Entre as muitas tradições de Natal, há um ponto em comum: a reunião das famílias. No entanto, para os sobreviventes e os familiares de mortos e feridos nos ataques às escolas de Aracruz, no Litoral Norte do Espírito Santo, neste ano, a data vem com o peso das perdas, do trauma e também de uma coincidência terrível. O dia 25 de dezembro marca exatamente um mês dos atentados a tiros que deixaram quatro mortos e 12 feridos, alguns deles gravemente.
A tragédia, que ainda vai ecoar por muitos anos, interrompeu vidas, sonhos e, obviamente, tradições das famílias nas festas de fim ano. Mesmo para quem sobreviveu aos atentados, cometidos por um adolescente de 16 anos, ex-aluno de uma das instituições de ensino atacadas, as reuniões familiares não vão ocorrer.
Uma das sobreviventes, a professora de História Sandra Regina Guimarães evita lembrar daquela manhã de sexta-feira, 25 de novembro. Ela conta que passa a maior parte do tempo na cama, por causa das lesões. “Durmo bem, não fico pensando nem lembrando do que aconteceu, mas ainda não vi o mundo lá fora. Por causa dos ferimentos, fico na cama. A esperança é que, em breve, eu consiga dobrar o joelho”, conta.
Ainda se recuperando, Sandra não vai poder passar a noite de Natal com o afilhado de 23 anos, uma tradição que cumpre há mais de duas décadas. “Sou muito apegada a ele e à família dele. Temos o hábito de comemorar o Natal desde quando ele nasceu. Minha família não faz ceia de Natal, então, a comida, as trocas de presente, a gente fazia juntos”, relata a professora.
A professora teme que a recuperação física não seja acompanhada pela melhora do quadro psicológico. “Quando eu for para a cadeira de rodas e voltar ao mundo lá fora, pode ser que isso mude”, disse ela, que tem o acompanhamento de um psicólogo.
Uma das últimas feridas a deixar o hospital, a professora de inglês Degina Rodolfo de Oliveira Fernandes comentou sobre a possibilidade de se reunir com a família nas festas de fim de ano ao sair do Jayme Santos Neves, na Serra, no dia 16 de dezembro.
"Quando me disseram que eu tinha a possibilidade de passar o Natal em casa, não acreditei. Fiquei muito ansiosa. Passaram os dias e eu estava na enfermaria, até que a possibilidade virou realidade e me deram alta. Estava com muita saudade da minha família, dos meus filhos", disse ao g1ES, ao deixar a unidade. Ela recebeu cinco tiros durante o ataque, que atingiram pernas, abdômen, quadril e tórax.
Marido de Degina, o técnico mecânico Leandro Fernandes limitou-se a dizer que a família está "bem, graças a Deus". Juntos, eles têm um casal de filhos gêmeos de 7 anos e um bebê de nove meses.
Ao todo, sete feridos foram hospitalizados após o ataque. Um dia após a alta de Degina, no dia 17 de dezembro, dois seguiam internados: uma professora de 51 anos estava em um hospital estadual na Grande Vitória e a aluna Thais Pessotti da Silva, de 14 anos, baleada na cabeça, seguia internada em uma unidade particular. A partir desse dia, não houve mais atualização do estado de saúde das vítimas por parte da Secretaria de Estado da Saúde, a pedido das famílias.
Quem perdeu entes queridos na tragédia terá que enfrentar a ausência todos os dias do ano, o que se torna mais difícil em datas tão marcadas por reuniões familiares. “Sem clima para comemorações”, afirma Tamiris Fanttini Sagrillo, tia de Selena Sagrillo, que tinha apenas 12 anos.
“A família não vai se reunir, o que era tradição. Estamos todos muito tristes e tentando seguir a vida, mas ainda é muito difícil.” Mesmo nos dias antes do Natal, as comemorações da família já eram em clima de tristeza. Recentemente, durante o aniversário da prima, Selena foi lembrada em um momento de oração. “Ela estava sempre presente nos aniversários”, lembra.
No dia 25 de novembro, um ataque a duas escolas deixou quatro mortos e outros 12 feridos em Aracruz, no Norte do Espírito Santo. A investigação apontou que o ataque foi planejado por dois anos e por um assassino de 16 anos que estudou até junho no colégio estadual, um dos alvos. O criminoso usou duas armas do pai, um policial militar.
Os disparos aconteceram por volta das 9h30 na Escola Estadual Primo Bitti e no Centro Educacional Praia de Coqueiral, escola particular que fica na mesma via, em Praia de Coqueiral, a 22 km do centro do município.
Segundo a Secretaria de Segurança Pública, o assassino invadiu a escola estadual com uma pistola e fez vários disparos assim que entrou no estabelecimento de ensino. Depois, foi até a sala dos professores e fez novos disparos. Na unidade, duas professoras foram mortas.
Na sequência, o atirador deixou o local em um carro e seguiu para a escola particular Centro Educacional Praia de Coqueiral, que fica na região. Na unidade, uma aluna foi morta. Após o segundo ataque, o assassino fugiu em um carro. Ele foi apreendido ainda na tarde de sexta.
O autor dos ataques foi julgado pela Vara da Infância e Juventude de Aracruz e ficará internado por três anos. A sentença é o tempo máximo de medida socioeducativa estabelecido em lei para menores de idade. Ele ainda precisará passar por avaliação judicial a cada seis meses. A sentença foi divulgada no dia 7 de dezembro.
* Com informações do g1ES
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