Enquanto falhas do sistema do governo federal têm deixado muitos capixabas que precisam de ajuda financeira sem o auxílio emergencial, alguns dos criminosos mais procurados pela polícia do Espírito Santo já conseguiram se inscrever e foram aprovados para receber os R$ 600 reais. Entre eles está Fernando Moraes Pereira, o Marujo, considerado o maior líder em liberdade do tráfico de drogas no Bairro da Penha, em Vitória.
O benefício, apelidado de "coronavoucher", é destinado aos trabalhadores informais, desempregados e empreendedores individuais. Estas pessoas estão entre a população mais pobre, que sofreu os maiores impactos econômicos durante a pandemia de Covid-19. O benefício, contudo, vem sendo alvo de fraudes por todo o país. Marujo se inscreveu para receber no dia 14 de abril e teve a aprovação confirmada cerca de dez dias depois.
Ele é um dos líderes do Primeiro Comando de Vitória (PCV), facção criminosa que lidera o tráfico de drogas no Complexo da Penha e até em bairros de outros municípios, como a Serra. O grupo seria chefiado por Carlos Alberto Furtado, o Beto, que está preso na Penitenciária de Segurança Máxima 2, em Viana. Marujo é apontado como o braço direito de Beto, e liderança em liberdade do bando.
Contra Marujo há, atualmente, três mandados de prisão em aberto que reúnem três homicídios qualificados, ocultação de cadáver, corrupção de menores e chefia de organização criminosa.
A reportagem de A Gazeta conseguiu consultar a situação cadastral de 20 dos 30 bandidos mais procurados pela polícia do Espírito Santo. Até o momento, pelo menos quatro deles tiveram o pedido de auxílio aprovado.
Além de Marujo, outro beneficiado no Estado é Rafael Constantino Duarte, de 25 anos. Ele é acusado de tentar matar a companheira em 2018, no bairro Bela Aurora, em Cariacica.
Outro foragido que obteve o auxílio emergencial foi Maurício Geciano Rodrigues, de 23 anos, conhecido como Mau-mau.
Ele é suspeito de envolvimento em um assassinato que ocorreu na praça de alimentação de um shopping em Vila Velha em abril de 2017. A troca de tiros também deixou duas pessoas feridas, entre elas uma criança.
Igor Luiz Pereira dos Santos, o Mamute, que tem mandado de prisão em aberto por duplo homicídio qualificado e associação criminosa, também obteve aprovação do auxílio de R$ 600.
Ele é acusado de participar do tiroteio que levou à morte do diretor de futebol do Esporte Clube Divinense, Marcos André Marques, 26 anos, após um jogo de futebol, em Boa Vista, Vila Velha, em maio de 2019.
Ainda na lista dos criminosos mais procurados, cinco pessoas aguardam o processamento do pedido de auxílio emergencial. Outras duas até entraram com o requerimento, que foi negado.
É o caso de Antero da Conceição Arcanjo que, com 45 anos, já recebe aposentadoria. André Carolino da Silva também teve o pedido rejeitado porque o sistema do governo federal apontou que um dos parentes dele recebe o Bolsa Família.
As fraudes no sistema de solicitação do auxílio emergencial estão sendo observadas em todo o país. Ao todo, segundo relatório da Controladoria Geral da União (CGU), 27 mil foragidos da Justiça estão entre as pessoas que pediram auxílio emergencial em todo o país. Isso porque o sistema do Dataprev, que recebe os dados de quem pede o auxílio, não é ligado ao Banco Nacional de Mandados de Prisão.
No Paraná, a Polícia Civil está utilizando a "malandragem" dos criminosos contra eles. Segundo informações do G1, os agentes aproveitaram que os fugitivos precisaram atualizar o endereço residencial no sistema da do Dataprev para receber o auxílio emergencial e foram a esses locais cumprir mandados de prisão. Em um mesmo dia, 94 foragidos foram recapturados.
A Gazeta demandou a Secretaria de Segurança Pública do Espírito Santo (Sesp) sobre essa possibilidade. O órgão respondeu que as informações sobre operações que as forças de segurança pretendem realizar são sigilosas, mas ressaltou que "monitora, diariamente, todas as atividades criminosas no Estado e todos os dias foragidos são capturados e levados ao sistema carcerário", diz a nota.
O governo do Estado tem uma página com os nomes e fotos dos bandidos mais procurados pela polícia. O canal para denúncia é o Disque Denúncia 181. A ligação é sigilosa.
O Ministério da Cidadania, responsável pela gestão do auxílio emergencial, afirmou em nota que trabalha para aperfeiçoar o sistema para que o auxílio chegue de fato à população mais vulnerável. A nota diz também que os recursos destinados a esse fim já passam de R$ 150 bilhões.
A pasta lembra ainda que quem burlar o auxílio emergencial será obrigado a ressarcir o valor e estará cometendo crime. "Importante destacar que qualquer indício de ilegalidade, em especial na ótica criminal, é imediatamente informado à Polícia Federal. A CGU e a Advocacia-Geral da União (AGU) também estão atuando na fiscalização e no ajuizamento de ações, respectivamente, em todo o processo de pagamento do auxílio emergencial."
O Tribunal de Contas da União (TCU) alertou para o risco de 8 milhões de brasileiros estarem recebendo de forma irregular o auxílio emergencial. Parte dessas pessoas pertence a famílias das classes média e alta.
Enquanto isso, o serviço assistencial tem dificuldades de chegar em algumas pessoas que precisam desse recurso para sobreviver. Muitos brasileiro elegíveis estão tendo o benefício negado por erro na base de dados do governo por falta de atualização.
No Espírito Santo, um dos casos mais emblemáticos foi o da desempregada Adeyula Rodrigues, de 31 anos, que teve o pedido do auxílio emergencial negado porque constava na Carteira de Trabalho Digital que ela era presidente da República.
Houve ainda casos em que o cruzamento de bases de dados entre a Dataprev e o TSE foi feito de forma errada e acabou tirando o auxílio emergencial de R$ 600 de quem foi candidato ao cargo de vereador nas eleições municipais de 2016, mesmo sem ter sido eleito. Os ex-candidatos poderiam receber o benefício, mas acabaram barrados.
Desde sexta-feira, o Ministério da Cidadania passou a divulgar a lista de beneficiários do auxílio no Portal da Transparência do governo federal.
Por fim, o órgão ressaltou que o canal para registro de denúncias de fraudes é o sistema Fala.Br ou pelos telefones 121 ou 080070702003.
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