Internado desde maio em um hospital de Colatina, no Noroeste do Espírito Santo, o advogado Manoel Pevidor Dias, 65 anos, morreu na noite desta sexta-feira (13). Ele pode ser mais uma vítima do falso óleo de semente de abóbora que provocou a morte de um casal da Serra no início deste ano.
A suspeita surgiu após a polícia encontrar o nome do advogado na lista de compradores do fornecedor que vendeu o produto contaminado para o casal — a mercadoria continha a substância dietilenoglicol, que é tóxica. A família de Manoel ainda aguarda o resultado do laudo da Polícia Civil para saber se ele também consumiu óleo com dietilenoglicol.
O advogado mora na cidade mineira de Aimorés, que fica na divisa entre Minas Gerais e Espírito Santo, por isso foi internado em um hospital particular de Colatina, onde estava em um leito de UTI.
Segundo a esposa da vítima, que conversou com a reportagem de A Gazeta em julho, a família não desconfiava que os problemas de saúde do advogado pudessem ter alguma ligação com o óleo, até receber uma ligação da Polícia Civil do Espírito Santo informado que o nome dele estava na lista de compradores do mesmo vendedor que forneceu os produtos para o casal que morreu na Serra. O responsável pela fabricação do produto vendido ao casal como óleo de semente de abóbora foi preso em flagrante em maio deste ano em São Bernardo do Campo (SP).
A esposa informou que esse contato foi feito em julho. A família ainda aguarda o resultado do laudo pericial para saber se o produto tinha alguma substância tóxica. A embalagem do produto comprado pelo advogado é do mesmo fabricante que vendeu o material para o casal.
Questionada sobre a situação do advogado, a Polícia Civil se limitou a informar que não tem condições de atualizar nenhum caso nos finais de semana.
No dia em que a Polícia Civil informou haver encerrado o inquérito sobre a morte do casal na Serra, já havia adiantado que o site em que o óleo era vendido foi contatado para informar se mais pessoas compraram o produto e, consequentemente, fazer a identificação de outros possíveis intoxicados com dietilenoglicol. A substância é a mesma que contaminou lotes da Cervejaria Backer, em Minas Gerais, e matou dez pessoas em 2019.
Em julho, a esposa de Manoel contou à reportagem de A Gazeta que o advogado comprou o produto pela internet em busca de qualidade de vida e regulação do colesterol. Segundo a mulher, ele consumiu o produto por alguns dias até apresentar problemas intestinais graves.
“As equipes médicas fizeram vários exames e não descobriram o motivo dos problemas. Ele foi internado em 6 de abril e teve alta no começo de maio, mas alguns depois voltou para o hospital com problemas cardíacos em função da primeira internação (segundo médicos disseram para ela)”, relatou a esposa do advogado.
Desde então, o advogado seguiu internado na unidade de Colatina, alternando entre evoluções e pioras no seu quadro de saúde. O corpo de Manoel foi velado na Igreja Batista de Aimorés e sepultado na cidade mineira neste sábado (14).
No dia 6 de julho, a Polícia Civil do Espírito Santo informou que concluiu o inquérito que investigou a morte do casal Rosineide Dorneles Mendes Oliveiras e Willis Penna de Oliveira. A mulher morreu em 15 de fevereiro e o companheiro foi a óbito em 16 de março deste ano, após ambos consumirem o produto denominado “óleo de semente de abóbora”, vendido para todo o Brasil pela internet.
O material foi o que a artesã e o cozinheiro passaram a consumir diariamente, na quantidade de uma colher por dia, mas o que eles ingeriram não continha nada do prometido, segundo perícia da Polícia Civil.
Segundo a investigação, o casal usou o produto por cerca de 14 dias e parou apenas quando começou a sentir os primeiros sintomas, como náuseas, dores de cabeça e vômitos. Inicialmente, ambos buscaram atendimento médico, mas foram liberados porque os sintomas foram classificados como leves.
Somente na terceira ida a um pronto-atendimento, com o quadro já agravado e com insuficiência renal identificada, marido e mulher foram internados no Hospital Estadual Dório Silva, na Serra, em estado grave. Exames laboratoriais e cadavéricos feitos nos corpos atestaram que o casal ingeriu dietilenoglicol.
Após meses de investigação, que contou com a colaboração da Polícia Civil dos estados do Espírito Santo, São Paulo e Minas Gerais, a polícia concluiu o inquérito e efetuou a prisão do responsável pela fabricação do produto vendido como óleo de semente de abóbora. A prisão ocorreu na cidade paulista de São Bernardo do Campo, em uma casa improvisada como laboratório, onde o fabricante produzia livremente o composto. Ele foi preso em flagrante no dia 25 de maio e cumpre prisão preventiva.
Além do falso óleo de semente de abóbora, no laboratório clandestino eram feitos cosméticos sem qualquer tipo de controle, desta forma é provável que tenha ocorrido uma contaminação por produtos diferentes ou até mesmo a rotulagem equivocada do que estava sendo envasado.
"Nesta mesma empresa, o responsável desenvolvia outras atividades, como cosméticos. Então ele tinha uma série de produtos que também eram vendidos pela internet. A gente acredita que ele possa ter misturados os ingredientes ou cometido um erro na hora de rotular e acabou vendendo uma substância por outra. A produção era completamente artesanal e ele não tinha formação alguma na área. Simplesmente achou que poderia envasar e vender", disse delegado Rodrigo Rosa, do 12º Distrito Policial, que comandou as investigações.
O homem preso foi autuado pelos crimes de estelionato, crime contra relações de consumo e por falsificação de produtos terapêuticos. As penas somadas podem chegar a 25 anos. O chefe do 12º distrito vai solicitar também a prisão pelo duplo homicídio do casal, comprovado ser pelo uso da substância em questão.
Segundo a perita Daniela de Paula, as primeiras análises do produto recolhido na casa do casal da Serra descartou a possibilidade de ser um óleo vegetal. Com isso, os trabalhos foram direcionados a identificar qual era a substância que causou a morte do casal.
Foram encontradas duas substâncias nesse suposto óleo de semente de abóbora: a glicerina e o dietilenoglicol. Para atestar se era realmente o mesmo composto que contaminou o lote de cervejas, a perícia técnica da Polícia Civil mineira foi solicitada para enviarem os parâmetros da substância. Feita a análise, foi comprovado e constatado o dietilenoglicol no produto comprado por Rosineide e Willis.
Com a substância identificada, a perícia investigou a quantidade presente nas amostras. Para surpresa até mesmo dos peritos e legistas, a concentração estava muito acima da permitida pela legislação vigente no país.
"A partir daí foi desenvolvida uma técnica para que a gente pudesse quantificar a quantidade deste produto em questão. Na glicerina, é permitido ter até 0,10% de dietilenoglicol na composição, nestes casos para o uso oral. Foi identificada a quantidade de 13% de dietilenoglicol na formulação. A glicerina em si também é um medicamento e usada em alguns xaropes de paracetamol e outros. Em resumo, é como se em 100 ml's de glicerina, encontramos 13 ml's de dietilenoglicol", detalhou Daniela de Paula.
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