Aos 37 anos, Dorotea Maria Scocco começou a jornada em busca de uma formação profissional. Era 1997 quando ela decidiu cursar Designer de Interiores, que naquela época se chamava Decoração de Ambientes e era um curso técnico. Tempos depois, já com 53 anos, optou por fazer uma graduação, em Design de Produto. E não parou por aí. Atualmente, aos 63 anos, é aluna de Publicidade e Propaganda na Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes).
Dorotea é só um exemplo de que não há idade para aprender. Ela é uma das 22.438 pessoas com mais de 40 anos que frequentam o ensino superior no Espírito Santo, de acordo com os últimos dados divulgados pelo Censo da Educação Superior do Ministério da Educação (MEC), em 2021. O número representa 13,2% das matrículas nas redes pública e privada do Estado.
Em um ambiente majoritariamente frequentado por jovens, o aumento da presença desses "veteranos" costuma servir de inspiração. Mas nem sempre. Também há casos de discriminação. Em um vídeo que viralizou nas redes sociais, três estudantes de uma universidade de Bauru, no interior de São Paulo, apareceram hostilizando uma colega pelo fato de ter mais de 40 anos. A situação abriu discussões sobre o etarismo, o preconceito por conta da idade.
“Esse preconceito, eu nunca senti. Tenho bom relacionamento com meus colegas, mas eu entendo que é da idade e também da busca no país que a gente vive pela juventude eterna. Tudo o que é jovem é ovacionado o tempo todo. Então, fica nas pessoas mais velhas a sensação que o seu tempo passou. Acham que não se encaixam na sala de aula, acham que não vão dar conta", observa Dorotea.
No caso ocorrido em Bauru, após o deboche cometido contra a estudante de mais de 40 anos, as três alunas desistiram do curso de Biomedicina. Mas, dependendo do caso, a prática do "etarismo" pode resultar em uma ação por danos morais, de acordo com a advogada especialista em Direitos Humanos e Segurança Pública Verônica Bezerra.
“É importante registrar um boletim de ocorrência e ingressar com uma ação civil de dano moral. A depender do julgamento, pode ser arbitrada uma indenização”, explicou a advogada.
Verônica ainda destaca que a situação se agrava se a vítima tiver mais de 65 anos. Nesse caso, o autor poderá ter de responder a processo com base no Estatuto do Idoso.
Mestranda de História na Ufes, Maria Aparecida Stelzer Lozório, 53 anos, admite que, de vez em quando, sente uns olhares de "estranheza" a sua presença na universidade.
Nada que abale Maria Aparecia. Depois de se formar aos 39 anos, ela seguiu adiante nos estudos. Hoje é bibliotecária, restauradora autônoma e assistente de educação infantil em meio período. E se desdobra para conciliar o trabalho e a vida domiciliar com a rotina acadêmica.
“No momento, meu pai está com problemas de saúde e estou cuidando dele. Mesmo assim, sempre busco um jeito de estudar. Sempre li dentro de ônibus. Quando estou na escola e as crianças pequenas dormem, aproveito para ler. Sempre presto muita atenção na aula e anoto tudo. Meus textos nunca saem da bolsa”, relata.
Entre os 4.521 alunos na faixa acima dos 40 anos da Multivix está Luiz Macena. Aos 72 anos, o funcionário público federal busca realizar um sonho que tinha desde jovem: cursar Psicologia.
“Eu sempre tive um sonho de estudar Psicologia. Mas não surgiu oportunidade e acabei optando por fazer Direito. Agora estou realizando esse sonho da juventude. Essa é a minha vitória. Não vejo a idade como obstáculo para estudar”, disse.
Para a advogada Verônica Bezerra, a dedicação de Dorotea, Maria Aparecida, Luiz e outros quarentões, cinquentões e até setentões aos estudos deveria ser aproveitada no dia a dia acadêmico pelos mais jovens.
"Uma parte da juventude ignora que todas essas pessoas têm uma história de vida e uma maturidade que pode agregar nos estudos e na troca de conhecimento”, destaca.
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