A Prefeitura de Vila Velha rescindiu o contrato de cerca de dois mil professores em Designação Temporária (DT) da rede municipal neste mês de dezembro. O desligamento pegou os trabalhadores de surpresa na terça-feira (27) e gerou insatisfação entre educadores, que apontam problemas na dispensa.
Além disso, no mesmo dia, a Secretaria Municipal de Educação (Semed) abriu nova seleção para contratar profissionais temporários para atender a rede de ensino da cidade. Regras desse processo seletivo também são questionadas.
A "demissão em massa", como tem sido chamada a rescisão do contrato de DTs por educadores, teria incluído até mesmo profissionais com menos de um ano de atividade. Segundo eles relatam, a dispensa está com data de 23 de dezembro, no entanto alguns professores, desavisados, teriam permanecido após esse dia nas escolas. Por essa razão, reivindicam o pagamento dos dias trabalhados após o encerramento do contrato.
"Todo ano, nosso contrato é feito com duração de três anos. Na gestão do Arnaldinho (Borgo), os professores entraram de férias no dia 22 de dezembro e nós, coordenadores e pedagogos, teríamos que trabalhar até dia 30. Quando chegou dia 27, ficamos sabendo que ele havia rescindido o contrato de todos os DTs, com a data de 23 de dezembro, sendo que os coordenadores e pedagogos trabalham até dia 30. Não podemos trabalhar de graça esses cinco dias", afirma uma coordenadora de escola, que pediu para não se identificar.
A Prefeitura de Vila Velha afirma que a rescisão do contrato está dentro da legalidade e acrescenta que, nos últimos dois anos, a Secretaria de Educação investiu em profissionais efetivos. No período, conforme a administração municipal, 1.167 profissionais foram efetivados.
Outro alvo de críticas é o processo seletivo aberto pelo município que não estaria em conformidade com a Lei de Diretrizes e Bases (LDB) da Educação. A seleção prevê que profissionais com titulações diferentes recebam a mesma remuneração — um professor apenas com graduação teria o mesmo salário de um profissional com doutorado, por exemplo, o que contraria a legislação voltada à valorização do magistério.
"O prefeito criou um processo seletivo em que o salário não daria nem R$ 1.600. As pessoas que têm doutorado, mestrado, pós-graduação não iriam receber pelo título, e sim o valor de graduado, que é inferior. Eu, por exemplo, tenho mestrado e acho isso injusto. É contra a lei", comenta a coordenadora.
Na avaliação de Douglas Ferrari, professor do Centro de Educação da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes), a remuneração linear seria um desestímulo à qualificação.
"Imagine um professor com doutorado e o graduado ganhando a mesma coisa. Então, a pessoa pensa ‘não vou fazer mestrado, doutorado… Por que vou fazer especialização?’. Desestimula a formação continuada do docente. E isso sempre foi um diferencial na hora da escolha dos profissionais. Quando iguala, você diz que não precisa continuar se qualificando. Além disso, há o desincentivo do salário, pois também acabam se igualando", analisa.
O prazo de contrato de DTs é indeterminado, mas, em Vila Velha, segundo uma coordenadora da escola, tem vigência de três anos. Mas alguns profissionais, com menos tempo, foram dispensados nesta semana. "Colegas que começaram em junho deste ano foram mandadas embora. Outras que estão grávidas, que vão ganhar o neném daqui a poucos meses, foram mandadas embora, o que também não pode."
Ildebrando Paranhos, do Sindicato dos Trabalhadores da Educação Pública do Espírito Santo (Sindiupes), conta que a entidade está avaliando se, pela legislação trabalhista, a prefeitura poderia fazer a dispensa dos cerca de dois mil educadores — número estimado a que tiveram acesso — e, particularmente, analisando a legalidade do processo seletivo no ponto que trata sobre a titulação.
"O edital está com divergências em relação à LDB. O Sindiupes está analisando juridicamente a possibilidade de recursos", afirma Paranhos.
Procurada, a Prefeitura de Vila Velha respondeu a alguns dos questionamentos por nota. Esclareceu que não houve demissão, mas, sim, rescisão dos contratos de DTs.
"Isso não é uma anomalia administrativa e não afetará as aulas no ano que vem. Como o próprio nome diz, o contrato é regido por um prazo determinado de 12 meses. E, de acordo com a Lei n° 035/2015, o contrato pode ser rescindido a qualquer tempo, por interesse da administração", diz um trecho da nota.
Sobre as gestantes, a prefeitura nega a dispensa. "As seis grávidas terão seus contratos preservados, até o final da licença maternidade, como prevê a legislação atual. Falar ao contrário disso é tentativa de disseminar pânico em quem é protegido por lei."
A administração municipal ressalta, ainda na nota, que durante o período mais crítico da pandemia de Covid-19 optou por renovar os contratos de DTs para não deixar nenhum profissional desassistido. Nos últimos dois anos, entretanto, a Secretaria de Educação (Semed) investiu em profissionais efetivos e 1.167 foram efetivados.
"Por isso, também, a necessidade atual de rescindir com os temporários, já que a prioridade devem ser os concursados. Para 2023, novos processos de seleções simplificadas estão com inscrições abertas, no site da prefeitura. São na modalidade cadastro de reserva, para que em caso de necessidade sejam selecionados profissionais da educação básica, integral, especial, além do quadro administrativo, melhorando assim a qualidade de ensino", diz a prefeitura.
Em relação à titulação dos profissionais que vão participar da seleção, a prefeitura afirma que cada caso será analisado pela Semed durante o processo.
A administração encerra a nota ressaltando que Vila Velha é a cidade com o melhor Ideb da Grande Vitória. "Resultado alcançado pela atual gestão graças ao planejamento e aos investimentos em melhoria na qualidade de ensino, que passam pela busca dos melhores profissionais, a modernização de infraestrutura, qualificação e incentivo do magistério, que passou neste ano do pior ao melhor salário do Espírito Santo, e chega ao aluno que agora é prioridade no projeto de tornar a cidade com a melhor qualidade de ensino do Estado."
No entanto, a administração não respondeu sobre o número exato de profissionais que tiveram o contrato rescindido, pagamento dos dias trabalhados após o encerramento do contrato e se é possível garantir que o quadro de educadores estará completo no retorno das aulas em 2023. Caso as informações sejam repassadas, este texto será atualizado.
Notou alguma informação incorreta no conteúdo de A Gazeta? Nos ajude a corrigir o mais rapido possível! Clique no botão ao lado e envie sua mensagem
Envie sua sugestão, comentário ou crítica diretamente aos editores de A Gazeta