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Camilo Cola: de visionário e combatente da guerra a empresário e político envolvido em polêmicas

Camilo Cola: de visionário e combatente da guerra a empresário e político envolvido em polêmicas

O empresário ficou conhecido empreendedor visionário, mas vidas nos negócios e no campo político também foram marcadas por polêmicas

Publicado em 30 de maio de 2021 às 13:10

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Camilo Cola quando recebeu comenda do Ministério da Infraestrutura
Camilo Cola foi homenageado pelo governo federal por sua contribuição ao desenvolvimento do país. (Ministério da Infraestrutura/Divulgação)

O empresário, fundador do Grupo Itapemirim, e ex-deputado federal capixaba Camilo Cola, que morreu na noite deste sábado (29), aos 97 anos, fez história no Espírito Santo e no país com sua trajetória empresarial e também no campo político.

Com uma visão empreendedora visionária, Camilo participou da 2ª Guerra Mundial, fundou uma das maiores empresas de transporte brasileira, atuou diretamente na política, mas, também teve seu nome citado em diversas polêmicas envolvendo seus negócios.

Fundador de um império do ramo de transporte, o empresário, que nasceu em Conceição do Castelo, também foi proprietário de empresas de outros ramos e fazendas no Espírito Santo. 

Em novembro do ano passado, recebeu a Medalha de Mérito Mauá, do Ministério da Infraestrutura pelas contribuições que deu para o avanço do sistema de transportes do país e por ter sido ex-combatente da Força Expedicionária Brasileira (FEB).

Viação Itapemirim surgiu após investimentos do empresário Camilo Cola no setor de transporte e ganhou o país
Empresa fazia primeiro trajeto entre Cachoeiro e Castelo. (Itapemirim/Divulgação)

VIAÇÃO ITAPEMIRIM

O principal marco da trajetória de Camilo Cola foi a criação da Viação Itapemirim, que fez parte da história de uma geração, em Cachoeiro de Itapemirim, no Sul do Espírito Santo.

Primeiro, começou com uma única linha de ônibus que fazia o trajeto entre Cachoeiro e Castelo. Depois, em 1953, foi fundada a Viação Itapemirim com 16 veículos e 70 funcionários.

Tudo isso aconteceu depois que Camilo Cola voltou da 2ª Guerra Mundial. Ele integrou o pelotão de combatentes da FEB e entrou para a história após expulsar os alemães de Monte Castello, no Norte da Itália, em 1945.

De volta ao Brasil, o ex-combatente conseguiu um empréstimo para comprar seu primeiro caminhão, dando início a uma das maiores empresas de transportes do Brasil, a Itapemirim.

A Viação Itapemirim foi alcançando novas rotas e com o passar dos anos, já ligava o Espírito Santo a diversos Estados de outras regiões, chegando até o país vizinho, Uruguai.

Em seus melhores momentos, a viação estava entre uma das maiores da América Latina. Já na década de 1990, a Itapemirim atuava também no serviço aéreo de transporte de carga expressa.

Camilo Cola é considerado um dos principais empresários do setor de transportes do país
Camilo Cola é considerado um dos principais empresários do setor de transportes do país. (Viação Itapemirim/Divulgação)

Na década seguinte, a partir dos anos 2000, a saúde financeira da empresa já não era mais a mesma. Além de lidar com situações desfavoráveis, como gratuidades e transportes clandestinos, a Viação Itapemirim enfrentava um entrave para resolver concessões e autorizações de linhas junto à Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) - que durou de 2008 a 2015.

ELEITO DEPUTADO FEDERAL

Nesta época, Camilo Cola não era mais o presidente da empresa, mas continuava participando do Conselho. Isso porque, no ano 2000, ele foi eleito deputado federal e permaneceu até o ano de 2008. Depois, retornou a bancada federal, entre os anos de 2011 e  2015. Camilo era correligionário do então Partido do Movimento Democrátrico Brasileiro, atual MDB.

Em 2011, uma de suas empresas, que atua na área florestal, com a produção de eucaliptos, envolveu-se em um caso de trabalho degradante, com diversos profissionais em situação semelhante à escravidão.

Por causa da fraude trabalhista na Fazenda Pindobas, o Grupo Itapemirim teve o nome inscrito na lista-suja de trabalho escravo do antigo Ministério do Trabalho. Na ocasião, Cola afirmou desconhecer as irregularidades e que a contratação havia sido feita por uma empresa terceirizada.

