Há pouco mais de dois anos, a artesã Vanuza Alves de Souza perdeu um filho em um acidente de carro em Marataízes, no Sul do Espírito Santo. Praticamente sem forças para enfrentar a perda, ela encontrou nos trabalhos manuais uma forma de superar o luto. Hoje, aos 49 anos, ela confecciona mandalas, pinta vidros e reforma santos.
Moradora de Itapemirim e casada há cerca de duas décadas, ele teve três filhos. No entanto, no dia 1º de maio de 2020, o Kaio – que na época tinha apenas 18 anos – morreu. “Ele era maravilhoso, me ajudava em tudo, era alto astral. Em todas as vezes que pensei em desistir, ele me levantou”, conta.
Segundo a mãe, ele tinha pegado uma carona com mais três pessoas, porém, o veículo caiu na Ponte do Pontal, na Barra de Itapemirim. O jovem foi o único que morreu. “Isso acabou comigo. Eu cheguei a ir a três psiquiatras para me ajudar, mas nenhum conseguiu”, comenta.
Formada em Pedagogia e Educação Especial, Vanuza trabalha atualmente no ramo da estética, como micropigmentadora. Ela confessa que nunca pensou que poderia pintar e fazer artesanato. No entanto, esse cenário acabou mudando quase que por acaso, no ano passado.
Em meio ao luto, ela recebeu uma foto de uma amiga pintando em gesso, mas não se interessou, a princípio. Em um certo dia, o marido de Vanuza chegou em casa com quatro mandalas de gesso quebradas. “Falei para ele deixar ali no canto que eu veria o que fazer, só que eu estava sem tinta e material para restaurar”, relata.
O marido, então, disse que ela poderia usar as tintas que estavam no guarda-roupa do Kaio. “Não tive coragem de abrir, mas ele foi lá e pegou e deixou as tintas perto de mim”, lembra Vanuza. Com o tempo, Vanuza resolveu pintar. “Eu pintei do meu jeito e foi ali que começou, e com um toque do meu filho”, destaca.
Atualmente, a artesã realiza vários tipos de artesanatos, uma deles é a pintura e a reforma de imagens de santos. Ela, aliás, já vendeu algumas. “Eu compro as imagens cruas e pinto, as que eu reformo, faço restauração”, explica.
Para ela, essa é uma ação capaz de trazer uma sensação de bem-estar e de tranquilidade. "No momento em que estou fazendo artesanato é o único em que eu me concentro. Foi a única coisa que me fez enfrentar a perda do meu filho. Estou de pé por conta do artesanato", diz.
Segundo Vanuza, as pessoas comentam que o trabalho dela é muito bonito e isso a motiva a continuar, se distrair e ver o tempo passar. “O artesanato veio como uma forma de me encontrar e de curar a depressão”, pronuncia.
A psicóloga Karla Cardozo da Conceição afirma que realizar trabalhos manuais pode ser um excelente aliado no combate ao luto, dado que proporcionam alívio e bem-estar. “O artesanato pode ajudar a concentração, aliviar o estresse e a ansiedade, além de ajudar a focar em algo produtivo”, explica.
Segundo a psicológica Daniela Bello, há muitas atividades que podem auxiliar as pessoas na superação do luto, como a pintura, a música e até a dedicação aos estudos e aos exercícios físicos. “O luto é um processo. Ele vai estar presente, mas nós podemos superá-lo diante de diversas situações e atividades”, declara.
Para Daniela, as atividades ajudam a pessoa a viver de uma maneira mais saudável e funcional. Além disso, são capazes de contribuir com aqueles que têm dificuldades de se expressar ou falar sobre sentimentos.
A especialista ainda destaca que fazer tais atividades pode colaborar com o processo de socialização, se o indivíduo for fazer um curso de pintura ou artesanato, por exemplo, em que terá contato com outras pessoas. “A socialização é extremamente importante para que a pessoa consiga se sentir pertencente a algo, que ela é importante”, diz.
Em relação ao luto, a psicóloga Karla também expõe que lidar com a perda de um ente querido não é tarefa fácil. Sendo assim, salienta como aprender uma atividade nova pode ajudar nessa etapa.
Por fim, as duas concordam que a psicoterapia é essencial quando a pessoa está passando por algo difícil, como a perda de um filho. “Embora os benefícios dos trabalhos manuais sejam inúmeros, é importante lembrar que ele é apenas uma ferramenta”, comenta Karla.
Com informações do jornalista Matheus Passos, da TV Gazeta Sul.
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