastar a possibilidade de os jurados conhecerem os esclarecimentos do irmão da vítima é mais uma manobra, dos réus, para esconder a verdade”, diz.
Para ele não há dúvidas de que os réus serão condenados. “A prova é firme para uma condenação. Apesar de figurar no processo na assistência à acusação, Douglas seria informante e não há prejuízo concreto na sua oitiva. Mas repito, a verdade não ficará escondida. Sobram provas de que os seis réus foram responsáveis pela morte de doutora. Milena, o que nos deixa confiantes na condenação de todos”, assinala Sales.
O advogado de Hilário Frasson, que solicitou a exclusão do depoimento de Douglas Gottardi, Davi Pascoal Miranda, não foi localizado para se manifestar sobre o assunto.
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