Tradicionalmente realizado uma semana antes do início da folia nos sambódromos do país, o desfile das escolas de samba de Vitória é conhecido por abrir o carnaval no Brasil. Se não fosse a pandemia do novo coronavírus que impediu o evento no Sambão do Povo, nesta quarta-feira (10) seria definida a grande campeã capixaba.
Mas o Carnaval de Vitória nem sempre foi o primeiro do país. A pesquisadora de carnavais e comentarista de desfiles de escolas de samba Iamara Nascimento explicou que essa tradição começou em 1998, depois de cinco anos sem a folia na Capital. O retorno dos desfiles aconteceu sem seu palco principal, o Sambão do Povo, que, segundo Iamara, não estava em condições de receber a festa.
"O fato do nosso carnaval acontecer uma semana antes é maravilhoso! Temos tempo para curtir dois carnavais. Essa ideia veio em 1998, com a volta dos desfiles das escolas de samba e estamos aí até hoje, o carnaval do Brasil começa aqui. Nós ficamos de 1992 até 1997 sem ter carnaval, sem ter desfile das escolas de samba. Quando chegou em 1998, o então prefeito Luiz Paulo (Vellozo Lucas) resolveu colocar as escolas na rua, só que foi na Avenida Jerônimo Monteiro, porque o Sambão do Povo não estava em condições. Nós ficamos desfilando de 1998 a 2001 sem ter concurso e não eram todas as escolas, eram apenas algumas", explicou.
A partir de 2002, as escolas de samba retornaram ao Sambão do Povo e o concurso foi retomado para que a campeã do Carnaval de Vitória fosse coroada. Desde então, três agremiações têm dominado os títulos: Boa Vista, MUG e Unidos de Jucutuquara. Iamara lembrou que, no início do milênio, MUG e Jucutuquara dominaram os carnavais. A partir de 2010, porém, a Boa Vista entrou no páreo, o que, para a pesquisadora, foi uma surpresa.
"Nos anos 2000 era a dobradinha Jucutuquara e MUG. A Jucutuquara alcançou o tetra campeonato em 2006, 2007, 2008 e 2009, com excelentes carnavais. Em 2010, quando todo mundo pensava que continuaria a disputa entre Jucutuquara e MUG, quem ganhou o carnaval foi a Boa Vista, com o tema ‘Nem Tudo que Reluz é Ouro’. Foi uma surpresa para todo mundo, porque a Boa Vista é uma escola de Cariacica, era mais simples e ganhou o carnaval de 2010. E aí começa a era da segunda década do milênio. Jucutuquara sai do páreo e a dobradinha fica entre Boa Vista e MUG", destacou a pesquisadora.
O Carnaval de Vitória é um dos mais tradicionais e, de acordo com Iamara, já foi um dos maiores do Brasil. Dentre as principais lembranças, a pesquisadora citou o retorno das escolas de samba ao Sambão do Povo, em 2002, que coroou a Jucutuquara como campeã. A história desse Carnaval, porém, começa um ano antes, ainda sem os concursos, com um samba-enredo curioso da Piedade.
"O interessante é que, em 2001, a Piedade fez um enredo que o samba era mais ou menos assim: ‘Vai chover, relampejar, a terra vai tremer, o bicho vai pegar. Ninguém vai contar história, hoje eu quero é sambar’. E a escola desfilou quase 10h da manhã, debaixo de um sol quente, ardendo, não caiu uma gota de chuva", relembrou a pesquisadora.
No ano seguinte, no retorno ao Sambão do Povo e com o primeiro campeonato de escolas de samba desde 1991, o pedido da Piedade foi atendido. Iamara contou que, no momento em que a escola entrou na avenida, uma chuva torrencial caiu sobre Vitória, o que não atrapalhou a festa. Mas o título ficou mesmo com a escola rival, que não teve a companhia da tempestade durante o desfile.
"Em 2002, o carnaval retorna ao Sambão do Povo. Aí a galera ficou eufórica, os sambistas ficaram numa euforia só. Na hora que a Piedade entrou na avenida, caiu foi muita água, muita água mesmo. Foi uma chuva torrencial. Enquanto estávamos na concentração, a chuva não tinha caído, estava se formando. Deu o sinal verde, veio o aguaceiro. Aí todo mundo falou ‘a Piedade pediu chuva em 2001, mas a chuva só resolveu descer mesmo em 2002’. No outro dia, a Jucutuquara desfilou e a chuva já estava mais calma", contou, se divertindo com a lembrança.
A Unidos da Piedade, inclusive, é a escola de samba mais vezes coroada campeã do Carnaval de Vitória. Iamara ressaltou, porém, que a agremiação enfrenta uma seca que já dura mais de 40 anos e não conquista um título desde 1986. Segundo a pesquisadora, a Piedade também registra outra marca negativa: nunca conseguiu ganhar um título no Sambão do Povo.
"O último carnaval que a Piedade foi campeã foi em 1986. A Piedade, que é a escola que tem mais títulos, que são 14, sendo dois pentacampeonatos, nunca conseguiu ganhar dentro do Sambão do Povo", disse.
Uma das mais tradicionais escolas de samba de Vitória, a Unidos de Jucutuquara enfrentou problemas em 2003 e acabou terminando na última colocação. No ano seguinte, porém, a agremiação superou o desfile ruim do ano anterior. Segundo Iamara, os carros alegóricos montados e as alas formadas foram revolucionárias, o que fez com que a escola conquistasse o título do Carnaval da Capital.
"No carnaval de 2004, a Jucutuquara revolucionou, com carros alegóricos, fantasias. Em 2003, ela fez um desfile que faltou carro, carro quebrou, teve problemas em alas e ela ficou em último lugar. No ano seguinte, ela fez um carnaval excelente que Vitória nunca tinha visto, com o tamanho dos carros alegóricos, acabamentos perfeitos e foi campeã", afirmou Iamara.
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