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Aposentados no ES estão mais endividados e inadimplentes. Entenda o motivo

Aposentados no ES estão mais endividados e inadimplentes. Entenda o motivo

Endividamento com crédito consignado e inflação fez aposentados partirem para os empréstimos sem consignação e gastos com cartão de crédito

Publicado em 26 de setembro de 2022 às 07:44

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O número de aposentados e pensionistas inadimplentes tem crescido no Espírito Santo. Com parte da renda já comprometida com empréstimos consignados, em meio a um cenário de inflação, essa faixa etária tem recorrido ao cartão de crédito e a empréstimos pessoais com juros mais altos.

Como o crédito consignado desconta diretamente da aposentadoria o valor das parcelas, uma parte da renda já está comprometida antes mesmo de o dinheiro chegar à conta do consumidor, dificultando a quitação de outras dívidas. Dados do Painel de Operações de Crédito, do Banco Central, mostram que até junho deste ano o índice de aposentados com faturadas atrasadas do cartão de crédito e de empréstimos não consignados cresceram.

O empréstimo pessoal, diferentemente, é aquele dinheiro concedido por uma instituição bancária ou financeira, às vezes contrato por aplicativos. Em alguns casos, pode ser obtido por qualquer pessoa, até para as negativadas, sendo usado para diversas finalidades.

PERIGOS DO NÃO CONSIGNADO

Doutor em Ciências Contábeis, o economista Felipe Storch Damasceno explica que ao ter tantas dívidas, inclusive as que cobraram diretamente no salário, o aposentado superendividado pode acabar pagando as contas mais urgentes, não honrando as demais dívidas.

Na avaliação de Damasceno, a inflação na pandemia de Covid-19 encareceu bens para todos os brasileiros, muito deles indispensáveis na vida dos aposentados: aluguel, alimentos, combustíveis e medicamentos. “A inflação elevou o gasto mensal, mas a renda não acompanhou. Em alguns casos, a pessoa que já tem quase metade dos vencimentos comprometidos com um empréstimo consignado, acaba recorrendo a uma dívida no cartão de crédito e, em alguns casos, pegando dinheiro com as financeiras”, avalia.

O economista destaca que os juros do consignado são mais baixos por trazer menos riscos às instituições financeiras. Antes de o consumidor receber o pagamento, o instituto de Previdência desconta as parcelas devidas e faz o pagamento direito ao banco credor.

“Mas quando falamos de créditos pessoais e cartão de crédito, se o dinheiro não dá, a conta que fica para trás é a da não sobrevivência, então o risco é maior e, se você está negativado, o risco é maior ainda, pois você já está enrolado”, completa.

Na visão do economista, é importante ter atenção com as financeiras que oferecem empréstimos para os negativados. “Elas não, necessariamente, estão ali para ajudar o tomador de empréstimo. Isso está precificado, é caro e a empresa vai cobrar os juros necessários”, destaca.

Damasceno salienta, por fim, que os juros no cartão de crédito estão em, 364% ao ano, os com crédito consignado entre 20 e 35% ao ano, enquanto os do não consignado também são altos, estão em média em 50% ao ano.

Sede do INSS
Sede do INSS. (Marcello Casal Jr. / Agência Brasil)

FUGINDO DE MAIS EMPRÉSTIMOS

O aposentado por tempo de contribuição, Octávio Paulo, de 75 anos, relata que fez um empréstimo para custear gastos com o advogado, em um processo que envolve uma de suas propriedades.

“Tenho um terreno grande em Cariacica e invadiram. Tive que chamar a polícia, fazer boletim de ocorrência e contratar um advogado. Tudo ficou em R$ 10 mil. Não tinha esse dinheiro, então precisei fazer um empréstimo consignado”, relata.

Com R$ 300 da aposentadoria usados diretamente para pagar o empréstimo, Octávio Paulo afirma que tem medo de tentar crédito não consignado e foge de mais dívidas e do cartão de crédito. “Eu tento não usar, para não aumentar ainda mais o meu endividamento. Esses R$ 300 a mais por mês já me ajudariam”, relata.

MUDANÇA NA LEI PERMITE CONTRAIR MAIS CONSIGNADO

O presidente Jair Bolsonaro (PL)  sancionou a Lei nº 14.431/2022, que libera crédito consignado a beneficiários do Benefício de Prestação Continuada (BPC) e de programas federais de transferência de renda, como o Auxílio Brasil. A medida também ampliou a margem de crédito consignado aos empregados regidos pela Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) e aos segurados da Previdência Social.

O texto foi aprovado no Congresso em julho. Os beneficiários do Auxílio Brasil poderão fazer empréstimos de até 40% do valor do benefício e autorizar a União a descontar o valor da parcela dos repasses mensais. Os beneficiários do Auxílio Brasil poderão fazer empréstimos de até 40% do valor do benefício e autorizar a União a descontar o valor da parcela dos repasses mensais.

A nova lei também ampliou a margem de crédito consignado, que é o limite máximo que poderá ser comprometido pelo desconto em folha, aos empregados regidos pela Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) e aos segurados do Regime Geral de Previdência Social. De acordo com o texto, aposentados e pensionistas da Previdência, incluindo os beneficiários do BPC, poderão comprometer até 45% do valor dos benefícios com consignados.

 Na avaliação do advogado previdenciarista Rafael Vasconcelos, a majoração dessa margem de desconto direto em folha traz sérios impactos, principalmente para os aposentados e pensionistas de baixa renda. 

"Ocorre que em inúmeros casos essas pessoas acabam entrando na linha de miséria, pois estão com o benefício completamente tomado com empréstimos consignados, cartões de créditos que descontam no benefício, e o restante que cai na conta-corrente muitas vezes ainda sofre um último desconto por intermédio de empréstimos com débito na conta. Já atendi pessoas que estão "sobrevimento" com míseros 70 reais por mês", afirma.

"Estamos diante de um possível caos social caso o congresso não mude essa perspectiva, a meu ver o sistema de liberação dos empréstimos deveria ser mais rígido, uma vez que ocorrem diariamente inúmeras fraudes com a renovação de empréstimos com a utilização indevida dos dados dos beneficiários do inss, em muitas vezes sem a anuência do aposentado ou pensionista", finaliza. 

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