No ritual da igreja católica, a parte final das missas é destinada aos avisos e notícias das comunidades nas quais as igrejas estão inseridas. Foi assim que ocorreu na celebração das 9 horas do último domingo (14), na Paróquia Nossa Senhora da Conceição, no Centro de Guarapari.
Só que ao invés de comunicar aos fiéis sobre os recados, o padre Diego Carvalho usou o altar para desabafar sobre o processo em que ele é citado na Justiça: nos últimos dias, o pároco foi informado sobre uma ação de um vizinho devido ao barulho dos sinos da matriz da Cidade Saúde.
Em tom de desabafo e estarrecido, o religioso explicou a situação e informou aos presentes na missa, que também foi transmitida pelas redes sociais, que caso tenha que interromper as badaladas diárias, ele deixará a cidade. Por quase 10 minutos, ele narrou toda a situação envolvendo os sinos da igreja.
Falando aos fiéis, o padre explicou que o processo é movido por apenas uma pessoa e que os sinos tocam em poucos momentos ao longo do dia.
" O sino toca às 6h da manhã, 9h, meio-dia, 15h e 18h, por um minuto somente. É muito triste porque vocês imaginem eu receber uma ordem para desligar os sinos. Vão ter que desligar os sinos de todas as igrejas porque a lei é uma só. Isso desgasta a gente... eu tenho confissões para atender, missas para serem celebradas, vou a Vitória quase todos os dias para reunião com o arcebispo. Tento fazer o máximo, mas agora tenho que ficar me desgastando com questão de sino de igreja que está incomodando, a princípio, uma só pessoa. Aliás, espero que essa pessoa tenha um abaixo-assinado de pelo menos uns 70% da população do Centro pedindo para parar com o sino", ironizou.
A situação, segundo ele, é tão consternante que testa a paciência diariamente. Apesar da revolta com a intimação, o pároco garantiu que irá até o fim para manter os sinos da igreja Nossa Senhora da Conceição tocando nos horários de sempre.
"Eu, padre Diego, tenho tentado ser santo, sabe? Eu me confesso, rezo, faço tudo. Mas, vou dizer para vocês, que no caminho da santidade aparecem umas almas que são difíceis. Eu nasci em uma terra de gente 'briguenta'. Eu faço tudo para não ser (briguento) e vocês me conhecem há anos já. Vou dizer para vocês... eu dou um boi para não entrar numa briga, mas dou uma boiada para não sair dela. Como cristão, faço de tudo para não brigar com ninguém porque eu tenho que transmitir a paz, mas se estou no meu direito, vou até o fim das consequências", apontou o padre, indicando que irá responder ao processo.
Na parte final da longa explicação, Diego Carvalho disse confiar na defesa que o corpo jurídico da Arquidiocese de Vitória, da qual a Paróquia de Guarapari faz parte, fará para resolver a situação. Além disso, ele ainda explicou categoricamente a importância que o sino tem na história do catolicismo, além do simbolismo da peça.
"Peço a vocês que rezem. Se uma pessoa faz isso, ela pode voltar atrás. Agora eu saio de Guarapari se tiver de desligar o sino, e sairia muito triste. Graças a Deus, a nossa Arquidiocese tem um corpo jurídico muito bom e temos excelentes advogados. Só quero que a justiça seja feita. O sino tem um papel pedagógico. Antes, quando não havia tanta interação como atualmente, eles marcavam as horas e avisavam sobre a morte de alguém", ponderou.
Após o desabafo na missa, o padre foi aplaudido pelos presentes à missa e rapidamente grupos católicos e outras pessoas passaram a divulgar a campanha #EuSouAFavorDosSinos em apoio ao pároco e à Paróquia Nossa Senhora da Conceição.
Na noite desta quarta-feira (16), a Arquidiocese de Vitória publicou uma nota sobre a situação dos sinos da Igreja Matriz de Guarapari. No comunicado, a coordenação da Igreja Católica na Grande Vitória explicou que o caso foi levado ao Ministério Público, que o analisará.
Um morador do Centro fez denúncia junto à entidade sobre o badalar às 6h da manhã. O procedimento está em tramitação até que o MP obtenha as informações necessárias para responder ao noticiante. A Arquidiocese de Vitória aguarda a tramitação para posicionamento oficial, se necessário. O pároco, pe. Diego Carvalho disse que “o volume do som e tempo de duração obedecem às leis do município” e manifestou desconforto em relação à denúncia junto ao MP.
Padre Diego nas missas de domingo, dia 14 de novembro, explicou aos fiéis que a denúncia havia sido feita e estes manifestaram descontentamento por se tratar de um costume antigo que também representa a presença da Igreja Católica na cidade. Os sinos carregam muitas simbologias que ao longo do tempo foram se modificando. Indicavam as horas, anunciavam eventos diversos com toques diversos ou a morte de um fiel e, principalmente, o badalar dos sinos têm o poder de elevar nosso pensamento a Deus ou anunciar o começo de uma missa. Enfim, ouvir o badalo de um sino é lembrar de fazer uma pausa e conversar com Deus.
Na igreja matriz da paróquia em Guarapari os sinos tocam às 6h, 9h, 12h, 15h e 18h, e, ainda segundo o pároco a duração é de 1 minuto.
O morador de Guarapari que fez a denúncia ao Ministério Público do Espírito Santo (MPES) não quis se identificar ou gravar entrevista, mas, em conversa com a reportagem da TV Gazeta, explicou que a reclamação feita por ele não é diretamente direcionada à igreja ou ao padre Diego Carvalho, mas à Secretaria Municipal de Meio Ambiente.
Segundo o morador, o que ele quer saber é como está sendo feita a fiscalização com relação à poluição sonora em Guarapari. Ele questiona se a secretaria está, de fato, autuando ou ao menos identificando quem produz ruídos de forma exagerada na cidade.
Em nota enviada na tarde desta quarta-feira (17), a Prefeitura de Guarapari informou que o denunciante, antes de procurar o MPES, esteve na Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Agricultura (Semag) e "foi orientado de que não havia impedimento do funcionamento do sino na legislação municipal, uma vez que se trata de uma manifestação religiosa".
De acordo com a administração municipal, ainda assim o morador procurou o Ministério Público do Espírito Santo para fazer a denúncia. "Vale ressaltar que em momento algum o reclamante manifestou insatisfação com o serviço prestado pelo município. Guarapari possui o serviço de disque-silêncio que funciona 24h. Quem observar alguma irregularidade, deve ligar para o número (27) 99905-6397", afirmou a prefeitura.
Após a publicação desta matéria, a reportagem da TV Gazeta conversou com o morador que fez a denúncia ao Ministério Público do Espírito Santo (MPES), e a Prefeitura de Guarapari se posicionou sobre o assunto. O texto foi atualizado.
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