Mais 21 venezuelanos da etnia Warao devem chegar em Vitória até sexta-feira (19). A informação foi confirmada pelo cacique Ruben Mata à reportagem de A Gazeta. O grupo de 25 pessoas abandonado próximo da Rodoviária da Capital na madrugada de terça-feira (16) está em um abrigo temporário provido pela Prefeitura de Vitória, após recomendação da Defensoria Pública do Estado do Espírito Santo (DPES).
Segundo Ruben Mata, o grupo de 21 pessoas virá de Jequié, na Bahia. "Eles estão tentando com a prefeitura um ônibus, vão chegar entre amanhã [quinta-feira] e sexta", afirmou.
O cacique informou, ainda, que o abrigo provido pela Prefeitura de Vitória é temporário e, nesta quarta-feira (17), uma situação mais definitiva deve ser discutida sobre o caso. "Nos colocaram em um quarto, conseguimos tomar banho, comer, tomar café da manhã. Está tudo mais tranquilo", relatou.
A reportagem de A Gazeta demandou as prefeituras de Vitória e Jequié, além da Polícia Federal, para saber quais procedimentos serão adotados.
Após passarem a madrugada, manhã e o início da tarde desta terça-feira (16) em um terreno próximo à Rodoviária de Vitória, os 25 venezuelanos da etnia indígena Warao foram levados para um abrigo na Capital. O grupo, composto por crianças, adultos e idosos, foi trazido por um ônibus da Prefeitura de Teixeira de Freitas, na Bahia, e abandonado em Vitória.
Durante o dia, quando questionada sobre o que seria feito os venezuelanos, a Prefeitura de Vitória enviou nota alegando que "por serem estrangeiros, é um tema de atuação da Polícia Federal", orientando que a reportagem procurasse a corporação. No início da noite, no entanto, informou que ofereceu abrigo ao grupo.
A Prefeitura de Vitória foi surpreendida, na manhã desta terça-feira (16), com a notícia de que um grupo de venezuelanos havia sido deixado em uma área perto da Rodoviária da Capital.
Solidária à situação e cumprindo o que preconiza a Lei nº 13.684/2018, que dispõe sobre medidas de assistência emergencial para acolhimento a pessoas em situação de vulnerabilidade decorrente de fluxo migratório provocado por crise humanitária, a gestão, por meio da Secretaria Municipal de Assistência Social (Semas), encaminhou, logo no início da manhã, equipes de abordagem à região da rodoviária de Vitória.
A Semas realizou os primeiros atendimentos ao grupo, prestando assistência emergencial às principais necessidades do mesmo, e imediatamente começou a avaliar possíveis encaminhamentos para essas pessoas. A Secretaria Municipal de Saúde também prestou atendimento.
Concomitante a isso, a Guarda Municipal acompanhou as famílias, a fim de resguardar a integridade física e a segurança do grupo.
A Prefeitura de Vitoria enviou ofício relatando a situação à Policia Federal e está oficiando o Ministério da Cidadania, a Defensoria Pública da União, o Governo do Estado e o Ministério Público.
Ainda durante a tarde desta terça(16), as famílias foram encaminhadas para uma unidade da Prefeitura de Vitória, que segue buscando alternativas legais para o caso, capazes de resguardar os direitos e garantias fundamentais dos cidadãos em tese.
Segundo a professora Brunela Vincenzi, coordenadora da Cátedra Sérgio Vieira de Mello ACNUR/ONU para refugiados e presidente da Comissão de Direitos Humanos da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes), os refugiados foram abrigados, em caráter emergencial, no Centro POP, próximo ao Tancredão, onde passaram a noite.
A Defensoria Pública do Estado, por meio do Núcleo de Direitos Humanos, recomendou que a Prefeitura Municipal de Vitória (PMV) providencie abrigo, alimentação e atendimento médico aos 25 indígenas venezuelanos deixados na capital.
A Instituição pediu que a PMV apresentasse, com urgência, um plano de atuação que contemple o cadastramento das pessoas, assistência social e médica, vacinação, alimentação, vestuário e abrigo. Além disso, a Defensoria quer que a Guarda Municipal garanta a integridade física das famílias. Confira o posicionamento na íntegra no documento abaixo:
Ruben Mata, de 37 anos, cacique da tribo e que está no grupo que chegou em Vitória, disse que o grupo entrou no Brasil pelo Estado de Roraima, passou por outros municípios brasileiros e, em seguida, foi para Jequié, outra cidade do interior da Bahia. Uma assistente social, porém, disse para eles que lá era uma cidade pequena e que os integrantes teriam de se mudar para conseguir trabalho.