Camilo Cola quando era deputado federal pelo Espírito Santo
Camilo Cola quando era deputado federal pelo Espírito Santo. (Agência Câmara/Arquivo)

RECUPERAÇÃO JUDICIAL E SURGIMENTO DA EMPRESA KAISSARA

Como a Viação Itapemirim foi adquirindo dívidas, começou uma grande série de polêmicas. Em 2015, uma empresa cachoeirense, chamada de Kaissara, criada em 2009, havia passado a operar cerca de 40% da frota e mais da metade das linhas da Itapemirim, tudo isso para se adequar à norma da ANTT.

Em 2016, uma das maiores empresas de transporte rodoviário do país entrava em recuperação judicial, junto com outras seis empresas que pertenciam à família Cola. A partir daí, a Kaissara, cujos sócios eram funcionários da Itapemirim - um era motorista e outro, auxiliar, ficou com 68 linhas da Itapemirim. Inclusive, rotas importantes, como a que liga São Paulo ao Rio de Janeiro.

As dívidas do Grupo Itapemirim, envolvendo as empresas Viação Itapemirim, Transportadora Itapemirim, ITA - Itapemirim Transportes, Imobiliária Bianca, Cola Comercial e Distribuidora e Flecha Turismo Comércio e Indústria, incluem débitos com fornecedores e dívidas trabalhistas, no valor de R$ 336,49 milhões, além de cerca de R$ 1 bilhão em passivo tributário.

Ônibus da Viação Itapemirim: companhia está em recuperação judicial desde 2016
Ônibus da Viação Itapemirim: companhia está em recuperação judicial. (Siumara Gonçalves)

VENDA DA VIAÇÃO ITAPEMIRIM

Ainda no ano de 2016, a empresa foi vendida para os empresários de São Paulo Sidnei Piva de Jesus e Camila de Souza Valdívia. Na época, Camilo Cola disse que a Viação Itapemirim foi vendida, mas a família continuaria no controle da Kaissara.

Mas a Justiça estadual incluiu a Kaissara no processo de recuperação judicial, porque o juiz entendeu que houve “desvio de patrimônio” na operação de transferência das linhas.

O juiz Paulino José Lourenço explicou que “é de fácil constatação que as pessoas físicas que compõem o quadro societário da Viação Kaiçara Ltda (razão social) não tem condições econômicas de constituir o patrimônio societário, avaliado em mais de R$ 100 milhões”. Ele determinou a exclusão dos “sócios/empregados” da Kaissara e a transferência do controle aos novos acionistas da Itapemirim: Sidnei Piva de Jesus e Camila de Souza Valdívia.

Itapemirim programa venda de passagens para a sexta-feira (21)
Outorga foi concedida à companhia que terá autorização para voar. (Divulgação/ITA)

Controlado, hoje, por Piva de Jesus, a Itapemirim teve recentemente a empresa que será o braço no transporte aéreo aprovada pela Agência Nacional de Aviação Civil. Leia mais aqui.

SUSPEITA DE DESVIO PARA O EXTERIOR

Em 2017, Camilo Cola e Camilo Cola Filho (ex-sócios da viação), passaram a ser investigados por suspeitas de desvios de recursos no exterior. A administradora judicial Saraiva e Alves Advogados Associados encontrou comprovantes de remessas de recursos para o exterior, contratos de câmbio, planilhas de pagamentos, dólares e equipamentos de emissão de bilhetagem eletrônica que estavam escondidos numa sala em Cachoeiro de Itapemirim.

Viação Itapemirim surgiu após investimentos do empresário Camilo Cola no setor de transporte e ganhou o país
Frota foi crescendo com o decorrer dos anos. (Itapemirim/Divulgação)

Camilo Cola, junto com o filho, afirmaram ter sofrido um “golpe”, alegando que os empresários que compraram a empresa não honraram com o acordo e tentam anular o negócio. A família diz que foi acertado que todas as empresas do grupo seriam vendidas, mas os imóveis da família, todos em nome da Imobiliária Bianca, seguiriam com os Cola.

Esse acerto ficaria combinado em anexos do contrato de compra e venda. Enquanto os Cola alegam que nunca assinaram os anexos, Camila e Sidnei apresentaram os anexos assinados à Justiça e afirmam que tudo foi feito dentro da lei. Eles ainda levaram a disputa societária ao Juízo Arbitral da Câmara de Comércio Brasil Canadá, para sanar eventuais brigas relacionadas à compra e venda das empresas.

