Ter acesso aos serviços de saúde é um direito de todo cidadão garantido na Constituição. Mas para alguns moradores da Grande Vitória, receber um atendimento completo com médico especialista para tratar doenças específicas ou fazer determinados exames pode se tornar uma saga que pode levar até cinco anos.
O morador da Serra Braz Ferreira da Silva, de 59 anos, é um dos que aguardam há anos por uma série de consultas e exames para cuidar de uma uma síndrome do túnel do carpo e de uma dor forte no pescoço que provoca dificuldade de movimentação e também redução da força nos braços e das mãos. Ele também sofre com dores no joelho.
Por conta dessas condições, aguarda por consulta com neurologista e ortopedista. E por indicação da cirurgia na coluna cervical, ele também já deu entrada no pedido de um exame chamado eletroneuromiografia, ainda em 2018, mas ainda não conseguiu realizar o procedimento. Segundo ele, o pedido de consulta para neurologista foi feito por uma reumatologista em 2019 por suspeita de doença dos neurônios motores. E em 2021 entrou com pedido de consulta com ortopedista.
Enquanto aguarda atendimento, recorre ao tratamento paliativo, com uso de diversos remédios, chegando a uma média de 20 comprimidos por dia. E também procurou durante esse período entrar em contato com a ouvidoria da Secretaria de Estado da Saúde (Sesa) para acompanhar a situação dos agendamentos.
"Tenho muito dificuldade de andar de ônibus em pé por falta de força para segurar. Tenho dor na coluna toda, mas o que me está incomodando mais é a coluna cervical. Estou sentindo choque no pescoço", relata.
A situação enfrentada por Braz é semelhante a de uma moradora de Santa Inês, em Vila Velha, também de 59 anos. Ele prefere não se identificar, mas conta que tem epilepsia refratária e fazia acompanhamento regular com neurologista de 2016 a 2020 pelo SUS.
Mas ela conta que o profissional que a acompanhava pediu demissão antes da sua próxima consulta em meados de 2020 e desde então não conseguiu mais acompanhamento com neurologista. Enquanto isso, sofre com as crises provocadas pela condição, que podem levar até ao desmaio, o que já ocorreu com ela duas vezes, inclusive na rua.
"Sou acompanhada pelo clínico do meu posto, que vem acompanhando o andamento da fila do SUS. Meu nome já saiu dessa fila e já voltou. De lá para cá nunca mais eu consegui ser atendida por um especialista", relata a moradora de Vila Velha, que também sofreu uma queda e aguarda consulta com ortopedista e marcação de um simples exame de raio-x. Por um problema da epilepsia, ela conta que chegou a perder uma consulta agendada, mas ainda não conseguiu novo horário.
Com dor de cabeça forte há alguns anos, a moradora de Jardim Marilândia, Vila Velha, Ângela Vieira, de 49 anos, recebeu indicação do posto de saúde de consulta com neurologista. Mas quando foi ao posto conferir a solicitação, recebeu a informação que foi encaminhado para a rede estadual. Ela chegou a ligar para um número indicado, mas não conseguiu informação. Depois disso tudo, conseguiu um encaminhamento há cerca de dois anos. "Eu cuido da minha mãe precisei para de trabalhar tá me afetando em tudo. E cansei de correr atrás e não conseguir nada".
E desde outubro de 2022 tem indicação de consulta com oftalmologista por risco de glaucoma, mas também não foi atendida. "Falaram que ligariam mas não ligaram. Fui no posto, peguei de novo o encaminhamento e o médico colocou urgente porque tenho glaucoma e meu pai ficou cego com 51 anos com glaucoma e nada ainda", detalha.
Na semana passada, A Gazeta contou a história de uma moradora de Jardim Camburi de 47 anos aguardava uma consulta com médico especialista para tratar hepatite C há quatro anos. Ela foi diagnosticada em 2011 e aguardava desde 2019 por uma consulta com hepatologista para tratar sua condição e conseguir acesso a medicamentos específicos para tratar a doença.
Após quatro anos de espera, ela conseguiu um agendamento de consulta nesta semana depois que a reportagem fez contato com a Prefeitura de Vitória para questionar sobre a demora.
Via de regra, para conseguir uma consulta com um médico especialista, é preciso passar pelo clínico geral em uma unidade de saúde do município onde o paciente reside. A partir da avaliação desse médico, o paciente é encaminhado para um médico especialista, consulta normalmente oferecida pela rede estadual.
Procurada pela reportagem, a Secretaria de Estado da Saúde (Sesa) informou que em 2022 foram realizadas pelo SUS capixaba mais de 650 mil consultas ambulatoriais especializadas, mas não informou quantos pacientes aguardam atendimento. As principais demandas são para as especialidades de ortopedia, oftalmologia, cardiologia e cirurgia geral.
Segundo a Sesa, para atender essas e outras demandas, várias ações foram implementadas, dentre elas, destaque para a nova contratualização com a rede filantrópica e a implementação da auto regulação formativa territorial. E destacou que o acesso à atenção ambulatorial e às cirurgias eletivas devem ser feitos pela Atenção Primária, por meio das Unidades Básicas de Saúde.
Em relação aos pacientes citados, a Sesa, por meio da Central de Regulação, informa que as solicitações de consultas em neurologia e ortopedista da moradora de Vila Velha de 59 anos estão inseridas no sistema estadual. "Os atendimentos estão sendo providenciados de acordo com o quadro clínico e disponibilidade de vagas nos prestadores de serviço".
A prefeitura de Vila Velha também foi questionada sobre a situação da moradora de Santa Inês e informou que os atendimentos com especialistas são de responsabilidade e regulados via Secretaria de Estado da Saúde. A prefeitura informou que a paciente aguarda consulta com neurologista desde o dia 18/03/2021 e foi classificada com prioridade amarela, autorizado procedimento pelo médico regulador, porém a consulta segue aguardando a data de agendamento por parte do Estado.
Já a consulta da paciente com o ortopedista foi agendada, porém a mesma não compareceu ao atendimento. Uma nova solicitação de consulta foi realizada, bem como solicitação de raio-x. "A equipe da Secretaria Municipal está em contato com a paciente para dar as informações sobre o caso".
Com relação à consulta em neurologia da paciente Angela, o pedido foi inserido e autorizado no sistema estadual no segundo semestre de 2021. A vaga está sendo providenciada de acordo com a disponibilidade de vagas da especialidade.
Sobre o paciente Braz, a Sesa informou, após contato da reportagem, que as consultas em reumatologia e ortopedia foram agendadas para os dias 23 de março e 03 de abril, respectivamente.
Com relação ao exame de eletroneuromiografia, a solicitação está inserida e autorizada no sistema estadual. "O atendimento está sendo providenciado e o paciente será contatado assim que o agendamento for realizado".
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