"Primeiro chegamos em Jequié. Eu falei com a assistente social e aí ela falou que era cidade pequena e perguntou para onde queríamos ir. Eu tenho família, tenho criança pequena. Ela falou que tínhamos que ir para outra cidade, para Teixeira de Freitas. Colocaram no ônibus e nos deixaram em Teixeira de Freitas", contou.
Em Teixeira de Freitas, eles foram orientados novamente por uma assistente social a virem para Vitória porque as condições de vida aqui seriam melhores. Eles foram deixados próximo à Rodoviária de Vitória, sem receber nenhuma outra instrução.
"Lá, de novo chegou a assistente social e sacaram todos os documentos e falaram que tínhamos que ir para outra cidade, para Vitória, e aí colocaram a gente no ônibus de novo. Deixaram a gente aqui fora e o ônibus voltou", explicou Ruben.
Ruben contou que foram atraídos ao Brasil por promessas de que teriam oportunidades de trabalho. O cacique da tribo afirmou que a realidade foi diferente e pediu ajuda para ele e também aos outros membros da tribo.
"Cheguei aqui esperando encontrar o que me prometeram. Estamos andando há um tempo. Nas outras cidades, ninguém me ajudou e agora chegamos em Vitória para sermos ajudados", lamentou Ruben.
Na tarde desta terça-feira (16), a Polícia Federal enviou uma nota afirmando que cabe à corporação no Espírito Santo apenas atender os imigrantes no caso de renovação anual da solicitação de refúgio ou para emitir a Carteira de Registro Nacional Migratório (CRNM), quando a solicitação é aprovada pelo Comitê Nacional para os Refugiados (Conare). Leia a nota na íntegra:
"Face às notícias veiculadas na imprensa de que migrantes venezuelanos chegaram em Vitória/ES provenientes do Estado da Bahia e estão provisoriamente em terreno próximo da rodoviária, a Polícia Federal no Estado do Espírito Santo vem informar que: O Brasil editou o DECRETO Nº 9.285, DE 15 DE FEVEREIRO DE 2018, reconhecendo a situação de vulnerabilidade decorrente do fluxo migratório provocado pela crise humanitária na República Bolivariana da Venezuela.
Assim, em relação aos migrantes provenientes da Venezuela, cabe à Polícia Federal no estado de ingresso no Brasil (que normalmente é em Roraima) o cadastramento da solicitação de refúgio, o qual é enviado para decisão ao Comitê Nacional para os Refugiados (CONARE), vinculado ao Ministério da Justiça e Segurança Pública, estando autorizada a residência provisória no Brasil até o julgamento final do pedido de refúgio (art. 96, §4º do Decreto nº 9.199/2017).
Nesse cenário, cabe à Polícia Federal no Espírito Santo apenas atender os migrantes no caso de renovação anual da solicitação de refúgio ou no caso de emissão da Carteira de Registro Nacional Migratório - CRNM quando deferida a solicitação de refúgio pelo CONARE.
Vale mencionar, entretanto, que a LEI Nº 13.684, DE 21 DE JUNHO DE 2018, que dispõe sobre medidas de assistência emergencial para acolhimento a pessoas em situação de vulnerabilidade decorrente de fluxo migratório provocado por crise humanitária, impõe uma série de obrigações e responsabilidades aos entes federativos no que tange à adoção de medidas de assistência emergencial para acolhimento essas pessoas, para proteção social, atenção à saúde, observância dos direitos humanos etc. Portanto, trata-se de questão complexa, cabendo agora aos serviços de assistência social darem o devido acolhimento aos venezuelanos."
A reportagem de A Gazeta também procurou a Polícia Rodoviária Federal para saber se haverá alguma ação em relação à chegada de mais um grupo ao Espírito Santo, como foi dito por Ruben Mata, no entanto o órgão informou que as atribuições de investigações ou mesmo montagem de barreiras em rodovias seriam da Polícia Federal.
A Secretaria de Estado de Trabalho, Assistência e Desenvolvimento Social (Setades) disse que foi informada pela Prefeitura de Vitória da chegada dos 25 venezuelanos no Estado e alegou que a pasta deve prestar orientação técnica aos municípios com essa demanda, além de ajudar com os serviços que farão o acolhimento dessa população, mas que o atendimento direto aos indígenas é feito pela equipe municipal de assistência. Leia a nota na íntegra:
O Governo do Estado informa que foi comunicado pela Prefeitura Municipal de Vitória sobre a chegada dos indígenas venezuelanos da etnia Warao ao Estado. A situação está sendo acompanhada pela Secretaria de Estado de Direitos Humanos (SEDH) e pela Secretaria de Estado de Trabalho, Assistência e Desenvolvimento Social (Setades).
