O Congresso Nacional está analisando um projeto que prevê a criação do chamado "passaporte da imunidade", que pode ser concedido às pessoas que tiverem recebido a vacina contra a Covid-19. De posse do documento, os imunizados teriam livre circulação pelo país. A proposta foi aprovada no Senado e, agora, está em análise na Câmara Federal. Contudo, não há um consenso entorno da medida.
Pelo projeto, o passaporte poderá ser usado pelos Estados para suspender ou abrandar medidas restritivas de locomoção, ou de acesso de pessoas a locais, públicos ou privados, que tenham sido adotadas com o objetivo de limitar a propagação do Sars-Cov-2 (coronavírus).
A proposta prevê, por exemplo, que o passaporte poderá ser usado para autorizar a entrada em locais e eventos públicos; o ingresso em hotéis, cruzeiros, parques e reservas naturais; entre outras possibilidades. O documento seria implementado em plataforma digital, a ser operada pela União em coordenação com Estados, Distrito Federal e municípios e com os serviços privados de saúde credenciados.
Para o vice-presidente Hamilton Mourão, entretanto, a medida não vai funcionar no Brasil. "Cada um terá de andar com um cartãozinho na carteira dizendo que foi vacinado. O cara na entrada do restaurante vai me cobrar isso? E no parque? Isso aqui é Brasil, pelo amor de Deus! Vai ter falsificação do passaporte, venda no camelô. Você vai à Central do Brasil, no Rio, e vai comprar o passaporte para você", declarou, em entrevista ao podcast "A Malu tá On."
O projeto foi inspirado em uma estratégia que vai começar a vigorar no próximo mês na União Europeia, onde, para a circulação por países que compõem o bloco, as pessoas deverão apresentar um documento comprovando a imunização. A ideia é que os cidadãos imunizados possam se deslocar sem necessidade de novos testes ou quarentenas pelos 27 países do bloco.
No Brasil, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) disse que vai vetar o projeto, caso seja aprovado pela Câmara, porque obrigaria as pessoas a se vacinar. Para o presidente, contrariando as autoridades sanitárias, os cidadãos devem ter livre escolha para se imunizar. O eventual veto, entretanto, pode ser derrubado pelos parlamentares.
Independentemente do debate político, há uma discussão sobre a efetividade da medida. Para o imunologista e professor da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes), Daniel de Oliveira Gomes, a criação de um "passaporte" para circulação no país não deverá apresentar resultados práticos para barrar a disseminação da Covid-19.
Daniel Gomes cita um exemplo simples, como uma viagem rodoviária em que um motorista pode escapar de uma barreira sanitária por estradas vicinais. "Na Europa, o controle é baseado na incidência da infecção nos países da União Europeia. Eles são classificados por cores. Se for bandeira verde, o indivíduo tem livre circulação sem precisar fazer nenhuma quarentena obrigatória. E lá as pessoas realmente cumprem a quarentena, quando preciso", compara.
Para o especialista, o "passaporte" pode ser mais efetivo em viagens internacionais, como o certificado de vacinação que já é exigido para outras doenças a exemplo da febre-amarela. "Agora, para usar no país, sobretudo no Brasil com essas dimensões, é praticamente impossível funcionar", opina.
Vale ressaltar ainda que a vacina não impede a infecção pelo coronavírus, mas reduz a incidência de casos graves e morte. Além disso, mesmo imunizada, a pessoa pode se infectar e transmitir para outra, não vacinada, e esta sim pode evoluir para um quadro mais crítico da doença.
Por essa e outras razões, Daniel Gomes defende que, em vez de passaporte, discuta-se a implementação de testagem em massa na população, medida que seria capaz de identificar, isolar e tratar os casos positivos de Covid-19, impedindo efetivamente a circulação do vírus.
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