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Ministério Público investiga seis unidades para tratar vícios na Serra

Ministério Público investiga seis unidades para tratar vícios na Serra

As irregularidades que estão sendo investigadas vão da falta de segurança, passando por ambientes sujos e sem alvará de funcionamento, até denúncias de trabalho análogo ao escravo

Publicado em 9 de setembro de 2020 às 10:06

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Usuário mostra a droga antes de ser consumida na Praia do Suá, Vitória, ES, Brasil.
Usuário mostra a droga antes de ser consumida na Praia do Suá, em Vitória. (Vitor Jubini)

Seis comunidades terapêuticas - espaços destinados ao tratamento de dependentes químicos -, localizadas no município da Serra são alvo de uma investigação do Ministério Público do Estado (MP-ES). Uma delas é a unidade onde duas mulheres denunciaram à polícia terem sido estupradas, após um homem invadir o local.

O fato aconteceu no dia 27 de agosto. Um homem teria invadido o local, amarrado as mulheres e, fazendo ameaças com uma faca, mantido relações sexuais com as duas. Uma das mulheres violentadas está grávida de seis meses.

A família de uma das vítimas informou à polícia que paga R$ 500 por mês para manter o tratamento da filha na comunidade. A polícia prendeu um suspeito pelo crime.

Em relação a este caso, por nota o MPES informou que, por meio da Promotoria de Justiça Cível da Serra, "instaurou procedimento preparatório para apurar o regular funcionamento da instituição onde se noticiou a ocorrência de um crime de estupro".

AÇÃO NA JUSTIÇA

Uma das investigações conduzidas pela Promotoria de Justiça Cível da Serra já se transformou em uma ação civil pública. Por nota o MPES informa que "ela requer a interdição de uma instituição social que não obteve alvará da Vigilância Sanitária e manteve o funcionamento indevidamente".

No site do Tribunal de Justiça, há a informação de que a comunidade já foi interditada, fato confirmado ainda pela Secretaria de Estado da Saúde (Sesa).

Tanto na ação quanto nos demais procedimentos, estão sendo investigados diversas problemas. Uma deles é a falta de segurança. Há ainda irregularidades que vão desde condições inadequadas dos imóveis, com muita sujeira e alimentos armazenados de forma inadequada, até denúncias de trabalho análogo ao escravo.

Situação inclusive que denunciada pela Superintendência Regional do Trabalho e Emprego no Espírito Santo ao MP-ES. São os casos em que os internos venderiam produtos na rua ou em semáforos, para cumprir metas dentro das instituições, mas todo o fruto do trabalho seria entregue para a direção das comunidades, sem que fossem remunerados.

Usuário Z.
Usuário consome crack em rua da Enseada so Suá . (Vitor Jubini)

Há ainda suspeita de que algumas das internações realizadas nestes locais não seriam voluntárias. Está sendo investigado se os documentos de entrada nas comunidades foram assinados por familiares, o que seria ilegal.

O MP-ES também investiga as ausências de alvarás. Para funcionarem, as comunidades precisam ter os seguintes documentos autorizativos de funcionamento, segundo relata a ação civil que tramita na Justiça estadual: licença de localização e funcionamento, alvará de Corpo de Bombeiros e alvará de vigilância sanitária.

Fiscalizações realizadas em uma das comunidades, por exemplo, constatou em diversas ocasiões, a ausência destes documentos.

Uma pesquisa no site do Corpo de Bombeiros aponta que, em todo o Estado, há pelo menos onze comunidades terapêuticas com alvarás irregulares. O número pode ser bem maior uma vez que nem todos os espaços destinados ao tratamento de dependentes químicos adotam em seu nome o título de comunidade terapêutica, o que dificulta a consulta no site.

INTERDIÇÕES NA SERRA

A Secretaria de Estado da Saúde (Sesa) informou que foi pactuado com os municípios que a gestão e fiscalização das comunidades terapêuticas ficariam com as as vigilâncias municipais. “A partir da pactuação, tanto o licenciamento quanto a fiscalização da atividade são de responsabilidade dos municípios”, explicou a Sesa, em nota.

A exceção são as comunidades do município da Serra, única cidade que não fez a parceria com a Sesa. Atualmente, na cidade, quatro comunidades terapêuticas estão sob responsabilidade do Estado, duas delas estão licenciadas e outras duas foram interditadas.

OUTRAS CLÍNICAS E COMUNIDADES IRREGULARES

De acordo com Carlos Lopes, subsecretário de Políticas sobre Drogas, - vinculada à Secretaria de Estado de Direitos Humanos (SEDH) -, não é possível precisar o número de comunidades terapêuticas existentes no Estado. “Muitas funcionam de forma clandestina. Cabe aos municípios, assim como ao MP-ES, o acompanhamento. E, sem a fiscalização, muitas funcionam de forma irregular”, disse.

Outra situação apontada por Lopes é que muitos dos estabelecimentos que oferecem tratamento para dependentes químicos são instituições religiosas. “Abrem as portas, oferecem tratamento, mas sem fazer nenhum tipo de enquadramento na legislação vigente. Oferecem atendimento religioso e missionário”, relata.

Segundo Carlos Lopes, entende-se uma comunidade terapêutica como uma unidade de acolhimento transitório, onde a pessoa vai por livre e espontânea vontade. “Não pode haver internação compulsória ou involuntária. E este requerimento não pode ser superior a  seis meses. Precisa ainda acompanhamento com assistente social, psicólogo, um monitoramento de equipe, tendo a abstinência de uso da droga”, explicou.

Mas não é o que ocorre em alguns espaços, explicou Lopes. “Tem espaços que se denominam de comunidade terapêutica e é meramente uma doutrinação religiosa”.

ESPAÇOS CREDENCIADOS E LEGALIZADOS

O Estado conta com seis comunidades terapêuticas credenciadas cujos nomes e contatos estão disponíveis no site da Secretaria de Estado de Direitos Humanos. São espaços onde o Estado paga pelas vagas para as internações. Cinco são masculinas e uma feminina.

De acordo com Lopes, para serem credenciadas, as unidades precisam seguir um conjunto de regras estabelecidas em um edital que também está disponível no site. Dentre as exigências, tem-se a padronização de alvarás, o que a permitirá receber acolhidos encaminhados pelo Estado, o que dá acesso ao ressarcimento financeiro.

Aos que necessitam do serviço, Lopes aconselha inicialmente a procurar um dos serviços que integra a Rede de Atenção Psicossocial (RAP). Nos municípios, o caminho inicial passa pelo Centro de Atenção Psicossocial (Caps), e onde não existir, deve-se procurar os programas de saúde mental.

O Estado conta ainda com o Centro de Acolhimento de Atenção Integral sobre Drogas. “Lá o paciente pode ser orientado e encaminhado para ter o tratamento de acordo com a sua especificidade. Nem todos vão precisar de acolhimento em uma comunidade terapêutica. Às vezes, o tratamento ambulatorial é o suficiente. Em outras situações mais graves é preciso ser encaminhado para um hospital, devido ao nível de intoxicação ser muito grande”, explica.

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