A SEDH iniciou as primeiras articulações e está em diálogo com as autoridades competentes e mecanismos ligados aos direitos humanos, buscando impedir violações de direitos e a garantia da dignidade do grupo.
O papel da Setades no atendimento a essa população, no âmbito do Sistema Único de Assistência Social (Suas), é prestar orientação técnica aos municípios com essa demanda, além de cofinanciar os serviços que farão o acolhimento dessa população. Entretanto, o atendimento direto aos indígenas Warao é feito pela equipe municipal de assistência.
Também é de responsabilidade da Setades a notificação da chegada da população Warao junto ao Ministério da Cidadania (MIC), à Defensoria Pública da União (DPU) e ao Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (ACNUR), que já foram notificados.
Cabe reiterar que o compromisso do Estado e dos municípios, dentro do escopo da legislação socioassistencial e da Constituição Federal, é garantir a proteção social desses indivíduos e famílias e, ao mesmo tempo, respeitar a cultura e a tradição dessa comunidade indígena.
O governo do Estado está em contato permanente com a equipe do município para que tão logo seja disponibilizado o local de abrigo e demais providências, sempre respeitando a cultura da etnia Warao.
O secretário de Assistência Social da Prefeitura de Teixeira de Freitas, alegou, em vídeo enviado para a TV Gazeta, que os venezuelanos não foram abandonados em Vitória.
"A prefeitura tomou conhecimento que eles haviam desembarcado aqui em Teixeira de Freitas, vindos de Jequié, na sexta-feira (19). Ao encontrá-los, a Secretaria de Assistência Social, imediatamente, providenciou um abrigo provisório. Acolhemos ele em uma escola, oferecemos alimentação, serviços médicos, doações. Eles são adultos, livres e têm direito de ir e vir. Ao identificar que em nossa cidade eles não teriam as condições para viver, foi facultado a eles, para onde eles quisessem ir. A nossa cidade ofertou o que eles queriam, o transporte, para a cidade que eles escolhessem", afirmou em vídeo.
Brunela Vicenzi, Colunista de A Gazeta e Professora da Ufes, coordenadora da Cátedra Sérgio Vieira de Mello ACNUR/ONU para refugiados e presidente da Comissão de Direitos Humanos da Ufes e da ANDHEP, apontou que Warao é uma etnia indígena que está há cerca de três anos no Brasil em situação de refúgio.
De acordo com publicação do Alto Comissariado da ONU para Refugiados (ACNUR Brasil), intitulada “Os Warao no Brasil – Contribuições da antropologia para a proteção de indígenas refugiados e migrantes”, os Warao são a etnia mais antiga na Venezuela: estima-se que vivem lá há aproximadamente oito mil anos.
Essa mesma publicação, baseando-se em diversos estudos antropológicos, demonstra diversas circunstâncias de caráter ambiental e financeiro que levaram os Warao a saírem de suas terras no Norte da Venezuela e migrarem, primeiro, para áreas urbanas no próprio país e, posteriormente, a realizarem a longa jornada para o Brasil, aqui entrando como pessoas em situação de refúgio.
A princípio, as comunidades Warao chegaram ao Brasil e se assentaram em Roraima, tanto em Pacaraima, cidade fronteiriça com a Venezuela, como em Boa Vista, capital do Estado. Diversas iniciativas de acolhimento em Roraima permitiram que o Acnur Brasil pudesse aprofundar o conhecimento sobre a população Warao que chegava ao Brasil, juntamente com universidades e pesquisadores que participaram de projetos de pesquisa e extensão para a realização de um grande apanhado de dados, a fim de fundamentar e amparar cientificamente a forma de melhor acolher essa população aqui no Brasil.
Por algum tempo, os Warao ficaram no Norte do Brasil, posteriormente alguns grupos foram para o Amazonas, Pará, Paraíba, Acre, depois para Minas Gerais, São Paulo, Rio de Janeiro, e há algum tempo também estão no Espírito Santo.
Os Warao não falam espanhol, língua oficial da Venezuela, pois, assim como as populações indígenas brasileiras, têm a sua própria língua, que se chama também warao.
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