Absurdo, perigoso e assustador. É assim que alguns passageiros do Sistema Transcol descrevem o dia a dia de quem precisa encarar ônibus e terminais lotados durante o período de enfrentamento à pandemia do novo coronavírus na Grande Vitória.
O medo tem fundamento. A quarta fase do inquérito sorológico da Secretaria de Estado da Saúde (Sesa) apontou que 29,1% dos capixabas que testaram positivo passaram mais de 30 minutos dentro dos ônibus, onde quase nunca é possível respeitar a distância mínima de um metro, recomendada pela Organização Mundial da Saúde (OMS).
Com as aulas presenciais suspensas e as restrições ao modo de funcionamento do comércio adotadas no início da pandemia, o governo do Estado reduziu a circulação para 1.100 veículos. Em março, quando ainda circulava 100% da frota, eram cerca de 1.300 ônibus.
Segundo a Companhia Estadual de Transportes Coletivos de Passageiros do Estado do Espírito Santo (Ceturb-ES), o número de passageiros que usam o sistema por dia caiu de 600 mil para 260 mil e a quantidade de viagens realizadas nos horários de pico foram reduzidas em 90%.
Para evitar aglomeração, o secretário de Estado de Mobilidade e Infraestrutura (Semobi), Fábio Damasceno, chegou a recomendar que os usuários do Transcol aguardem um ônibus vazio para garantir o distanciamento. A declaração foi dada em entrevista ao Bom Dia Espírito Santo, da TV Gazeta, em maio. Mas os usuários afirmam que, com a redução da frota, os veículos estão sempre cheios. Vídeos gravados por eles mostram lotação em ônibus e terminais.
Na opinião do jardineiro José Priezo de Souza, de 59 anos, o atual modelo do sistema está prejudicando a população. Segundo ele, os ônibus estão ainda mais lotados nos períodos que são considerados por ele horários de pico: às 7h e às 18h.
A pandemia mudou a rotina de toda a família dele. Casado, o jardineiro que mora no bairro Oriente, em Cariacica, é pai de duas meninas, de 7 e 4 anos. Por volta das 4h40, ele embarca no ônibus 544 que faz a linha Terminal de Carapina - Terminal de Itacibá e segue para o trabalho em um condomínio na Rodovia do Contorno, na Serra.
Para voltar, ele segue até o Terminal de Carapina e embarca no 504 (Terminal de Jacaraípe - Terminal de Itacibá). A mulher dele trabalha como doméstica. Por medo do contágio no trajeto de ônibus ao trabalho, desde o início do coronavírus no Estado, ela dorme no serviço durante a semana e volta para casa às sextas-feiras. As filhas ficam com os avós enquanto os pais trabalham.
No relato do José, um ponto que chama a atenção é a falta do Equipamento de Proteção Individual (EPI). Em uma reunião entre o Ministério Público e a Secretária de Estado de Mobilidade Urbana e Infraestrutura (Semobi) ficou definido que a entrada nos terminais só seria possível se o usuário estivesse usando máscara.
O encontro também resultou na definição de que nenhum passageiro poderia seguir viagem em pé, os ônibus deveriam transitar com um número máximo de pessoas e nos terminais o distanciamento social de 1,5 metro seria fiscalizado.
Para a servidora pública Patrícia Azevedo nada disso está funcionando. Moradora de Jacaraípe, na Serra, todas as manhãs ela embarca no ônibus 806 que faz a linha até o Terminal de Jacaraípe. De lá, usa o 875 e segue até o Terminal de Laranjeiras.
Érica Portes, de 40 anos, mora em Santa Luzia, em Cariacica Sede, e trabalha em Vitória como auxiliar de almoxarifado. Na saída de casa, tem ao menos quatro opções de ônibus até o Terminal de Itacibá, no mesmo município.
A viagem dura cerca de 40 minutos. De lá, segue pelo 504 ou o 500, que passam na Avenida Vitória, já na Capital. Ela é taxativa: manter qualquer distanciamento social dentro dos ônibus ou nos terminais já não era possível antes da Covid-19, quando toda a frota estava em circulação.
Na bolsa, máscaras reservas e álcool em gel. A que ela usa no rosto é trocada a cada três horas. O medo de ser infectada pelo novo coronavírus fez a assistente administrativo Juliana dos Santos Guimarães, de 33 anos, dobrar os cuidados com a saúde durante a rotina. Ela conta que no Transcol a sensação foi multiplicada.
Juliana mora em Coqueiral de Itaparica, Vila Velha, e sai de casa às 8h. Do bairro, pega o 606 para o Terminal de Vila Velha. De lá, tem opção de embarcar em outras três linhas (507, 501, 541) que passam na Reta da Penha, em Vitória. Ela trabalha na Praia do Canto, também na Capital.
Evito pegar ônibus cheio, e sento do lado da janela. Às vezes, se o ônibus está vazio, mas vejo que não tem lugar ao lado da janela, nem entro. Quando estou na fila do Terminal de Vila Velha, faço o máximo para manter a distância de 1,5 metro, mas não tem muita saída já que o terminal fica lotado em horário de pico. No ônibus é praticamente impossível manter esse distanciamento, reclama.
Questionada sobre a quantidade de linhas que sofreram alteração, a Companhia Estadual de Transporte Coletivo de Passageiros (Ceturb-ES) informou somente que está realizando 90% das viagens nos horários de pico. Confira a nota na íntegra:
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