O Espírito Santo pode passar de 8 mil para 9 mil mortos pelo novo coronavírus em menos de duas semanas, segundo as projeções do Núcleo Interinstitucional de Estudos Epidemiológicos junto ao Instituto Jones dos Santos Neves (IJSN). Pelas análises, se de 7 mil óbitos para 8 mil foram necessários apenas 16 dias, a perspectiva é de que a marca de 9 mil mortes seja atingida em um intervalo ainda menor. Ou seja, o avanço no número de óbitos poderá atingir a mais alta velocidade desde o início da pandemia.
Os números partem de análise dos dados dispostos pelo Núcleo Interinstitucional de Estudos Epidemiológicos junto ao Instituto Jones dos Santos Neves (IJSN). De acordo com o diretor-presidente do IJSN, Pablo Lira, a alavancada na média móvel de óbitos levou ao mais alto patamar desde o início da pandemia, tendo registrado, no Estado, 56,29 mortes diárias nos últimos 14 dias.
De acordo com Lira, o número de óbitos continua crescendo em ritmo intenso tanto no interior quanto na Grande Vitória. "A situação é de fato preocupante. Apesar disso, nesta semana já está sendo percebida uma desaceleração suave da demanda pelos recursos de saúde, também como resultado da quarentena preventiva decretada pelo governo", disse.
Em números absolutos, no entanto, no mês de março atingiu-se o recorde de óbitos, com o registro de 1.123 mortes, segundo o Painel Covid-19, atualizado pela Secretaria de Estado da Saúde (Sesa). "Ocorre que, apenas em abril, com dados de hoje (09), já atingimos 503 óbitos. Tudo indica que teremos um mês de abril muito difícil, principalmente se considerarmos o cenário nacional. O Brasil é o atual epicentro da Covid-19 no mundo", destacou.
Para Lira, a adoção da estratégia da quarentena preventiva, com a suspensão de diversas atividades, foi uma medida acertada. Com o final desse período no início de abril e com o retorno do mapa de risco, observou-se que a situação dos municípios foi, na maioria, de risco alto ou extremo. Com o fim das medidas mais rígidas, a tendência é começar a perceber resultados mais efetivos nas próximas semanas, por exemplo com a diminuição da pressão sobre o sistema de saúde.
Segundo o especialista, contribuem para a estratégia de gestão da pandemia no Espírito Santo a ampliação dos leitos, a adoção de medidas restritivas já realizada, a gestão do mapa de risco e a vacinação.
"A partir da segunda quinzena de abril a gente começará a ver, nos grupos etários mais elevados, um resultado da vacinação. A imunização já cobriu em torno de 11% da população capixaba, superior à média nacional de 10%. Dependemos também de um ritmo mais acelerado, já que para superar a pandemia de forma efetiva dependemos do ritmo da vacinação no Brasil. O Espírito Santo vem cumprindo o seu dever, e na relação do percentual de doses recebidas e das aplicadas, estamos entre os primeiros na efetividade da vacinação", acrescentou Pablo Lira.
Em entrevista à rádio CBN Vitória nessa sexta-feira (09), Pablo Lira afirmou que um dos fatores determinantes para o aumento de casos e mortes pelo coronavírus é que uma parte significativa da população não respeita os cuidados recomendados. O uso da máscara, capaz de salvar vidas, é negligenciado.
"Não dá para abrir mão da máscara. Também vimos muitas pessoas jovens, principalmente no carnaval, promovendo aglomerações. Outro fator que influencia a aceleração é o aumento sazonal das síndromes respiratórias, isso sem falar nos efeitos das variantes já presentes, sendo que no ES há predomínio da variante inglesa, cujo epicentro é no litoral sul, em Piúma, e no noroeste, em Barra de São Francisco. Outra questão a pontuar é que no Brasil não foram fechados aeroportos e rodovias", afirmou o diretor-presidente do IJSN.
Segundo ele, todas as unidades da federação estão tentando ampliar o distanciamento e ampliar leitos. No caso capixaba, a adoção da quarentena preventiva não contou com o distanciamento ideal, mas já começou a surtir efeito.
Para Lira, as microrregiões capixabas que hoje mais preocupam com a ascensão dos casos e mortes pela Covid-19 são:
A microrregião que inclui Colatina preocupa por ter atingido a taxa de transmissão, índice que diz o quanto a doença tem se espalhado entre as pessoas, de 1,92 (como se um infectado pudesse passar o vírus para praticamente duas pessoas).
Apresentou taxa de transmissão de 1,88, que indica crescimento no ritmo de propagação do vírus. O ideal é que esta taxa seja sempre menor que 1, para então haver desaceleração de casos.
Um dos fatores é justamente que a localidade é um dos epicentros da variante inglesa no Estado, além disso, a taxa de transmissão tem crescido ao longo das últimas semanas, chegando a 1,87. A microrregião ultrapassa o índice do Estado, que é de 1,5.
A região onde estão localizados municípios como Barra de São Francisco e Nova Venécia, também palcos da variante inglesa do coronavírus, tem taxa de transmissão de 1,63, sendo que tem se mantido acima de 1 nas últimas cinco semanas.
