Escolas sem banheiro interno, sem biblioteca, sem vistoria do Corpo de Bombeiros, sem ligação com o sistema de esgotamento sanitário. A falta de infraestrutura é um problema que atinge unidades de ensino em todo o Espírito Santo, nas redes municipais e estadual, comprometendo a qualidade de ensino. A oferta de vagas é também um gargalo na gestão educacional, conforme apontou um levantamento do Tribunal de Contas do Estado (TCE).
O órgão notificou os 78 municípios capixabas e também a Secretaria de Estado da Educação (Sedu) para assinarem um Termo de Ajustamento de Gestão (TAG) diante de irregularidades identificadas em unidades de ensino e distorções na oferta vagas. Conforme os problemas constatados, as prefeituras e o governo do Estado vão ter um prazo para melhorar as escolas.
O TAG, segundo o conselheiro do TCE Rodrigo Coelho, é um instrumento que visa a dar aos gestores a possibilidade de solução do problema, antes de uma sanção. A assinatura do TAG é por adesão, mas os que não quiserem se submeter ao ajustamento continuam sujeitos à fiscalização do tribunal e a eventuais punições, como multas, nos casos em que for identificada a persistência de irregularidades. Apenas três prefeituras — São Gabriel da Palha, Nova Venécia e Pinheiros — informaram que não vão assinar. Portanto, 75 se comprometeram a cumprir o termo, que tem quatro focos prioritários:
Para eliminar a concorrência, o TAG estabelece que os municípios serão os responsáveis por toda a oferta do ensino fundamental I, do 1º ao 5º ano. Para tanto, deverão abrir, até o fim de 2023, as matrículas para o ano letivo de 2024.
Atualmente, o Estado faz o atendimento dos anos iniciais em 39 cidades. Dessas, a Serra é a que tem a maior demanda assistida pela rede estadual, com 5.810 matrículas; e Santa Maria de Jetibá, a maior participação percentual, com 1.325 alunos (23%).
A prefeitura de Santa Maria de Jetibá já manifestou ao TCE a intenção de assinar o TAG e, questionada sobre os planos para assumir totalmente os anos iniciais do ensino fundamental, respondeu em nota que será um grande desafio para o município cumprir os termos propostos, ainda que haja a contrapartida da Sedu e um envolvimento amplo da população, em audiências públicas, para tratar a temática.
"A Secretaria de Educação de Santa Maria de Jetibá está tentando uma agenda com a Sedu, por meio da Superintendência Regional de Educação (SRE) de Afonso Cláudio, desde o retorno às aulas para tratar do assunto, sem sucesso até a presente data", diz a prefeitura em outro trecho da nota, acrescentando que a rede municipal dispõe hoje de 4.205 alunos matriculados.
Na Serra, o secretário de Obras, Halpher Luiggi, ressaltou que o município está fazendo um grande esforço para absorver o máximo de alunos possível até 2024. Atualmente, 23 unidades de ensino estão passando por reforma ou ampliação, medida que, até o início do próximo ano, criará 100 novas salas de aula que poderão atender a cerca de 5 mil alunos. Mas não serão apenas para o ensino fundamental I. Contemplam ainda a educação infantil e o fundamental II.
Contudo, acrescentou Halpher Luiggi, até o final de 2024 deverão ser entregues 14 novas unidades de ensino, com capacidade de receber de 8 mil a 10 mil alunos — a depender do regime de funcionamento, que será definido pela Secretaria Municipal da Educação. "Com isso, a gente entende que, se não absorver a totalidade, uma grande parte será atendida no próximo ano." A Serra tem, na rede municipal, quase 70 mil estudantes.
Ainda sobre a eliminação da concorrência, Estado e municípios vão precisar entrar em consenso, até março de 2024, sobre de quem será a responsabilidade pelos anos finais do ensino fundamental, do 6º ao 9º ano, e até dezembro, as metas de oferta exclusiva. Isso significa dizer que, em cada cidade, as vagas do segundo ciclo do fundamental ou serão da rede municipal ou da estadual. A partir de 2025 não deverá mais haver oferta conjunta nesta etapa de ensino.
