Vinte mortes. Pessoas desaparecidas. Famílias desabrigadas. Casas alagadas até o segundo andar. Gente pedindo socorro com a água no pescoço. As fortes chuvas que atingiram cidades do Sul do Espírito Santo entre a noite de sexta-feira e sábado (dias 22 e 23) e deixaram um rastro de destruição foram resultados de fenômenos, que devem se tornar mais frequentes. A onda de calor dos últimos dias pode ser uma das culpadas pela tragédia.
O aviso de grande perigo dado pelo Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet), apontando para o risco de tempestades no Sul do Espírito Santo, concretizou-se de forma mais severa que o esperado. O alerta vermelho emitido pelo órgão, desde quarta-feira (20), previa chuvas superiores a 60 mm/h ou 100mm/dia, além de ventos acima de 100 km/h até o domingo (24). Porém, em uma noite, o Estado recebeu mais que o dobro do previsto de chuva para todo o mês de março. O resultado foi trágico, principalmente em Mimoso do Sul e Apiacá, com um rastro de destruição e mortes.
Em Mimoso, segundo o Centro Nacional de Monitoramento e Alerta de Desastres Naturais (Cemaden), o acumulado de chuvas chegou aos 231.80 mm entre sexta e sábado. Já em Apiacá, segundo o Climatempo, a cidade já recebeu 284 mm no decorrer do mês de março, o que representa 184% da média normal para o mês.
Enquanto isso, Bom Jesus do Norte foi o município capixaba com o maior registro: 304.20 mm, resultando em 80% da cidade com danos estruturais, rompimento de estradas e 3 mil pessoas fora de casa.
Mas qual é a explicação para esse o volume de chuva tão acima do esperado? A Gazeta ouviu especialistas para entender o fenômeno meteorológico que atingiu o Sul do Estado.
O meteorologista Ivaniel Fôro, do Instituto Capixaba de Pesquisa, Assistência Técnica e Extensão Rural (Incaper), lembra que, nos dias anteriores à chuva forte, o Estado foi acometido por uma onda de calor acima do normal, o que favoreceu a formação de nuvens. A situação ficou propícia a fortes chuvas por que essa massa de ar quente se encontrou com uma massa de ar fria, provocando as tempestades.
“Acontece que uma frente fria vinda do Rio de Janeiro provocou mudanças nas condições do tempo. Com a chegada dessa massa de ar de vento mais frio, a chuva se alimentou na região montanhosa do Estado, formou mais nuvens. Assim, chegamos a esse volume de chuva acima do normal”, explica Ivaniel.
O meteorologista destaca que a característica geográfica do Estado também favorece à formação de chuvas fortes. “No Espírito Santo, temos um fator que contribui muito para esse fenômeno, que é a existência de uma região serrana muito próxima ao mar. Então, os ventos costeiros empurram a umidade do litoral contra as altas temperaturas que estão dentro do continente. Isso é combustível para a formação de nuvens de tempestade”, complementa Ivaniel.
De acordo com ele, em pouco mais de 24 horas, a Região Sul do Espírito Santo recebeu a média de chuva que era esperada para todo o mês.
Ivaniel ainda alerta que o Estado deve se preparar para lidar com fenômenos extremos desse tipo, daqui para a frente.
“Essas chuvas vão se tornar cada vez mais frequentes ao longo dos anos, devido ao cenário de mudanças climáticas e de temperaturas cada vez mais acima da média. Já são raros os anos que não temos eventos que causam esse impacto”, aponta.
Diante dos estragos das chuvas, o governador Renato Casagrande (PSB) disse que "a previsão do tempo falhou". Segundo Casagrande, em entrevista à Rádio CBN Vitória, o maior volume de chuva estava previsto para o Rio de Janeiro e não para o Espírito Santo.
"[...] Aqui, que a previsão era de 100 mm a 120 mm e choveu 300 mm. Em uma chuva de até 150 mm, nossas cidades estão preparadas para suportá-las, mas, passando disso, a estrutura não dá conta efetivamente", disse o governador.
Para diminuir os impactos dessas tempestades, Luiz Fernando Schettino, ambientalista e doutor em Ciência Florestal, aponta para a necessidade de estudos voltados para a melhor drenagem das águas pluviais em cidades acometidas pelas fortes chuvas.
“É necessário que nós tenhamos uma estrutura mais robusta de monitoramento climático no Espírito Santo. Seria ideal que cada município tivesse um grupo de especialistas que pudesse atuar na previsão dessas chuvas e prevenção dos impactos”, diz Schettino.
“O que aconteceu em Mimoso do Sul é uma verdadeira catástrofe. Se a cidade tivesse um esquema de drenagem eficiente, os impactos seriam menores. Enquanto no Espírito Santo houver aterro desordenado e intervenções que atrapalhem o melhor caminho para o escoamento das águas, vamos continuar nos preparando para cenários onde as condições, que já eram ruins, vão se tornar ainda piores”, observa Schettino.
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