Com um mundo cada vez mais tecnológico e em busca de soluções para melhorar a qualidade de vida das pessoas, destacam-se, na atração de negócios, municípios que mudam sua forma de organizar as comunidades, que investem em modernização, em infraestrutura sustentável e na melhora dos indicadores de educação e saúde, tornando-se 'inteligentes'.
No Espírito Santo, cinco das seis cidades que estavam entre as 100 melhores para viver caíram no ranking Connected Smart Cities — uma delas, inclusive, ficou fora da lista. O resultado mostra que, em vez de avançar, esses municípios andaram de ré, descendo degraus importantes, de acordo com o estudo.
Perderam colocação Vitória, Vila Velha, Serra, Linhares e Colatina. O único que melhorou foi Cachoeiro de Itapemirim. A pesquisa, desenvolvida pela Urban Systems, em parceria com a Necta, analisa 11 indicadores dos centros urbanos que são referência em desenvolvimento e mobilidade urbana.
Vitória, que até em 2021 estava como a 5ª mais inteligente do país, retroagiu para a 7ª posição, ficando atrás de cidades que não são capitais, como São Caetano e Campinas. Vila Velha passou do 30º para o 33º lugar. Linhares saiu da 51ª posição para 68ª. Serra despencou de 69º para 89º. Colatina que era 90º ficou fora dos 100+. Já Cachoeiro pulou de 59º para 37º.
O ranking abrange 680 municípios que têm população acima de 50 mil habitantes. Ele considera mobilidade, urbanismo, meio ambiente, tecnologia e inovação, economia, educação, saúde, segurança, empreendedorismo, governança e energia.
Segundo o especialista responsável pelo Connected Smart Cities, Willian Rigon, a nota dos eixos tem como base a avaliação de 75 indicadores. Na segurança, são medidos fatores como presença de centros de controle e operações nos municípios e monitoramento de áreas de risco.
O conceito de smart city, ou cidade inteligente, não é uma unanimidade no Brasil. Porém, pode ser entendido como sistemas integrados de pessoas em território urbano. Neles, todos interagem e usam energia, materiais, serviços e financiamento para incrementar o desenvolvimento econômico e a melhoria da qualidade de vida. Assim, são considerados conceitos como o de sustentabilidade ligada à educação e economia criativa.
"Os indicadores são colhidos junto de fontes secundárias (como o IBGE, Portal do Empreendedor e Anprotec) e abrimos este ano, por meio de formulários on-line, a possibilidade de os municípios atualizarem suas informações no que tange às soluções de desenvolvimento de cidades inteligentes — implementação de semáforos eletrônico e agendamento de consultas on-line na saúde pública, por exemplo", explica o especialista.
Conforme mostrado por A Gazeta em novembro do ano passado, a Capital ocupou a 5ª posição dentre todas as cidades brasileiras, destacando-se em educação (1º) e saúde (2º). Na época, o prefeito Lorenzo Pazolini ressaltou o investimento na área de inovação e na economia criativa — com a criação do Centro de Inovação do Parque Tecnológico e a expansão dos pontos de internet livre em locais públicos, por exemplo.
Este ano, a gestão de Vitória informou ter adotado medidas que reaqueceram a economia da cidade, como a modernização e desburocratização do licenciamento de obras, um processo online que agora permite a aprovação de um empreendimento em até 48h e até dispensa algumas atividades da exigência de licenciamento ambiental.
Ainda assim, em 2022, houve uma decaída de duas posições no ranking geral do Connected Smart Cities: a cidade fez 35,604 pontos, contra 37,182 da lista anterior. A partir dos números, pode ser observado que houve queda em todos os eixos analisados.
Este ano, a Capital saiu da 1ª para a 7ª colocação em educação. Segundo o ranking, a redução de indicadores como nota média dos alunos de escolas públicas no Enem contribuiu para o resultado. Assim, a avaliação da cidade nesse quesito saiu de 457,5 para 428,8. São 6,3 pontos abaixo do mesmo indicador de São Caetano do Sul (SP), primeiro colocado no eixo e 4º lugar geral.
Vitória apresentou uma queda geral em comparação a outras cidades do país, principalmente no empreendedorismo. A nota 2,849, que garantiu a 27ª posição em 2021, caiu para 1,644, levando a cidade para a 73ª colocação no quesito. A primeira colocada, Curitiba (PR), tem 2,838 pontos.
Com base nos dados da pesquisa, é possível observar que houve piora no cenário de crescimento das empresas no ramo de economia criativa da capital. O resultado, que já havia sido negativo em 2021 (-2,21%), manteve-se em queda este ano: -2,48%.
