Mesmo após o Ministério da Educação (MEC) anunciar a suspensão do programa de fomento a escolas cívico-militares, nesta quarta-feira (12), prefeituras da Grande Vitória anunciaram que seis unidades de ensino vão continuar adotando o modelo. A orientação do governo federal era para iniciar a transição das escolas e o programa ser encerrado até o fim do ano letivo de 2023, com a retirada dos militares.
Em Cariacica, a decisão pela manutenção passa pela aprovação da população, uma vez que o projeto tem uma avaliação bastante positiva, segundo nota da Secretaria Municipal de Educação (Seme). O município oferece vagas em três escolas nessa modalidade, atendendo a um total de 1.990 alunos:
"A Seme ressalta que somente uma das três escolas da modalidade é regida pelo governo federal, portanto passará para a regência da secretaria. As outras duas já são de projetos próprios construídos pelo município em parceria com a Polícia Militar do Espírito Santo e o Corpo de Bombeiros Militar do Espírito Santo. O ano letivo segue normalmente para todos os alunos da rede", diz a nota.
Em Vila Velha, a Escola Ilha da Jussara, na região da Grande Terra Vermelha, atende 816 alunos do 5º ao 9º ano, por meio do programa federal, desde o ano passado. A intenção da administração municipal também é manter o modelo cívico-militar.
Segundo informações da Secretaria da Educação de Vila Velha, os militares apoiam a organização diária da escola, na formação de filas para entrada e entoação dos hinos Nacional e de Vila Velha uma vez por semana, recepcionando os alunos diariamente no portão. Também atuam, em contraturno, com projetos como banda marcial, horta escolar, xadrez e orientação de estudos, auxiliando nas atividades de alunos com dificuldades de aprendizagem.
Já em Viana, as duas unidades cívico-militares não integram o programa do MEC e são resultado de uma parceria com o governo do Estado. "Portanto, independentemente da decisão do governo federal, de quem a prefeitura não recebe recursos via Ministério da Educação, as instituições de ensino permanecerão funcionando normalmente com verba própria municipal", afirma o prefeito Wanderson Bueno, em nota enviada pela assessoria.
Inaugurada em outubro de 2020, a Escola João Natalício Alves Pereira, em Vila Bethânia, foi a primeira unidade cívico-militar a ser implementada no Espírito Santo. O espaço possui um bloco educacional com dois pavimentos e área esportiva coberta, com 577 alunos matriculados e 10 salas de aula, conforme dados repassados pela administração municipal.
A segunda escola cívico-militar da cidade é a Professora Divaneta Lessa de Moraes, em Campo Verde. Inaugurada em fevereiro de 2022, o espaço de ensino conta com 1.052 alunos matriculados e 22 salas de aula. A parceria da prefeitura com o governo do Estado para a implementação do projeto é por meio da disponibilização de policiais militares da reserva para atuarem nas unidades de ensino.
No site do programa, ainda constam escolas cívico-militares em Nova Venécia, São Gabriel da Palha, Sooretama, Montanha e Marataízes. A assessoria da prefeitura de Marataízes informou que houve a intenção de adotar o modelo, mas não chegou a ser implementado.
Em Sooretama, onde funciona a Escola Cívico-militar João Neves Pereira, no bairro Sayonara II, a prefeitura informou que, "como a resposta dos alunos e da comunidade foi positiva, refletindo no comportamento e atitudes dos alunos em ambiente escolar, o programa continuará sendo mantido pela administração municipal, e a escola continuará funcionando dessa forma".
A implantação da unidade começou em 2022, com as reestruturação do colégio para atender as exigências do programa. Mas, de acordo com a prefeitura, efetivamente, a presença dos policiais militares atuando na escola só ocorreu no início do ano letivo 2023.
O município informou que foi cadastrado no projeto do governo federal em 2021, fez todas as adaptações necessárias de infraestrutura para adotar o modelo, porém não recebeu nenhum repasse para que a unidade funcionasse. "Mesmo assim, a administração municipal assumiu os custos e resolveu colocar o programa em funcionamento", destaca a nota enviada, acrescentando que existe uma parceria com a PM para a cessão dos dois policiais que atuam no local, "sendo o próprio município que arca com o salário dos mesmos".
As demais administrações não responderam o contato feito pela reportagem.
Todos os municípios do Espírito Santo mencionados na lista dos que aderiram às escolas cívico-militares foram consultados sobre a diferença do modelo adotado nessas unidades em comparação às escolas tradicionais, o valor dos repasses do governo federal, outros apoios recebidos e a pretensão de expansão do modelo para outras unidades, mas não houve retorno quanto a esses questionamentos.
O MEC também foi questionado, entre outros pontos, sobre os motivos que levaram o órgão a tomar a decisão pela suspensão do programa. O ministério, entretanto, respondeu apenas confirmando a medida, mas sem dar qualquer detalhe.
No programa, militares da reserva, bem como PMs e bombeiros, atuam na administração da escola. Diferentemente das escolas puramente militares, totalmente geridas pelo Exército, nesse desenho as secretarias de Educação continuam responsáveis pelo currículo escolar, mas estudantes precisam usar fardas e seguir regras definidas por militares.
Um dos argumentos contra o modelo que o ministro da Educação, Camilo Santana, já havia apresentado ao Congresso Nacional, em outro momento, era que, além do fato de o modelo não estar alinhado com a política do governo, havia desvio de finalidade no uso de recursos para o pagamento de militares.
O programa havia sido implementado em setembro de 2019, primeiro ano do governo de Jair Bolsonaro. Até 2022 foram empenhados R$ 104 milhões no programa — essa é a primeira fase da execução orçamentária, quando há reserva do recurso. O valor pago de fato foi bem menor e soma apenas R$ 2,3 milhões entre 2019 e 2022. O governo atual deve decidir como vai honrar com os empenhos já registrados, visto que os valores empenhados vão para os chamados restos a pagar, e a obrigação de execução continua.
Mesmo representando uma parcela mínima das escolas públicas do país, em 2022 a verba prevista para o programa (R$ 64 milhões) era quase o dobro do valor estimado (R$ 33 milhões) para a implantação do Novo Ensino Médio.
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