“Decisões de perseguição a veículos de criminosos precisam ser tomadas com cautela porque podem expor inocentes a risco." A avaliação é feita por José Vicente da Silva Filho, coronel reformado da Polícia Militar de São Paulo e ex-secretário nacional de Segurança Pública. Ele acrescenta que, em algumas situações, a opção é deixar o criminoso fugir para garantir a segurança da população que estará no local do confronto.
“Não se faz uma perseguição policial por qualquer motivo, não se pode querer prender a qualquer custo, são regras básicas. E tiro tem que ser em uma situação controlada, quando iminente, com garantias de que não atingirá inocentes e, inclusive, de que não vai provocar tiros dos criminosos que também podem atingir inocentes”, explica Silva Filho, que é também conselheiro da Escola de Segurança Multidimensional da Universidade de São Paulo (USP).
Nesta segunda-feira (28), ocorreu mais um confronto na Avenida Leitão da Silva, em Vitória, entre a Guarda Municipal e criminosos, após perseguição pelas ruas da cidade. Dos quatro criminosos que estavam no veículo perseguido, um foi morto, dois baleados, sendo que um acabou sendo preso, e um quarto está foragido. Um homem que passava pela região acabou sendo ferido por tiro na perna. Houve desespero entre os que transitavam pelo local. O carro de um advogado foi alvejado, assim como paredes de lojas e prédios da região.
Na avaliação de Silva Filho, uma alternativa para evitar a perseguição era substituí-la por um cerco policial nas vias da cidade.
Silva Filho ressalta que comandou um batalhão em São Paulo e brincava com os policiais. "Deixa o bandido engordar que a gente o pega depois. A preocupação do policial é evitar ações que possam oferecer riscos a inocentes, sempre. A polícia tem muitas informações de inteligência e pode prender o bandido depois."
Ele relata que em São Paulo, onde atuou, a orientação é não atirar com veículo em movimento. “Nunca, porque você não tem precisão. E nem mesmo em situações como nos filmes, atirar em pneus de carro do bandido. O veículo pode tombar e atingir inocentes", explica.
Silva Filho destaca ainda que, ao contrário dos policiais, os criminosos não têm nenhuma restrição para atirar. “Por isso, quando se criou uma situação desordenada, em meio a uma perseguição, eles criaram também uma situação de levar alto grau de risco às pessoas que estavam à volta. O que poderia ter sido evitado desde o início com o acionamento da PM para fazer o cerco e não fazer perseguição."
O momento agora, segundo Silva Filho, é de todos se reunirem para uma avaliação do que aconteceu. “A Polícia Militar e a Guarda Municipal têm que avaliar procedimentos operacionais”, sugere.
Para Henrique Herkenhoff, professor do Mestrado de Segurança Pública da UVV, colunista de A Gazeta sobre violência urbana e criminalidade, é preciso uma análise sobre o crescimento do número de confrontos policiais a partir de 2018. “Houve um aumento de 1.500% em apenas cinco anos."
Levantamento feito pelo professor mostra que, em 2018, foram registradas 34 ocorrências, que aumentaram nos anos seguintes, chegando a 150 em 2020, um aumento de 441%. “Como não bastasse, o secretário de Segurança afirma que já foram 203 confrontos apenas nos cinco primeiros meses de 2023, o que sugere que um número próximo de 500 trocas de tiros em ações policiais ao final deste ano. Um aumento em torno de 1.500% em apenas cinco anos”, relata em artigo publicado em A Gazeta.
Um ponto importante, observa Herkenhoff, é que estes confrontos são mais frequentes nas comunidades periféricas, que convivem rotineiramente com a troca de tiros.
“O que apavorou as pessoas é que o confronto ocorreu na parte baixa da cidade, mas isto é quase o cotidiano de algumas áreas mais carentes e precisa ser repensado. A política de confronto, esta maneira de ver a segurança, aumenta risco para policiais, no aspecto físico e jurídico, e aumenta o risco para a população. O modo de trabalhar das forças policiais, porque isto é uma escolha do alto comando, precisa ser avaliado, repensado se justifica os riscos assumidos. Vamos continuar com esta política de confronto?”, questiona.
Há pelo menos sete anos a Avenida Leitão da Silva tem sido palco de episódios como o desta segunda-feira (28), alguns com vítimas. Foi o que ocorreu na madrugada do dia 25 de junho, durante confronto com a polícia, e após uma sequência de disparos na região do bairro Gurigica, terminou com uma parede de hospital perfurada e um paciente, um idoso de 68 anos que estava internado no local, atingido e morto. Nesta segunda, uma pessoa que estava na avenida também foi atingida na perna.
Herkenhoff assinala que as alternativas para agir, em situações como estas, passam pelo planejamento. “Planejar para agir, com abordagens planejadas. E se o criminoso tiver alerta, você espera, se não tiver urgência, até uma hora que ele caia e você o pegue. Ao invés de ter confronto, usa-se a investigação e a inteligência, acompanha os alvos, o que leva a um número menor de prisões, mas de pessoas mais relevantes, troca pela qualidade do preso, ao invés de entupir o cárcere."
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