Após denúncias de que um caminho de pedras, que era percorrido por escravizados há cerca de 200 anos, havia sido cimentado no Parque Municipal Gruta da Onça, no Centro de Vitória, a prefeitura suspendeu as obras. A trilha é classificada como um sítio arqueológico e qualquer intervenção na área precisa de anuência do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan). Agora, a retomada do serviço somente vai acontecer após a manifestação do órgão.
A prefeitura foi notificada pelo Ministério Público do Espírito Santo (MPES) para prestar informações sobre o caso e o Iphan também iniciou uma investigação a partir da denúncia de descaracterização do sítio arqueológico, mas o secretário municipal de Obras, Gustavo Perin de Medeiros, disse que a decisão de paralisar a pavimentação foi por iniciativa da própria administração e que não houve determinação de outro órgão.
Gustavo Perin afirmou que, quando a atual gestão assumiu a prefeitura, 70% da obra já havia sido executada. De 1,1 mil metros de rampas, escadarias e degraus de drenagem, 750 metros estavam prontos. Para tanto, observou o secretário, já existia a licença de instalação.
A continuação da intervenção no parque não foi realizada logo no início da atual gestão, segundo Gustavo Perin, por falta de recursos. Após conseguir a dotação orçamentária, o projeto de recuperação foi retomado em julho. Desde então, foram executados mais 30 metros de pavimentação.
O secretário ressaltou que as equipes técnicas da prefeitura tinham conhecimento do sítio arqueológico na Gruta da Onça, mas consideravam que o projeto já tinha a anuência do Iphan, visto que a licença para a execução da obra havia sido concedida.
"Nossa surpresa foi tanta com a denúncia que nos debruçamos sobre o projeto e convidamos o Iphan para uma visita técnica ao local, e decidimos suspender a obra", pontuou Gustavo Perin.
O secretário assegurou que o sítio arqueológico está preservado, mas que a administração vai aguardar um posicionamento do Iphan para as orientações sobre como proceder e restabelecer a obra. Questionado sobre a notificação do MPES, Gustavo Perin falou que, a partir de uma reunião com o instituto, prevista para esta terça-feira (9), será possível prestar as informações sobre os procedimentos que serão adotados.
Há pouco mais de quatro anos, o arqueólogo Henrique Antônio Valadares Costa fez a identificação de três sítios arqueológicos no parque - chafariz e aqueduto da Capixaba; o caminho antigo da Gruta da Onça; e o sítio Paulo Soca - e solicitou o cadastro no Iphan que, ao validar a identificação das áreas, passou a ter propriedade sobre esses espaços. Ao tomar conhecimento da obra, Henrique fez a denúncia ao instituto.
Os sítios arqueológicos - definição para espaços alterados pela ação humana no passado (não há uma data-limite no Brasil) - são considerados patrimônios porque são um registro da história de um lugar, da sociedade.
O caminho antigo da Gruta da Onça, cujo calçamento usava a técnica pé-de-moleque, com justaposição de pedras, apresentava em seu traçado e estrutura características que remetiam ao período do Brasil Colônia. O trajeto era usado para fazer a ligação da sede da fazenda do Barão de Monjardim, em Jucutuquara, até o Centro. Além disso, segundo Henrique Valadares, também contribuía para a manutenção da drenagem.
Para Edson Valpassos, professor e biólogo, a obra de restauração no parque descaracterizou não só o caminho antigo, com impacto histórico e cultural, mas também tem intervenções, como o prédio de três pavimentos no meio da mata, que não são harmônicas com a unidade de conservação ambiental.
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