Está marcado para esta quarta-feira (18) o julgamento, pelo Supremo Tribunal Federal (STF), da constitucionalidade da Lei 11.705/2008, a famosa Lei Seca. A ação, que pode colocar fim à tolerância zero ao álcool para os condutores brasileiros, foi ingressada há 13 anos pela Associação Brasileira de Bares e Restaurantes (Abrasel).
A pauta chegou a constar na agenda do Supremo em outros anos, mas o julgamento nunca ocorreu de fato. O ponto defendido pela Abrasel é de que o texto fere o exercício dos direitos de liberdade e de não autoincriminação. Este último questionamento deve-se ao fato de que há uma multa para quem se nega a realizar o bafômetro .
Rodrigo Vervloet, presidente do Sindicato dos Bares e Restaurantes do Espírito Santo (Sindbares) e representante da Abrasel no Estado, explica que trata-se de uma discussão técnica, mas que as entidades não apoiam que motoristas dirijam após consumo de bebida alcóolica.
“Somos terminantemente contra a bebida com direção, estamos inclusive no Maio Amarelo [mês de conscientização a respeito da segurança no trânsito]. O que questionávamos era sobre a capacidade de a pessoa prestar prova contra si mesmo. Essa era a questão cuja constitucionalidade foi questionada, mas isso já foi até mudado na legislação e a pessoa hoje pode se negar [a fazer o teste do bafômetro]. E acho que o entendimento do STF deve caminhar nesse sentido.”
Porém, segundo Paulo Solmucci, presidente-executivo da Abrasel, este não é o único problema. “Na esteira da lei, tornou-se comum parar cidadãos sem nenhum sinal de embriaguez para averiguação. Isso limita o direito constitucional de ir e vir. Além disso, penaliza do mesmo modo quem dirige embriagado e quem apenas tomou uma taça de vinho.”
Solmucci pontua que o que a associação pleiteia é uma legislação semelhante a que já existe em praticamente todos os países do Ocidente, como no Canadá, Inglaterra, França e Estados Unidos, onde há maior tolerância ao consumo de álcool por motoristas.
A Organização Mundial da Saúde (OMS) estabelece um limite aceitável de 0,5 decigramas por litro no sangue (g/L) para motoristas em geral e abaixo de 0,2 g/L para condutores com até 21 anos (idade mínima para ingestão de bebidas alcóolicas em determinados países). Antes de 2008, a lei brasileira tolerava até 0,6 g/L de álcool no sangue. Hoje, a tolerância ao álcool é zero.
“O objetivo da sociedade é impedir o motorista embriagado de dirigir, e nós defendemos que isso seja feito de modo rigoroso e exemplar. Mas basta estar num bar ou restaurante qualquer para ver que muitos, inclusive autoridades, bebem moderadamente e dirigem. Portanto são criminosos?”
A Associação Brasileira de Medicina de Tráfego (Abramet) também foi procurada, e destacou, por meio de seu departamento jurídico, que a única concentração segura para a direção de veículos automotores é zero, e que, desde que entrou em vigor, a lei trouxe uma redução de 63% no número de mortes no trânsito.
"O risco de envolvimento em um acidente fatal para condutores com alcoolemia entre 0,2 e 0,5 g/L é de 2,6 a 4,6 vezes maior do que o de um condutor sóbrio. A diminuição da capacidade de desempenhar funções cruciais para a condução de veículos, como processamento de informações, se inicia com alcoolemias baixas, e a maioria dos indivíduos se encontra significantemente debilitada com alcoolemia de 0,5 g/L", explicou a advogada da Abramet, Priscila Calado Correa Netto.
Paralelamente, a jurista observa que não é somente o álcool que compromete a direção veicular segura, mas também muitos medicamentos de uso frequente, como antidepressivos ou um simples antialérgico, são comprometedores.
“Imagine agora o que se dá com a combinação de qualquer desses medicamentos com o álcool. Imagine aquele motorista que toma, por exemplo, Lexotan 6mg à noite, tryptanol 50mg de manhã e à noite, e lítio 600mg ao dia, vai a uma festa de casamento, toma apenas uma taça de champanhe para brindar aos noivos, e volta para casa dirigindo. Como dizer que esse motorista é inofensivo mesmo com concentração de álcool no sangue inferior ao mínimo legal?”
A advogada também afirma que não há argumentos válidos para se decidir pelo fim da Lei Seca. "A lei não viola princípios constitucionais, pois não proíbe a venda nem o consumo de bebida alcoólica tampouco o motorista de dirigir. Não há violação aos princípios da liberdade econômica, da livre iniciativa e mínima intervenção do Estado na vida privada. Devemos ter sempre em mente que a vida e a incolumidade física das pessoas são direitos fundamentais e estão acima dos interesses individuais e econômicos".
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