O segundo ponto de atenção indicado pelo TAG é o reordenamento nas redes municipais e estadual. O TCE constatou, conforme apontou o conselheiro Rodrigo Coelho, que muitas vezes há ociosidade de vagas, sendo necessário fazer uma otimização de oferta e demanda. O plano de ação deve ser apresentado até o final do próximo ano.
Ainda nesse quesito, eventuais obras de construção, reforma ou ampliação de unidades de ensino deverão observar o plano de reordenamento, bem como as diretrizes de infraestrutura mínima necessária estabelecidas em lei. Em 41 escolas da rede municipal de 16 cidades do Espírito Santo, por exemplo, não há banheiro na área interna para atendimento da comunidade escolar.
Infraestrutura das redes (2.580 escolas - ano de referência 2020)
Para as obras, o TAG não definiu um prazo. As intervenções serão realizadas conforme o planejamento de rede de cada município.
Para a escolha dos diretores de escola, as redes continuarão a ter autonomia, mas vão precisar apresentar, até o final deste ano, os parâmetros mínimos exigidos para a escolha do servidor que vai desempenhar a função. O termo de ajustamento prevê que os critérios devem ser objetivos, impessoais e contemplar competências e habilidades necessárias para desempenho das atribuições. Uma das exigências será a participação em curso de formação em gestão escolar. A ideia, ressaltou Rodrigo Coelho, é acabar com o alto índice de indicações, sem impessoalidade, que alcançam cerca de 70% dos cargos de direção.
Por fim, a câmara de compensação é um instrumento que municípios e Estado poderão adotar para os casos em que profissionais efetivos da Educação ocupem cadeiras em duas redes. Se as administrações quiserem, poderão apresentar um projeto, para aprovação do Legislativo, de modo a autorizar a cessão dos educadores para que atuem apenas em uma rede, conforme interesse da administração e se o profissional assim desejar.
Dos 78 municípios capixabas, apenas três informaram ao Tribunal de Contas que não pretendem assinar o TAG.
Em nota, a assessoria da Prefeitura de Pinheiros frisou que a realidade do interior do Estado difere dos grandes municípios.
"O TAG iria impor a Pinheiros a assunção de responsabilidades que trariam grande custo ao município, como o custeio de prédios públicos, escolas principalmente do campo, aumento de gastos com pessoal, que hoje são de responsabilidade do Estado, onerando as despesas do município, como já ocorreu no passado, em que foram assumidas escolas sem condições para tanto, ficando o governo municipal à mercê de recursos estaduais e federais para o apoio", justificou.
A administração, em outro ponto da nota, acrescentou: "Ao contrário dos grandes municípios, com altíssimas arrecadações capazes de assumir grandes responsabilidades, o pequeno município de Pinheiros entendeu não ser adequado, neste momento, trazer para si tais questões que exigem um planejamento maior, sob pena de prejudicar o ensino que já vem sendo prestado com regularidade."
Os municípios de Nova Venécia e São Gabriel da Palha foram procurados, por meio da assessoria de imprensa, mas não responderam os questionamentos. Também foi procurada a União dos Dirigentes Municipais de Ensino do Espírito Santo (Undime) para se manifestar sobre o TAG, porém não houve retorno.
A Sedu foi questionada sobre diversos pontos relacionados à rede estadual e respondeu em nota, sem detalhes. "A Secretaria da Educação (Sedu) afirma que o TAG trata essencialmente da reorganização da rede pública de ensino, o que não influencia diretamente no enfrentamento dos desafios apontados. Explica que o TAG propõe uma racionalização da oferta de ensino na rede pública, e que terá como desdobramento a alocação dos recursos de modo mais racional e, portanto, mais eficiente."
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