Caiu também o ritmo de crescimento do número de microempreendedores individuais (MEIs). Enquanto em 2021 houve um aumento de 21,23% no registro de MEIs, em 2022 o crescimento foi menor: 15,77%. Outro fator que também contribuiu para a queda foi justamente a falta de desenvolvimento de parques tecnológicos na capital. Vale lembrar da construção do Centro Tecnológico de Vitória, que ficou em obra durante cerca de três anos.
Em nota, a Companhia de Desenvolvimento, Turismo e Inovação de Vitória informa que, neste ano, foram feitos 2.691 registros de MEIs na cidade. Em adição, disse que está sendo implantada a Sala do Empreendedor, que vai oferecer um conjunto de ferramentas e soluções efetivas para reduzir a burocracia, gerar emprego, renda e oportunidades na cidade. Também acrescenta que o Sine Vitória atingiu a marca de 618% de aumento de esforço de captação, 217% acima da meta estabelecida para todo 2022.
Além de Vitória, houve declínio de grande parte das cidades capixabas no ranking. No caso de Vila Velha, a relação entre as notas não apresentou uma diferença gritante. Em linhas gerais, comparado a 2021, a queda foi de três posições: era 30º, com 33,628 pontos, e passou para 33º, com 32,504.
O quesito em que Vila Velha mais perdeu posições foi em Segurança: era 55º, com 3,471 pontos, em 2021, e foi para a 100ª posição, com 3,469 pontos. De acordo com dados coletados pelo ranking, tendo como base informação da Secretaria do Tesouro Nacional (Siconfi), houve uma redução nas despesas per capita do município com segurança, entre os dois anos: em 2021, o valor investido foi de R$ 9,77 por habitante; em 2022, foi R$ 7,46.
Os dados também mostram que o número de policiais, guardas civis municipais e agentes de trânsito por 100 mil habitantes caiu de 93,2 para 90,6, com base na Relação Anual de Informações Sociais (Rais). Além disso, o ranking lista também mostra que a média de homicídios a cada 100 mil habitantes subiu de 29,1 para 35,4, conforme informações do Datasus. O primeiro colocado no eixo de segurança, São Caetano do Sul (SP), teve a média de 9,2 homicídios por 100 mil habitantes.
De acordo com o secretário municipal de Tecnologia e Segurança de Vila Velha, Marcelo dos Santos Machado, os resultados da pesquisa não condizem com a realidade da cidade. O secretário cita que a cidade possui 53 vias controladas 24 horas por dia e 186 câmeras de videomonitoramento — 160 a mais do que o ano passado. Ele aponta ainda que houve a compra de 27 viaturas, treinamentos e capacitações para a guarda municipal.
Em Linhares, houve queda de 17 posições na lista geral: do 51º lugar, em 2021, com 31,678 pontos, para 68º, em 2022, com 30,254. O declínio mais acentuado ocorreu com as notas da segurança. Nesse quesito, a cidade caiu de 76º, com 3,875 pontos, para 96º, com 3,478. Conforme as informações disponibilizadas no levantamento, com base no Datasus, houve aumento no número de homicídios a cada 100 mil habitantes, que passou de 46,4 para 52,8.
A avaliação mostra que também houve aumento no número de óbitos em acidentes trânsito a cada 100 mil habitantes, que saiu de 8,27 (em 2021) para 28,9 (em 2022), baseado em dados do Datasus. Os levantamentos da Urban Systems também mostraram uma diminuição na despesa per capita com segurança, que caiu de R$ 79,39 para R$ 72,19, entre 2021 e 2022, conforme números do Siconfi.
A reportagem fez contato com a assessoria de imprensa da Prefeitura de Linhares, mas não obteve retorno até a publicação desse texto. Caso haja alguma manifestação, essa reportagem será atualizada.
As mudanças nos indicadores de Serra resultaram na 89ª posição, com 29,733 pontos — queda de 20 posições em relação a 2021, quando obteve 31,025. A alteração mais notável é observada no indicador de governança. Foram 27 posições abaixo, comparado ao ano passado — de 52º, com 6.800 pontos, para 79º, com 6.668. A outra categoria em que a cidade conseguiu se colocar entre as 100 mais notáveis no ranking foi urbanismo.
Conforme os dados da Conected Smart Cities, o município reduziu o valor médio gasto com urbanismo por habitante: passou de R$ 647,87, em 2021, para R$ 447,17, em 2022, como apontam dados do Siconfi. O ranking ainda mostra diminuição nos gastos em segurança por habitante: em 2021, era de R$3,48; em 2022, ficou em R$ 1,39.
Para o secretário municipal de Desenvolvimento Econômico, Empreendedorismo e Planejamento de Serra, Luiz Fernando Mello Leitão, é necessário entender que os altos e baixos são normais em pesquisas como essa, devido aos critérios medidos. Ele lembra que, nos dados do ranking relacionados à governança, são 10 itens avaliados. E cita que um deles teve melhora: transparência na gestão. Nesse quesito, o índice subiu de 9,52, em 2021, para 9,60, em 2022.
