Em maio de 2019, as manchetes econômicas pelo país citavam a dificuldade na aprovação da reforma da Previdência, a queda da Bolsa de Valores e o dólar em alta constante, chegando a R$ 4,10. Uma ano depois de a nova aposentadoria ser aprovada, o câmbio, assim como o mercado de capitais, tem vivido uma verdadeira montanha-russa.
A moeda americana chegou a ser negociada a R$ 5,907 em maio deste ano. Em junho, o câmbio voltou a se desvalorizar, com a cotação a R$ 4,85 no dia 8. No entanto, o dólar voltou a subir e está no 7º dia seguido de alta, sendo negociado na abertura do mercado R$ 5,35, nesta quinta-feira (18), após a prisão de Fabrício Queiroz, policial militar aposentado e ex-assessor parlamentar do atual senador Flávio Bolsonaro.
De acordo com o doutor em Finanças e Contabilidade Fernando Galdi, a oscilação do câmbio é reflexo da pandemia do coronavírus, mas também da situação fiscal e política brasileira. O Brasil já vinha de uma situação fiscal complexa até fez a reforma da Previdência para diminuir o déficit e ainda precisou aumentar os gastos por causa do coronavírus. Além disso, existe aqui a tensão política, que gera muita incerteza e afasta os investidores, resume Galdi.
Com os investidores se afastando do Brasil, o dinheiro deles é enviado para transações mais seguras.
Prova de que o Brasil não tem apresentado um bom ambiente para os investidores é o aumento do risco país. Uma das medidas da piora da percepção sobre o perfil de risco do Brasil é o comportamento recente do indicador que mede a chance de um país dar um calote na sua dívida externa, o Credit Default Swap (CDS). Só neste ano, o CDS do Brasil subiu 255%. Como comparação, na América Latina, o do México avançou 175% e o do Chile teve aumento de 140% no mesmo período.
Antes da crise do coronavírus e da piora do ambiente político, investidores viam o Brasil com chance de voltar à classificação grau de investimento, o selo de bom pagador concedido pelas agências de avaliação de risco, como mostravam as taxas do CDS no começo de janeiro, que operavam na casa dos 95 pontos menor nível em 10 anos.
Já em abril, as taxas chegaram a superar 400 pontos, mesmo nível que o Brasil tinha no começo de 2016, pouco antes do impeachment de Dilma Rousseff. Em 13 de maio, o CDS foi negociado a 355 pontos, alta de 25 pontos em apenas um dia. Em 2 de junho, o indicador foi abaixo do nível de 250 pontos pela primeira vez, desde março.
Outro motivo que faz o preço do dólar aumentar é a própria política cambial proposta pelo Ministério da Economia. O Paulo Guedes tinha como objetivo melhorar o PIB brasileiro via exportações e nesse ponto o dólar alto é interessante. Então ele deixou o preço da moeda americana mais solto. Só que acredito que nem ele imaginava que o dólar fosse chegar a esse patamar, aponta o assessor de investimentos da Valor Charo Alves.
Segundo Fernando Galdi, é possível separar a alta do dólar para três grupos. O primeiro é o dos empresários que possuem dívidas em dólar. Estes, se não fizeram uma operação que chamamos de hedge cambial que protege contra as oscilações monetárias podem ter muita dificuldade, aponta. Com isso, tais empresas podem acabar até precisando fechar as portas, dependendo do tamanho da dívida e da oscilação do dólar.
Outro grupo se beneficia do aumento do dólar em relação ao real. Esses são os exportadores. Com o dólar alto como está, essas empresas se tornam mais competitivas, destaca Galdi. O aumento da competitividade das empresas pode se refletir na queda dos preços dos produtos exportados, já que a variação cambial pode compensar essa diferença.
Por fim, no terceiro grupo, aparecem as pessoas físicas. Esse é o grupo de pessoas que vai pagar mais caro pelos produtos importados, que pode diminuir o consumo, que vai ter problemas se precisar viajar sobretudo para fora do Brasil, cita Galdi lembrando que o dólar turismo chegou a ser vendido a R$ 6,50.
Charo Alves cita, por exemplo, a possibilidade de aumento no preço de produtos do varejo, como televisões e celulares. Esses produtos tecnológicos são importados. As marcas que estão aqui são globais e o setor todo é dolarizado, então a gente deve sentir no bolso para consumir esses produtos, destaca.
Outros dois exemplos de impacto para os consumidores são observados nos alimentos, medicamentos e combustíveis. O trigo para fazer o nosso pão vem de fora principalmente da Argentina e dos Estados Unidos e a alta do dólar faz aumentar o preço do trigo que consumimos no Brasil. O mesmo acontece com os medicamentos, que são trazidos de outros países, e o combustível, que passa a ser afetado com o dólar alto, conclui Alves.
O trigo para fazer o pãozinho, as bebidas, queijos e chocolates importados estão entre os produtos que devem ser impactados pelo preço do dólar. Na mesma prateleira, neste caso, estão celulares e eletroeletrônicos que são produtos que envolvem maior tecnologia na fabricação e também são feitos fora do Brasil.
O barril de petróleo é negociado em dólar. Assim, se o real se desvaloriza frente à moeda americana o combustível fica mais caro já que o preço do produto tem influência da cotação internacional. Vale destacar que o Brasil exporta, em sua maioria, o petróleo cru, mais barato, e compra ele refinado, que é mais caro.
Viajar para fora do Brasil pode ficar mais caro por dois motivos diferentes: o preço do querosene de aviação pode aumentar o que eleva o preço das passagens; e a própria compra de dólares fica dificultada tendo em vista que nas casas de câmbio o dólar turismo é comercializado em valor superior ao dólar comercial.
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