A Justiça do Espírito Santo determinou, na última sexta-feira (4), que um cerimonial na Serra não exigisse o comprovante de vacinação para que um empresário participasse de um baile de formatura. Em contrapartida, foi condicionada a apresentação de um teste RT-PCR negativo para Covid-19.
A decisão liminar, proferida em caráter de urgência, é assinada pelo juiz de Direito Júlio César Babilon. Ela contraria a portaria do governo estadual, que proíbe o acesso de pessoas a eventos no Espírito Santo sem a apresentação do comprovante de vacinação.
Segundo o advogado Leonardo Schuler, um dos responsáveis pela ação, a decisão é inédita no Brasil, mas não abrange outros moradores do Estado nem mesmo o acesso do empresário a outros espaços que exigem o passaporte da vacina. A liminar é pontual e foi proferida diante de uma situação específica.
O fato de ser "um evento que não se repetirá" foi, inclusive, um dos pontos usados pelo magistrado na decisão. Nesse caso, tratava-se da formatura de Direito da sobrinha do empresário. Este, além de ter o vínculo afetivo, era o responsável financeiro pelos estudos e pela festa dela.
Segundo a defesa, o empresário não tem o comprovante de vacinação porque não quis se vacinar.
"É um direito dele se vacinar ou não, ninguém pode obrigá-lo. Qualquer imposição desse tipo é inconstitucional. Não é sobre ser de direita ou esquerda, sobre ser a favor da vacina ou negacionista, mas é sobre garantir direito e liberdade plena. Quem defende a cobrança do passaporte vacinal está atentando contra o próprio direito de decidir", alega Schuler. Também integram a ação as advogadas Gisele Quintanilha e Mariana Cuzzuol.
A decisão do juiz Babilon considerou que a exigência do comprovante de vacinação para o acesso dos convidados à formatura revelava um choque entre dois bens jurídicos protegidos pela Constituição.
"De um lado, o direito à liberdade e, de outro, o direito à saúde e o dever do Estado de garantir a redução do risco de doença e outros agravos", registrou.
O magistrado, no entanto, avaliou que a portaria do governo do Estado, que baseou a cobrança do passaporte na festa, "exorbitou os limites impostos pela decisão referenciada do Supremo Tribunal Federal ao não considerar sequer a possibilidade de acesso àquelas pessoas que demonstrem, mediante exame ou teste laboratoriais, não estarem contaminadas pelo vírus".
Assim, para Babilon, a exigência exclusiva da comprovação do esquema vacinal para permitir o acesso dos convidados à formatura era "desprovida de razoabilidade e proporcionalidade", já que "havia medidas menos gravosas" que poderiam ser impostas para diminuir o risco de propagação de Covid-19 no evento, entre elas a realização de um teste RT-PCR.
"A exibição do teste de não contaminação indica com maior certeza que o participante não está com o vírus no momento da testagem e, assim, tem menores chances de colocar os demais participantes em risco de contágio", diz o trecho da decisão.
“Defiro o pedido de urgência para determinar à parte ré que não impeça o autor de ingressar no baile de formatura que será realizado no dia 5 de março de 2022 desde que este apresente exame RT-PCR negativo realizado em até quarenta e oito horas antes do evento", registrou o magistrado, que ainda estabeleceu uma multa de R$ 50 mil em caso de descumprimento.
Desde o dia 31 de janeiro, a apresentação de comprovante de vacinação para ter acesso a bares, restaurantes e eventos é obrigatória no Espírito Santo, independentemente da classificação de risco que o município se encontre. A medida foi instituída por meio da Portaria 020-R.
A exigência faz parte de um acordo entre o setor econômico e o governo visando a reduzir a propagação da Covid-19. Apesar de a vacina não impedir que uma pessoa seja contaminada, especialistas apontam que ela reduz a replicação viral.
"O vírus se multiplica em menor quantidade nas pessoas vacinadas e elas transmitem menos a doença. Nesse sentido, a vacinação deve ser colocada como estratégia de controle de saúde pública para que os espaços públicos sejam mais seguros. O passaporte vacinal é fundamental para que nós possamos ter condicionalidade", afirmou a epidemiologista e professora da Ufes, Ethel Maciel, em entrevista para A Gazeta.
Desde que a portaria do governo do Estado foi publicada, vários projetos de lei para impedir a exigência do comprovante de vacinação foram protocolados e aprovados. Um deles foi em Vitória, de autoria do vereador Gilvan da Federal (Patriota).
Mesmo com um parecer inicial contrário da Comissão de Saúde e o alerta de juristas de que a proposta era inconstitucional, o texto foi aprovado pela Câmara Municipal e virou lei nesta quarta-feira (09) após sanção do prefeito Lorenzo Pazolini (Republicanos).
Entre especialistas da área de Direito, há divergências sobre a constitucionalidade da lei. Isso porque a legislação municipal contraria uma norma estadual, o que deverá levar o caso para a Justiça.
"Você tem o município avaliando de um jeito e o Estado de outro, como se a gente vivesse em realidades diferentes. É um embate político que se reflete na legislação, e o caminho vai ser buscar a Justiça para que ela diga a qual legislação se atentar", explicou o professor de Direito da FDV Adriano Pedra, em entrevista recente para A Gazeta.
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