Em dezembro de 2017, os sócios da Itapemirim, Camila Valdívia e Sidnei Piva de Jesus, chegaram a ser afastados da gestão, após um pedido da defesa da família Cola e fundador se tornou um agente litisconsorcial, ou seja, uma terceira parte do processo. Já em 2018, sem sucesso com assembleia de credores, o processo saiu do Espírito Santo e foi remetido às varas de falência e recuperação judicial de São Paulo.

Viação Itapemirim surgiu após investimentos do empresário Camilo Cola no setor de transporte e ganhou o país
Viação Itapemirim tinha linhas municipais, estaduais e até internacionais. (Itapemirim/Divulgação)

JUSTIÇA APROVA PLANO DE RECUPERAÇÃO JUDICIAL

Em 2019, a Justiça aprovou o plano de recuperação judicial aprovado pelos credores do Grupo Itapemirim. Com a homologação da Justiça, as execuções individuais de dívidas foram extintas já que elas passaram a fazer parte do plano e, portanto, foram objeto de negociação entre devedor e credores.

No ano passado, a empresa já teve alguns bens leiloados no Estado. Foram ofertados terrenos como, uma casa de luxo e uma antiga garagem que atendeu as viações Itapemirim e Kaissara, nos municípios de Guarapari e Cariacica, na Região Metropolitana de Vitória, e de Cachoeiro de Itapemirim, no Sul capixaba.

Com a pandemia do coronavírus, que afetou duramente o setor de transportes, a Itapemirim conseguiu uma alteração no plano de recuperação judicial, com aprovação da Justiça, que passou a lhe permitir utilizar 80% dos valores arrecadados nos leilões para o custeio da operação da empresa e só os 20% restantes para o pagamento de credores.

OUTRAS POLÊMICAS
TRABALHO ESCRAVO E DITADURA

DENÚNCIA DE TRABALHO DEGRADANTE EM FAZENDA

Em 2011, 22 pessoas foram encontradas em situação degradante, em Brejetuba, Região Serrana do Espírito Santo, próximo à fazenda de Camilo Cola. O terreno funcionava como uma extensão da fazenda, chamada de Pindobas 4, focada na extração madeireira. As pessoas, sem vínculos empregatícios, foram liberadas numa operação do Ministério do Trabalho, Polícia Federal e Ministério Público do Trabalho.

Na época, a assessoria de imprensa do Grupo Itapemirim informou que os funcionários supostamente submetidos a condições irregulares de trabalho, no Complexo Agropecuário Pindobas, eran contratados de uma empreiteira, formalmente constituída e especializada na sua área de serviços e que determinou a imediata suspensão do contrato com a empreiteira.

CAMILO É CITADO COMO FINANCIADOR DA DITADURA

No ano de 2014, o então deputado federal Camilo Cola (PMDB) foi citado no relatório final da Comissão Nacional da Verdade (CNV), entregue à então presidente Dilma Rousseff sobre o financiamento da ditadura. O documento que responsabilizava 377 pessoas pela violação de direitos humanos durante a ditadura, apontava Camilo Cola como "grande contribuinte" no financiamento do regime ditatorial.

De acordo com o documento, um ex-delegado do Departamento de Ordem Política e Social prestou depoimento a membros da CNV e expôs o financiamento, em nível nacional, do aparelho de repressão, tortura e assassinato do regime ditatorial.

"Camilo Cola, dono da Viação Itapemirim e deputado capixaba pela Arena, foi também um grande contribuinte, cumprindo a tarefa de arrecadar recursos em outras empresas [...]. Favores estatais para a viabilização de negócios foram concedidos aos mais ativos financiadores da estrutura da repressão", diz o trecho.

Na época, a reportagem do G1, que publicou a matéria, procurou a assessoria do então deputado, mas não obteve retorno para explicar a citação de Camilo Cola pela CNV.

VELÓRIO E SEPULTAMENTO

A assessoria da família Cola informou que o corpo de Camilo será velado até às 15h, na sede da sua fazenda em Pindobas, em Venda Nova do Imigrante, onde também será sepultado ao lado do corpo da sua primeira mulher, Ignez Massad Cola, que morreu em 2008. Atualmente, Camilo Cola era casado com Maria Luzia Gonçalves Borges. Ele teve dois filhos, Ana Maria Cola e Camilo Cola Filho.

Em nota a família de Cola disse que "neste momento de perda e dor, queremos agradecer a todas as manifestações de condolências e pesar pelo falecimento de nosso inesquecível pai, avô e grande modelo de vida, Camilo Cola. Que sua história continue impregnada em nossa memória e nos conduza como guia e exemplo".

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