Região em que fazem parte cidades como Conceição da Barra e São Mateus, o nordeste do Estado apresenta 1,62 de taxa de transmissão do vírus, levemente inferior à segunda semana de março.
Na mais otimista das previsões, o também doutor em geografia Pablo Lira afirma que o mês de maio pode ser de estabilização nos casos e talvez até diminuição. Mas ainda não é momento para comemorar e correr para o abraço: devemos manter a cautela, pois o momento é crítico.
"O mês de abril será mais crítico do que março, porém começamos a ver uma diminuição na espera de pacientes no sistema de saúde. Se nas próximas semanas vermos uma desaceleração do contágio, podemos criar alguma expectativa de que a partir de maio conseguiremos uma certa estabilização nos casos confirmados e talvez redução, bem como desaceleração dos óbitos. Além disso, a quarentena preventiva tende a surtir um efeito em abril mais perceptível e, somado a isso, tendemos a observar os efeitos da vacinação nas faixas etárias mais elevadas. Mas não é mesmo o momento de abandonar os protocolos", ponderou Lira.
Na quinta-feira (08), o Brasil registrou 4.190 mortes pela Covid-19, sendo que a média móvel do país, nos últimos 7 dias, está próxima de 3 mil óbitos diários.
"Se pararmos para pensar que as doenças cardiovasculares, que têm histórico de maior causa de morte, leva três dias para matar 3 mil pessoas, que o câncer leva cinco dias para matar esta mesma quantidade e que a violência, fator de risco considerável no país, leva 19 dias para matar 3 mil pessoas, perder mais do que isso para a Covid por dia é assustador. E quatro mil vidas, atingem pelo menos quatro mil famílias que perdem familiares. A título de comparação, um avião comercial transporta entre 150 a 180 passageiros, seria como se caíssem 23 aviões comerciais por dia e morressem todos os passageiros", refletiu o especialista.
Sempre em debate, as consequências econômicas da pandemia têm sido enfrentadas de forma diferente do ano passado. "Há uma mobilização maior para mitigar os efeitos na economia, ao exemplo do cartão 'ES Solidário', da importância do trabalho de assistência social e de Direitos Humanos, o retorno do auxílio emergencial por exemplo em municípios como a Serra, que vai garantir R$ 150 mensais aos mais vulneráveis. Não existe dicotomia entre preservar vidas e mitigar os efeitos da pandemia na economia", concluiu.
Antes do recorde mais recente de mil mortes registradas em 16 dias, quando o Estado passou dos 8 mil óbitos, o menor intervalo de tempo havia ocorrido durante o primeiro pico da pandemia, no meio do ano passado, quando foram necessários 29 dias para a quantidade de vidas perdidas sair de 1 mil (em junho) para 2 mil (em julho). Desde então, mil novas mortes nunca tinham sido acumuladas em menos de 40 dias.
Para a contagem, A Gazeta considerou que a pandemia no Espírito Santo teve início no dia 5 de março de 2020, com a confirmação do primeiro caso pelo Ministério da Saúde. Sendo assim, o Estado chegou a mil óbitos no 100º dia e a 8 mil no 400º dia – sinal claro do agravamento.
Diretor do Instituto Jones dos Santos Neves, o pesquisador Pablo Lira explica que a piora se deve a quatro principais fatores: a sazonalidade das doenças respiratórias, as aglomerações mais frequentes, a menor adesão às medidas de distanciamento social e as novas variantes — como a inglesa, que já se mostrou mais contagiosa e letal.
• 1 mil mortes: em 13 de junho, com 100 dias de pandemia
• 2 mil mortes: em 12 de julho, com mais 29 dias
• 3 mil mortes: em 21 de agosto, com mais 40 dias
• 4 mil mortes: em 15 de novembro, com mais 86 dias
• 5 mil mortes: em 29 de dezembro, com mais 44 dias
• 6 mil mortes: em 8 de fevereiro, com mais 41 dias
• 7 mil mortes: em 23 de março, com mais 44 dias
• 8 mil mortes: em 8 de abril, com mais 16 dias de pandemia
De acordo com a epidemiologista Ethel Maciel, a pandemia vai se agravar nas próximas semanas e o mês de abril pode terminar como o mais mortal de todo o período. "Pelos números que temos, devemos chegar a 130 óbitos por dia, antes de melhorar", afirma. A redução deve ocorrer só a partir de maio.
A primeira morte por Covid-19 no Estado foi confirmada no dia 2 de abril de 2020, em um homem de 57 anos. De lá para cá, a doença avançou de tal forma que ficou impossível individualizar todas as perdas. Morreram idosos, médicos, policiais, indígenas, capixabas saudáveis, padres, bebês e até mãe e filha, no intervalo de um dia.
Junto dessas 8 mil dores e saudades, o Espírito Santo também tem acumulado outros recordes: na última segunda-feira (5), o Estado chegou a mais de 900 pessoas internadas em leitos de UTI, que lutam para sobreviver; e na terça-feira (6), registrou 110 novos óbitos em apenas 24 horas.
Notou alguma informação incorreta no conteúdo de A Gazeta? Nos ajude a corrigir o mais rapido possível! Clique no botão ao lado e envie sua mensagem
Envie sua sugestão, comentário ou crítica diretamente aos editores de A Gazeta