A suspensão da aplicação da vacina contra a Covid-19, produzida pela AstraZeneca, nas mulheres gestantes do Espírito Santo, anunciada na última terça-feira (11) provocou questionamentos sobre as informações contidas nas bulas dos imunizantes.
A medida foi adotada pelo governo do Estado após recomendação da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). "A medida veio após uma suspeita de evento adverso grave de acidente vascular cerebral hemorrágico ocorrido e que resultou em óbito fetal e da gestante", informou a Agência, por nota enviada à imprensa.
A doutora em Epidemiologia e professora do Departamento de Enfermagem da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes), Ethel Maciel, disse que o procedimento da Anvisa é algo comum em pesquisa clínica.
"Quando você começa a dar vacina ou medicamento para muitas pessoas, alguns eventos que não foram observados nos ensaios clínicos podem aparecer. Chamamos isso de fase quatro, estudo pós-marketing, e acontece com todos os medicamentos e vacinas quando entram no mercado. Agora, precisamos observar os eventos que podem acontecer pós-vacina e se avaliar se isso fará com que seja necessário mudar a bula", orientou.
O imunologista, professor e pesquisador da Ufes, Daniel Oliveira Gomes, afirma que com a suspensão da aplicação, a Anvisa inicia a fase de estudos e investigações na tentativa de identificar a causa da morte notificada na última segunda-feira (10).
Ainda na terça-feira (11), a Secretaria de Estado da Saúde (Sesa) anunciou que as grávidas capixabas ainda não vacinadas vão receber doses da Pfizer. Quem já tomou a primeira dose e não apresentou nenhuma reação adversa grave, poderá receber a segunda dose, caso os estudos da Anvisa liberem a aplicação. O intervalo entre as doses é de três meses.
Mas, afinal, o que dizem as bulas das vacinas usadas no Brasil com relação à dosagem nas mulheres gestantes e em estado de amamentação? A Gazeta conversou com especialistas em saúde sobre as recomendações contidas nos documentos. Confira:
Sobre as indicações da bula para as vacinas não serem usadas em grávidas sem orientação médica, Daniel Oliveira Gomes ressaltou que isso aconteceu porque os imunizantes não foram testados em mulheres gestantes nas fases de experimentos clínicos.
"Com relação à contraindicação da vacina da AstraZeneca e da Coronavac na gravidez, é justamente pelo fato delas não terem sido testadas naquela fase de testes clínicos tipo 1, tipo 2, tipo 3. Mas isso não quer dizer que a vacina vá fazer mal a esse grupo. Já tivemos uma série de grávidas vacinadas no país todo e nenhuma delas apresentou problemas relacionados à vacina", frisou.
Se as bulas não recomendam o uso das vacinas sem o devido acompanhamento médico, por que elas foram aprovadas e distribuídas no Brasil? A Anvisa respondeu que a prática é conhecida como uso off-label (do inglês, fora do rótulo) das vacinas, quando a indicação de uso difere do que consta na bula.
"Ou seja, em situações não previstas na bula, só deve ser feito mediante avaliação individual por um profissional de saúde que considere os riscos e benefícios da vacina para a paciente", explicou a Anvisa, por nota.
"O uso off-label enquadra em situações que o benefício é muito maior que o risco. A Covid tem sido implacável no grupo de gestantes, com aumento significativo do número de óbitos de gestantes, principalmente, durante a segunda onda, e isso justifica a utilização das vacinas nesse grupo, principalmente, pautado na segurança que elas apresentaram em todos os casos até o momento. Não teve ninguém no planeta Terra que tenha morrido em virtude da vacina. Esse uso off-label acaba sendo bastante importante", destacou.
A prática de usar a vacina fora das indicações da bula do medicamento também foi adotada na Inglaterra com a AstraZeneca, reforçou o imunologista.
"Eles não tiveram nenhum problema relacionado, principalmente, dessa natureza de morte, tampouco de toxicidade ou efeito colateral fora dos padrões que se espera de uma vacina normal. As vacinas, até o momento, tem se mostrado muito seguras, inclusive para grávidas. Na fase experimental, elas foram testadas em cobaias grávidas ou lactantes e não mostraram nenhum efeito ou problemas nesses animais", informou o imunologista e professor.
Um estudo preliminar coordenado por cientistas do Centro de Controle de Doenças (CDC, na sigla em inglês) dos Estados Unidos apontou que as vacinas da Pfizer e da Moderna contra a Covid-19 não apresentam riscos a mulheres grávidas. A pesquisa foi publicada no dia 21 de abril no "New England Journal of Medicine", uma das revistas científicas mais importantes do mundo.
Após analisar 35.691 mulheres grávidas com idades entre 16 e 54 anos, os cientistas do CDC concluíram que "os achados preliminares não mostraram sinais de segurança óbvios entre as gestantes que receberam vacinas".
"Além de a vacinação proteger as mulheres contra Covid-19 e suas complicações durante a gravidez, evidências vêm mostrando a transferência pela placenta de anticorpos contra o Sars-CoV-2 após a vacinação durante o terceiro trimestre, o que sugere que a vacinação materna pode fornecer algum nível de proteção ao recém-nascido", avaliaram os pesquisadores.
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