A soltura sem fiança de Uanderson Elias Delfino, de 37 anos, em Colatina, Noroeste do Espírito Santo, repercutiu nas redes sociais e gerou dúvidas em muitas pessoas. Afinal, por que a Justiça concedeu liberdade provisória a um motorista que foi autuado por ingerir bebida alcoólica e se envolveu em um acidente que resultou na morte de pai e filha? Em entrevista ao Bom dia Espírito Santo, da TV Gazeta, o advogado e pós-doutor em Criminologia Raphael Boldt explicou quais são os procedimentos adotados em um caso como esse.
Nas redes sociais, foram muitos os comentários sobre a decisão da Justiça. “Infelizmente, essa é a nossa realidade”, disse um leitor de A Gazeta. “Uma atitude dessa só serve para que as pessoas continuem bebendo e pegando a direção de um veículo”, escreveu outra leitora.
Questionado pela reportagem da TV Gazeta, se a decisão não teria sido adequada, Boldt explicou que, mesmo sendo difícil analisar um caso concreto sem ter acesso aos autos, a lei prevê a dispensa da fiança nos casos em que o acusado não tenha condições de pagá-la.
“É difícil analisar um caso concreto sem ter acesso aos autos. É sempre uma questão complicada. Mas, aparentemente, a decisão não foi incorreta, porque a própria lei, nosso Código de Processo Penal prevê que em alguns casos é possível dispensar a fiança, nos casos de hipossuficiência do acusado, do indiciado. Existem dois fatores que determinam a fiança: a condição financeira do réu, do indiciado ou suspeito e a gravidade do crime. Então é possível que a fiança não seja paga”, afirmou.
Na decisão de soltura de Uanderson Elias Delfino, expedida na segunda-feira (19), o magistrado André Guasti Motta, ressaltou que o valor da fiança arbitrada mesmo sendo reduzido pela metade, não foi recolhido, e que o Código Processual Penal, dita, em seu artigo 350, que "nos crimes em que couber fiança, se for verificado pelo Juiz que o réu não possui condições de prestá-la, poderá conceder-lhe a liberdade provisória, mediante a imposição de outras obrigações".
Sobre uma eventual falta de punição, já que o motorista teve a liberdade provisória concedida sem pagar fiança, Boldt explica que há outras medidas cautelares a serem adotadas, para além do valor pago.
“Ele não paga fiança, mas continua vinculado ao processo, através de outras medidas cautelares. O juiz estabelece que ele fique vinculado ao processo e depois ele pode ser condenado. A única diferença é que não houve o pagamento de fiança, mas há a aplicação de outras medidas de natureza cautelar”, ressaltou.
No caso de Delfino, o magistrado determinou as seguintes medidas cautelares:
a) comparecer mensalmente, até o quinto dia útil, perante este juízo, para informar e justificar suas atividades; b) comparecer perante este Juízo, todas as vezes que for intimado para atos da instrução criminal e para o julgamento; c) não mudar de residência, sem prévia permissão deste Juízo, ou se ausentar por mais de 8 (oito) dias de sua residência, sem comunicar nestes autos o lugar onde será encontrado; d) proibição de acesso ou frequência em bares, boates ou qualquer outro estabelecimento ou lugar que por circunstâncias relacionadas ao fato em apuração, possa levar o acusado a cometer novas infrações.
Delfino já havia sido preso em 27 de agosto de 2018 por beber, dirigir e causar um acidente, mas foi liberado quatro dias depois, de acordo com a Secretaria de Estado da Justiça (Sejus). Sobre isso, Boldt ressaltou que um processo anterior não reflete no atual.
“A regra no Brasil, em tese deveria ser assim, é a liberdade. Responde-se a um processo em liberdade exceto nos casos de uma eventual prisão preventiva. Se não estiverem presentes os fundamentos da prisão preventiva, ele fica em liberdade. O fato de ter um processo anterior ou ter cometido um crime anteriormente não vai refletir nesse caso. A gente não sabe se transitou em julgado, se já é efetivamente reincidente. Mas, aparentemente, não haveria nenhum tipo de influência, de repercussão”, disse.
O acidente ocorreu na ES 080, quando as vítimas chegavam em casa na comunidade de Santo Antônio de Mutum, no interior de Colatina. Na noite de quinta-feira (1º), o carro conduzido por Delfino bateu de frente com a motocicleta em que estavam José Idalino Neppel e Maria Karoline Neppel. Em uma curva, Delfino se deparou com a motoneta, que estava sendo conduzida por Maria, com o pai na garupa. O motorista perdeu o controle do carro e caiu em uma ribanceira.
A motoneta ficou caída no local ao lado do corpo da condutora. O pai dela chegou a ser socorrido pelo Corpo de Bombeiros, mas morreu ao chegar ao pronto-socorro. Delfino foi levado para o Hospital Estadual Sílvio Avidos. Após liberado, ele foi encaminhado para a Delegacia Regional de Colatina e preso em flagrante, uma vez que foi comprovada a ingestão de bebida alcoólica no teste do etilômetro, segundo a Polícia Militar.
*Com informações de Gabriela Martins, da TV Gazeta
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