Além disso, o secretário destaca que, em outros cinco quesitos, não houve mudança de nota. Enquanto quatro tiveram redução abaixo de 10%. Por fim, Mello Leitão acrescenta que, em um item, houve redução acima dos 10%, no caso, o de investimento per capita em segurança.
Mello Leitão ainda pontua que a queda generalizada provavelmente está relacionada ao período atípico da pandemia de Covid-19. Contudo, reforça que é preciso tomar cuidado com as perspectivas apresentadas no ranking, visto que não apresentam uma visão determinante de futuro.
Diferentemente dos outros municípios do Espírito Santo no ranking, Colatina foi retirada da lista das 100 cidades mais inteligentes do Brasil. Antes, estava na 90ª colocação. Entretanto, ao mesmo tempo que deixou a lista, subiu colocações nos eixos de meio ambiente (94ª) e urbanismo (90ª).
As informações do ranking mostraram o índice de atendimento urbano de água passou de 99,5% para 99,9% dos domicílios com água encanada, conforme dados do Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento (SNIS). Já o índice de recuperação de recuperação de materiais reciclados cresceu: de 1,4% para 3,3%. Porém, houve declínio nos demais critérios analisados.
A Secretaria de Governo da Prefeitura de Colatina, em nota, citou medidas adotas pelo município para torná-lo mais conectado e inteligente. Parte delas, aponta, é o pioneirismo entre cidades brasileiras fora de região metropolitana a ter um edital próprio de inovação aberta para o estímulo à tecnologia, startups, novos negócios e economia criativa. Também lembra que adotou o projeto Minha Nova Rua, com investimento de R$ 50 milhões que irá pavimentar todas as ruas regulares da cidade até o final de 2024.
No eixo da Saúde, em que ainda está entre as 100 principais da Conected Smart Cities, o conteúdo da nota salienta que Colatina é uma cidade polo e recebe demanda de todos os municípios da Região Noroeste e de outros Estados, tanto na rede municipal quanto na estadual e particular. A nota diz que, em meio às dificuldades decorrentes da alta demanda, ainda investe para melhorar o atendimento nas unidades municipais de Saúde.
Em contrapartida às outras cidades, Cachoeiro do Itapemirim foi a única do Espírito Santo que teve uma melhora na posição. A cidade subiu 22 posições: era 59º, em 2021, com 31,480 pontos; passou para 37º, com 32,054. Um dos destaques foi em urbanismo. Antes, quando estava fora da lista, tinha 5.919 pontos. Agora, alcançou a 11ª colocação, com 7.497.
Seus índices de atendimento urbano de água e esgoto estão em 99,5% e 98,6%, respectivamente, conforme dados do SNIS. Além disso, suas notas são todas 10 nas leis sobre Operação Urbana Consorciada e sobre Zoneamento e Uso e Ocupação do Solo e na lei de Plano Diretor Estratégico Municipal — antes ficavam entre 4 e 5.
Alexandro da Vitoria, secretário de Urbanismo, Mobilidade e Desenvolvimento Econômico de Cachoeiro, diz que a cidade sempre acompanhou os indicadores de pesquisa como o ranking. Para ele, o trabalho de análise dos indicadores abordados nas pesquisas é imprescindível para traçar estratégias de melhorias para as cidades.
"Fora a Smart Cities, também fazemos acompanhamento das ISO 37122 e 37123. Os indicadores são importantes, pois refletem a qualidade dos serviços prestados à população", argumenta Alexandro, que acrescenta "Entendermos como todos os critérios de análise estão coordenados abrem portas para materializarmos as vantagens da gestão".
Além disso, o secretário explica que, para a gestão da cidade, o processo de deixar o município 'inteligente' diz respeito a rever seus problemas e tratá-los de forma a contorná-los para que não afetem os cidadãos.
"Verificamos que, até 2021, tínhamos mais demissões do que contratações, por exemplo. Promovemos uma aproximação com a população e o empresariado para entendermos suas dores. Em 2022, abrimos mais de 1.600 vagas de empregos abertas, média de abertura de 11 empresas por dia e 611.000 m² de obras aprovadas na cidade", revela o secretário.
Para o presidente do Instituto Brasileiro de Cidades Humanas, Inteligentes, Criativas e Sustentáveis (Ibrachics), André Gomyde, não existe um modelo de cidade inteligente que possa ser replicado em outra cidade, pois cada uma tem suas próprias características. Assim, as tecnologias aplicadas à cidade devem ser pensadas de acordo com as necessidades locais. "Qualquer modelo de tecnologia na cidade que não dialogue com a população vai dar errado. Por isso que o aspecto humano é fundamental", argumenta Gomyde.
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